É necessário e urgente refletir sobre a relação do rio São Francisco com o conjunto de bacias hidrográficas que contribuem para a sua grandeza cultural, econômica e social. O “Velho Chico” é um dos mais importantes rios do Brasil. Da sua nascente, em Minas Gerais, até o encontro com o mar, ele passa compondo a paisagem de diversas regiões dos estados da Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Sergipe e Alagoas, serpenteando por mais de 500 municípios e comunidades e beneficiando 14,2 milhões de pessoas. Daí a sua denominação de rio da integração nacional.
Seu percurso de quase três mil km é um caminho revelador de histórias, pelejas, causos, amores e das religiosidades dos povos ribeirinhos. Um rio de importância econômica, social e cultural para diversas comunidades, dentre elas indígenas e quilombolas.
Suas águas maltratadas pelo intenso processo de degradação, onde esgotos desaguam em seu leito, o desmatamento constante de suas matas ciliares, provocando o assoreamento, são expressões concretas do abuso indiscriminado sofrido pelo rio. Esse é o reflexo da maneira como o estado brasileiro administra seus recursos naturais, na contramão do discurso que o rio São Francisco é considerado um dos principais fatores de desenvolvimento da região nordeste, devido a sua importância para a agricultura e o aproveitamento da sua força para a geração de energia.
Muitas são as narrativas em torno das águas do velho Chico: a mãe d’água, o mergulhão, o cumpade d’água e o negro d'água são alguns seres imaginários que moram nas profundezas de suas águas e que costumam aparecer para pescadores. Daí a sua importância para a cultura popular. As narrativas repassadas por gerações de barqueiros, pescadores/as e ribeirinhos/as; as cantigas e rezas nas procissões das romarias da terra e das águas, por homens e mulheres carregados de simbolismos, fazem dessas iniciativas expressões de resistência e fé, percorrendo caminhos em meio à vegetação que cresce no lugar onde já foi o seu leito, para oferecer-lhe um gole d’água.
Se o rio morre, morre com ele a cultura de um povo.
O velho Chico é também núcleos de memórias. Em cada trecho, várias histórias de vida. Na contramão da velocidade do que já foi a sua correnteza e pela abundância de suas águas e profundidade de seu leito, hoje algumas embarcações estão fixadas nas areias de suas margens. Ali se ancora também lembranças e memórias de tempo de farturas de peixes e da vida movimentada no cais.
Da poética entre as memórias e a atual situação do rio, não pode deixar de falar das situações de tantos outros rios que o alimentam, dando-lhe água de beber. Considerado como uma caixa d’agua, o cerrado baiano compõe as importantes bacias hidrográficas do Rio Grande e Rio Corrente que são ameaçadas diariamente pela monocultura e desmatamento do cerrado, como plano de “desenvolvimento” adotado pelo estado brasileiro, desde os anos 70.
Do significado inicial “rio-mar” dado pela população indígena, talvez, na atualidade, essa alcunha não corresponda mais, pois, para navegá-lo encontram-se enormes dificuldades por ter se tornado estreito e assoreado. As suas vazantes já não são tão produtivas o que diminui a produção de alimentos para sua população ribeirinha.
Diante do processo cumulativo de degradação que vive o rio e suas bacias hidrográficas, a revitalização só se dará se as populações ribeirinhas de forma organizada e mobilizada forem efetivamente protagonistas para a mudança desta realidade.
2 comentários
09 de Jan / 2018 às 15h38
A coisa social e econômica sempre foi aquém. Mas, a cultural vem de uns tempos pra cá. juazeiro e petrolina definham. Importantes ícones culturais , artísticos e culturais do naipe de um Lêdo Ivo, Coelhão e Otoniel Gondim nem sequer fazem mais obras, pinturas e livros como antes. parecem desestimulados pelo governo. sociedade. Uma pena. Foi-se o mito?
09 de Jan / 2018 às 16h53
Nosso Rio de São Francisco agonizando, morrendo, e os poderes constituídos nada fazem, só colabora para sua extinção. Urgente, urgentíssima ação de revitalização do Velho Chico, e nós ribeirinhos devemos fazer a nossa parte: economizando água, não jogarmos lixo no rio, não desmatando as matas ciliares. Vamos ajudar o rio São Francisco a renascer.