Segundo dados da Federação Internacional de Jornalismo, entre os anos de 1995 e 2018 foram 64 execuções por conta do exercício da profissão de comunicador no Brasil, tornando o país o segundo mais perigoso para a profissão em toda a América e o décimo no ranking mundial, ficando atrás de nações envolvidas em conflitos étnicos, guerras civis e crises humanitárias como Paquistão, Somália ou Iraque.
Essa triste realidade está documentada no filme “Boca Fechada”, dos diretores Aquiles Lopes e Marcelo Lordello, já disponível ao público as plataformas NOW (Claro), Apple TV e Oi TV, além de YouTube.
O documentário relembra alguns crimes cometidos em cidades pequenas. E esse recorte não foi casual: seis em cada dez jornalistas mortos trabalhavam em cidades com menos de 200 mil habitantes. Através de relatos sobre os assassinatos dos radialistas Israel Silva, em Lagoa de Itaenga-PE; Jairo Sousa, em Bragança, nordeste do Pará; e Gleydson Carvalho, em Camocim do Ceará, o filme traz à luz o debate sobre a violência sofrida por comunicadores que denunciam esquemas de corrupção ou desafiam poderosos em suas regiões. As imagens foram captadas em Pernambuco (Recife, Lagoa de Itaenga), no Pará (Belém e Bragança), no Ceará (Camocim e Fortaleza) e em São Paulo.
A maior incidência de assassinatos de comunicadores em pequenos lugarejos se explica, segundo Aquiles, pela ausência de estruturas que protejam esses profissionais nesses municípios. “Nessas localidades as pessoas trabalham sem nenhum tipo de mecanismo que consiga protegê-las. Nas cidades maiores e em veículos maiores, há alguma estrutura jurídica e sindical. Nos pequenos municípios, nada disso existe”, argumenta.
“No caso do Brasil, temos uma prática dessa violência já há bastante tempo. É uma rotina atentar, intimidar e matar, ou mandar matar, comunicadores nas pequenas cidades do país”, avalia Aquiles Lopes. Segundo o diretor, há um ambiente mais favorável para que esses crimes aconteçam em cidades menores, por isso a escolha dos três casos que ilustram o documentário.
PESQUISA: Aquiles Lopes estuda o tema desde sua dissertação de mestrado, em 2017, para o Programa de Pós Graduação em Direitos Humanos na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e levou muito de sua pesquisa para o documentário, aproveitando sua vivência na área. “Também faço parte de rede de proteção a comunicadoras e comunicadores do Brasil, que discute o assunto. Então, quando fomos filmar, eu e Mercelo Lordello decidimos contar três histórias parecidas, para mostrar que elas se repetem muitas e muitas vezes no país e quase sempre com o mesmo desfecho: a impunidade dos mandantes”, explica Aquiles.
Na sua dissertação, ele estudou as execuções sumárias, arbitrárias e extrajudiciais de comunicadores no Brasil em virtude do exercício da profissão, investigando quais as políticas públicas adotadas pelo estado brasileiro para proteger a vida desse grupo e garantir que a sociedade receba informações.
“Os direitos à comunicação estão assegurados no Artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e são temas permanentes de debates na ONU, desde a década de 1940. O estudo acadêmico utilizou como base de dados primários o primeiro documento oficial produzido no país sobre o assunto, o relatório ‘Violência Contra Comunicadores no Brasil: Um Retrato da Apuração nos Últimos 20 Anos’, publicado em 2019 pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP)”, diz trecho do resumo da pesquisa.
Serviço-"Boca Fechada" (2022), documentário de Aquiles Lopes e Marcelo Lordello
Disponível ao público as plataformas NOW (Claro), Apple TV, além de YouTube.
Folha Pernambuco
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