A Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) apresentou o Programa Um Milhão de Tetos Solares (P1MTS).
O projeto inédito de produção descentralizada de energia fotovoltaica foi detalhado durante a programação do X Encontro Nacional da ASA (EnconASA), realizado em Piranhas (AL).
A proposta do P1MTS, colocada para análise dos 500 delegados, sendo 70% deles agricultores, é resultado de um longo processo de diálogo. Desde o ano passado, membros de organizações da Rede ASA, pesquisadores e empreendedores sociais vêm realizando visitas a experiências e encontros de discussão sobre o tema. A expectativa é de que no EnconASA o programa ajude na reflexão sobre o futuro do Semiárido.
O P1MTS, em sua fase piloto, pretende atender 4 mil famílias rurais em 60 municípios do Nordeste e de Minas Gerais com sistemas individuais e comunitários de energia. No período de 18 meses, a iniciativa prevê também a criação de dez fábricas-escolas para a produção dos painéis solares e outros componentes, e a capacitação de 200 jovens eletricistas.
A ASA estima um investimento de R$ 78,9 milhões para tirar o P1MTS do papel. O orçamento inclui o custeio com seleção e cadastramento das famílias, capacitação dos beneficiários e técnicos, recursos humanos, visitas de intercâmbios, produção agroecológica, ações de controle social, gestão e acompanhamento.
Assim como o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC), que se tornou uma referência mundial na democratização do acesso à água, a ASA quer com o P1MTS apresentar uma alternativa ao atual modelo centralizador de geração de energia. A expectativa é que o estado brasileiro possa aproveitar o maior potencial de irradiação global horizontal (5,49 kWh/m²) do País, e formular uma política pública verdadeiramente inclusiva.
“O programa surge nessa perspectiva de fazer o enfrentamento aos grandes projetos de energia solar. As empresas entram nos territórios no Semiárido, desapropriam as famílias, ocupam áreas de produção de alimentos e acabam levando toda riqueza que é gerada, e as pessoas ficam só com o ônus”, explica o assessor de coordenação da ASA, Giovanne Xenofonte.
Dados do setor elétrico indicam que as famílias brasileiras consomem em média 152,2 kWh/mês de energia para uso doméstico e produção, ao custo médio mensal de R$ 180. Considerando que boa parte dos que vivem no Semiárido está dentro do perfil de pobreza definido pelas regras do Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico), esse gasto com a conta de luz pesa e muito no orçamento doméstico.
Com o P1MTS, serão instalados, no telhado da casa, de quatro a seis painéis solares de 2,20m x 2,30m com capacidade de cerca de 550 Watts/painel, além de inversor de 3KW. Essa estrutura permite uma geração média inicial por unidade familiar de, pelo menos, 300 kWh/mês. O que pode levar a um aumento de 97,1% na média de consumo atual, proporcionando às famílias um maior conforto doméstico, com uma economia que pode chegar a 95% no fim do mês.
De acordo com a ASA, os 3.600 sistemas unifamiliares serão implantados com ajuda de técnicos multiplicadores e animadores das organizações sociais habilitadas para o programa, e contará com a contrapartida dos beneficiários nos serviços de apoio à instalação. O P1MTS custeará por seis meses toda gestão, enquanto as famílias serão capacitadas para, depois desse período, assumir o controle dos sistemas.
Idealizado no modelo on-grid, ou seja, conectado à rede pública de energia, a família poderá utilizar o excedente de energia como saldo para o mês seguinte e será compensada caso o consumo posterior seja maior que o que foi produzido.
“Enquanto ASA, faremos a incidência política para que a legislação brasileira permita a comercialização, gerando renda e aumentando as possibilidades dessas famílias saírem mais rápido da situação de vulnerabilidade social”, afirma Giovane.
No caso dos sistemas comunitários de energia solar, as usinas fotovoltaicas terão uma potência nominal instalada de 25 kWp e serão implementadas dentro da mesma metodologia dos complexos unifamiliares. As diferenças desse modelo, é que ele será compartilhado por 20 famílias cada, totalizando 400 pessoas, e funcionará de forma independente da rede de fornecimento de energia elétrica (off-grid).
Com manutenção e monitoramento custeados pelo P1MTS também por um semestre, como no modelo individual, a gestão do sistema após esse prazo deverá ficar sob responsabilidade de uma comissão, com uma pessoa de referência escolhida pela própria comunidade.
As usinas fotovoltaicas comunitárias são fundamentais para ampliar e dinamizar espaços agroecológicos de produção de alimentos, uma vez que elas garantem o funcionamento de sistemas de irrigação para cultivos em hortas, pomares e quintais produtivos, para criação de animais e estruturação de unidades de beneficiamento e estocagem de produtos agropecuários.
Estima-se que a energia gerada pelos dois tipos de sistemas solares e utilizadas pelas famílias em diferentes atividades produtivas, poderá alcançar cerca de 4 mil hectares de cultivos agroecológicos, assim como dezenas de empreendimentos solidários.
Produção e formação
O P1MTS traz no seu bojo a estratégia da ASA de favorecer o diálogo entre os povos do Semiárido e a academia. Nessa perspectiva, assim como foi na concepção do projeto, a fase piloto prevê a instalação de dez fábricas-escolas em parceria com instituições de ensino e pesquisa nas áreas de ciência e tecnologia.
As unidades serão responsáveis por produzir placas e outros equipamentos para a instalação dos sistemas de energia solar no meio rural, e também funcionarão como base para o processo de formação de Jovens Eletricistas Sociais, dos animadores e coordenadores das organizações sociais envolvidas no programa.
A proposta é inspirada na experiência pioneira da Escola Família Agrícola do Sertão (Efase), em Monte Santo (BA), que desde 2021 capacita jovens da região para fabricar e instalar as estruturas de energia solar.
Observando a demanda e a necessidade estratégica para que as fábricas-escola cumpram, sobretudo, a função de produzir conhecimento, a ASA definiu para a fase piloto do P1MTS a seguinte distribuição: Bahia (2), Ceará (2), Paraíba (1), Pernambuco (1), Rio Grande do Norte (1), Alagoas e Sergipe (1), e Piauí e Maranhão (1).
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