Opinião: Desafiando a Heterossexualidade Compulsória: A Perspectiva de Chappell Roan-Cultura Pop

Desafiando a Heterossexualidade Compulsória: A Perspectiva de Chappell Roan Cultura Pop é artigo de opinião da estudante Mellyssa Cavalcanti de Jornalismo em Multimeios da Universidade do Estado da Bahia em Juazeiro - Bahia. Confira:

O patriarcado é uma construção social na qual os homens exercem poder e autoridade sobre as mulheres, manifestando-se de diversas formas e impactando a
vida feminina em várias áreas. A heterossexualidade compulsória é um dos frutos desse sistema patriarcal presente nas sociedades. O conceito introduzido pela
intelectual norte-americana Adrienne Rich, em seu artigo “Heterossexualidade Compulsória e a Existência Lésbica” de 1980, argumenta que a heteronormatividade
compulsória é, antes de tudo, uma opressão política. Rich afirma que instituições como a maternidade no contexto patriarcal, a exploração econômica, a família
nuclear e a heterossexualidade compulsória são fortalecidas por legislações, normas religiosas, imagens midiáticas e esforços de censura.

A partir desse contexto social, entender-se como lésbica não é fácil e pode representar um grande desafio, gerando, em muitos dos casos, um conflito significativo para mulheres que se desviam das normas sociais aceitas. Reflexo de uma cultura que busca incessantemente reforçar a heteronormatividade.

Desde cedo, somos ensinadas a nos enxergar em um mundo onde na TV princesas apenas beijam príncipes, rainhas apenas beijam reis, e não há espaço para outras
identidades. E assim, meninas lésbicas, que não conseguem enxergar outra forma de vida a não ser na heterossexualidade, acabam aceitando viver de acordo com
que é imposto como certo na sociedade e escondendo sua insatisfação com suas relações heterossexuais e o constante sentimento de que falta algo no
relacionamento. Muitas nem sequer percebem a influência desse fruto do patriarcado em suas vidas.

Na canção “Good luck, babe!” (Boa sorte, querida) da cantora que vem ganhando destaque este ano ,Chappell Roan, é possível ver essa questão acontecendo de forma clara. Na canção a cantora explora como a heterossexualidade compulsória age e assombra a vida de uma mulher que tenta ignorar seus sentimentos por outras
mulheres. A artista constrói uma narrativa de uma garota que observa a sua amada negar seus sentimentos por outras garotas e se força a seguir a heteronormatividade. No trecho “você pode beijar cem garotos em bares, tomar outro drink apenas para parar o sentimento, você poderia dizer que é só o seu jeito, arrumar uma nova desculpa, outra razão idiota” evidencia como a narradora está convencida que não importa as ações da outra pessoa, nada vai parar os
sentimentos dela por garotas. As suas tentativas de ignorar sua verdadeira orientação sexual ao se relacionar com homens só trás mais a tona a sua real
identidade.

Chappell Roan retrata o processo doloroso de auto aceitação feminina e como a heteronormatividade muitas vezes obstrui o amor genuíno e verdadeiro entre duas
mulheres. A linha “você terá que parar o mundo só para parar o sentimento, boa sorte querida” serve como uma ironia contundente, apontando para a futilidade das
tentativas de mudar algo inerente em si mesma, enfrentando assim, as regras que moldam as mulheres na sociedade atual.

A representação que Chappell Roan traz em sua letra é crucial para o sentimento de identificação de meninas que podem estar passando por experiências semelhantes
às descritas na canção. Sua música não só ajuda a iluminar o desafio da heterossexualidade compulsória, como também serve como um meio poderoso para
a autoaceitação. A relevância de Chappell Roan vai além da canção mencionada, ela desempenha um papel significativo na cultura pop ao abrir espaço para
representações do amor entre mulheres em uma esfera predominantemente heteronormativa.

Com uma mídia global que, desde que nasceu, pouco se preocupou com a representação LGBTQIAPN+ nas telas de TV e na música, isso ainda ocorre nos
dias atuais. Em uma pesquisa feita pelo Visual GPS 2021, da Getty Images, foi apontado que apenas 20% dos entrevistados globais afirmaram ver pessoas
LGBTQIA+ representadas regularmente em imagens e, quando o fazem, as representações são estereotipadas. Isso é ainda mais complicado quando falamos
de lésbicas, uma sexualidade frequentemente apagada e excluída, já que a indústria, dominada por homens, prioriza as vivências sob suas próprias óticas, e
muitas vezes fetichiza as relações entre mulheres para o prazer do homem hétero, e não para a representação de uma comunidade.

Hayley Kiyoko, assim como Chappel Roan, é um exemplo de representatividade no mundo da música, na busca de representações reias, com sua música “Girls Like
Girls” de 2015, foi uma pioneira no mundo pop ao abordar o amor entre garotas e a heterossexualidade compulsória, estabelecendo um importante precedente na mídia.

Assim como Kiyoko, Roan contribui para a visibilidade e aceitação das identidades queer, conquistando espaço em meios de comunicação como TV, rádio e paradas da
Billboard. Juntas essas e muitas outras artistas, ajudam a construir um futuro onde meninas não precisam se conformar às normas sociais simplesmente por não
conhecerem outras que sentem e vivem o mesmo que elas, mostrando que sim, princesas podem beijar princesas e rainhas podem beijar rainhas.

Portanto, o caminho a ser seguido pela mídia, e quem sabe na sociedade em geral também, é de uma representação feminina feita por mulheres e para mulheres e ao
invés de negar nossa existência ou esconder quem realmente somos, devemos reconhecer que nossos sentimentos e identidades são legítimos e persistem,
independentemente das pressões externas. Como a própria canção citada aqui sugere, se alguém ainda quiser continuar ignorando sua verdadeira identidade, com
uma luta constante contra o que não pode ser mudado: Boa sorte, querida!

Artigo de opinião da estudante Mellyssa Cavalcanti de Jornalismo em Multimeios da Universidade do Estado da Bahia em Juazeiro - BA.

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