Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Natal é a festa da Humanidade. É Celebração carregada de otimismo antropológico: se o próprio Deus assume nossa condição, quanto valor não haverá cada pessoa humana, imagem de Deus formada na Criação e re-formada na Encarnação do Verbo? Todavia, é sempre o pecado, com suas multíplas expressões pessoais e sociais, que de-forma essa imagem, que lhe nega e avilta. Daí tantos rostos de-formados pela abissal, persistente e escandalosa desigualdade num país de "tradição cristã". No âmbito mundial, guerras estúpidas (existe guerra sensata?) reforçam ódios, pré-conceitos, barreiras e geram dor e morte num jogo de retaliações e vingança nada próprias de uma "Civilização" que se diz cristã.
O poema que abre este artigo, do grande poeta pernambucano Manuel Bandeira (+1968), convida a olhar corpos de-formados, dignidades feridas de quem vive de sobras, de restos das mesas dos epulões. De fato não aprendemos a lição do Natal. Ousamos romantizar o nascimento do Deus-humanado em uma estrebaria (foi o que sobrou, pois "não havia lugar para eles na hospedaria", como afirma o Evangelista) e a substituí-lo por um velhinho lendário e bem adequado aos gostos consumistas e neoliberais. Não é também pequena a tentação de substituirmos o cerne da mensagem natalina, evangélico, por mensagens piegas, nada in-cômodas e desafiadoras, carregadas de sentimentalismo estéril, efêmero e intimista. Estamos distantes de Francisco de Assis, que ao se encantar com o mistério da humildade de Deus des-velada no Natal, "cria" o presépio para vislumbrar a concretude da sua pobreza: "Quero lembrar o menino que nasceu em Belém, os apertos que passou, como foi posto num presépio, e ver com os próprios olhos como ficou em cima da palha, entre o boi e o burro" (1 Celano 84).
O Natal anuncia que o Filho dileto do Pai despoja-se de sua divindade para re-vestir de dignidade nossa humana condição. O Verbo se faz corpo re-velando a sacralidade inviolável de cada corpo humano. Celebrar dignamente o Natal implica, portanto, em reconhecer que o humano é caminho inexorável para se chegar ao divino. Não se pode acolher o Cristo que vem ao nosso encontro sem deixar-se encontrar e interpelar pelo outro, particularmente os feridos e negados em sua dignidade, tratados como bichos. Apoiar (concretamente) movimentos, grupos, entidades e associações que estão a serviço da afirmação e do resgate da dignidade humana é possível gesto concreto de quem aprende que celebrar o nascimento dAquele que se faz nosso irmão é irmanar-se, romper velhas crostas de egoísmo e indiferença. Na festa do Deus in-visível que se faz visível em nossa carne, abramos os olhos para re-conhecer os in-visíveis de nossa sociedade!
Neste período privilegiado, sonhemos com um tempo novo, no qual a nenhum ser humano seja imposta condição des-humana. Esse é o sonho de Deus! Empenhemo-nos, com nossa responsabilidade e compromisso, ensaiando um tempo novo daquela Paz anunciada pelos anjos aos humildes pastores. Paz que é fruto da Justiça!
Que o Natal nos in-comode e des-instale como homens e mulheres encantados pelo Deus que na sua ternura amorosa dá-se por inteiro a nós (quem ama não dá sobras, nem restos). Caso contrário "haverá luzes, festas, árvores iluminadas, presépios, (...) mas é tudo falso", como bem lamentou o Papa Francisco recentemente.
Dom Beto Breis, ofm
Diocese de Juazeiro – Bahia
Dom Beto Breis, ofm Diocese de Juazeiro – Bahia
4 comentários
26 de Dec / 2017 às 00h55
Texto verdadeiro e atual depois que Judas golpistas tomou Brasília. Amo Jesus. LULA tinha acabado com gente comendo lixo dando oportunidade de vida melhor. Mas Cunha e Temir e Gedeu PMDB tiraram Dilma para para ver os pobres no lixo???Deus eh grande. Lula vai voltar em nome de Deus. A Internet vai vencer a TV enganadora Quim???
26 de Dec / 2017 às 01h16
Temir Quim e Alkymi PSDB e Cunha PMDB gostam de comparar um país com uma família, dizendo que o fundamental “é gastar menos do que se ganha”. Aceito a comparação, mas não o conceito: o essencial é que nunca falte o básico para ninguém, dentro desta casa. Que preparemos 2018 assim, falando às pessoas sem ódio, sem verdades absolutas, com tolerância. Sabendo que não somos um rebanho de ovelhas, todas imaculadamente brancas. E que isto é o melhor da vida. Não é um problema, é uma solução para nossas incompletudes. Blog 247brasil
26 de Dec / 2017 às 01h21
Amigo para o pobre falta tudo. Para os ricos deputados e dono de TV vai malas de dinheiro??? acertei???Tiraram Dilma pra isto Quim ???
26 de Dec / 2017 às 01h35
Sou catolico e gosto de Jesus. Lula tornou-se, pelo que foi para o povo e para o Brasil, o candidato do povo para voltar a ser presidente e resgatar as mínimas condições de vida de todos, a esperança, a confiança no País. Dali, Lula passa a se tornar não apenas o candidato do povo, para ser a única possibilidade de o Brasil se recuperar da crise, avançando, voltando a crescer economicamente, voltando a dar condições de vida básicas para todos, distribuindo renda, gerando empregos e oportunidades para todos", analisa o sociólogo Emir Sader sobre o crescimento de Lula também na classe média