O principal colegiado da Câmara dos Deputados, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), aprovou semana passada um projeto de lei que visa alterar o Código Florestal, passando a considerar de utilidade pública obras de infraestrutura de irrigação e dessedentação animal em Áreas de Preservação Permanente (APP), incluindo barramentos ou represamento de cursos d´água.
Para o Observatório do Código Florestal, a proposta representa um “retrocesso” e pode levar a grandes operdas de vegetação nativa. As informações são do site o((eco))jornalismo ambiental.
Foram 37 votos a favor e 13 contrários à proposta. Dentre os que se opuseram à mudança no Código Florestal, estavam o Partido Verde (PV), Partido dos Trabalhadores (PT), Avante e Partido Comunista do Brasil (PCdoB). As demais siglas que compõem a comissão foram favoráveis. A medida também já foi aprovada na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPADR) e na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara.
As APPs são áreas de margens de rios, topos de morros e locais de extrema importância ecossistêmica para a manutenção dos cursos d ‘água, do solo e da biodiversidade. Pelo Código Florestal, a supressão de vegetação em APPS ou execução de obras em tais áreas pode ocorrer somente na hipótese de utilidade pública, interesse social, ou quando houver baixo impacto ambiental.
O projeto de lei aprovado pela CCJ – PL 2168/2021, de autoria do deputado Jose Mario Schreiner – DEM/GO – propõe justamente mudar o status das obras de irrigação e dessedentação animal, de forma a considerá-las como sendo de utilidade pública.
Em sua justificativa, Schreiner deixa claro que o objetivo da mudança é beneficiar o agronegócio. “Por que apoiamos que as infraestruturas de irrigação são de utilidade pública para fins de licenciamento ambiental? Para aumentar a disponibilidade hídrica com foco na produção e na produtividade rural”, diz.
Para o Observatório do Código Florestal (OCF) – rede de organizações que trabalham pela manutenção e cumprimento da principal lei ambiental do país – a aprovação do PL 2168/2021 representa um “retrocesso”, ainda mais quando considerado o agravamento da crise climática no Brasil e no mundo.
“É um retrocesso grave promovido pela comissão e que desconsidera os impactos severos que o desmatamento de áreas de preservação permanente, vegetação nativa protegida pela lei há cerca de cem anos, pode causar. Essa degradação ambiental promovida pela medida ataca diretamente a população brasileira urbana e rural, por poder gerar insegurança alimentar, hídrica e climática, além de ameaçar a biodiversidade nacional. O projeto ignora os efeitos da tragédia climática vivenciada pelo Rio Grande do Sul, que inclusive aprovou uma lei estadual similar a essa”, disse a ((o))eco o secretário executivo do OCF, Marcelo Elvira.
Em 2022, a rede já havia publicado uma nota técnica alertando para os riscos de propostas como a agora aprovada pela CCJ da Câmara. O documento alerta para a possibilidade de perda de produtividade agrícola e escassez hídrica.
O OCF lembra que áreas com vegetação nativa apresentam, em média, uma perda de apenas 4 kg de solo por hectare/ano, enquanto áreas de plantio de soja e algodão, por exemplo, têm perdas que ultrapassam 20 toneladas por hectare/ano.
Segundo a rede, obras de irrigação também resultam no proliferamento de represamentos ao longo dos rios e cursos d’águas, o que impacta diretamente na qualidade e disponibilidade das águas.
Malu Ribeiro, diretora da SOS Mata Atlântica, membro do OCF e do Observatório das Águas, enfatiza que tais mudanças alteram significativamente os ecossistemas, reduzem a biodiversidade e comprometem os usos múltiplos da água nas bacias hidrográficas brasileiras.
“Rios que eram de corredeira e de velocidade viram águas paradas e há um impacto grande na qualidade dessas água. Isso altera todos os ecossistemas e perde biodiversidade, perde a qualidade da água e, com isso, perde a possibilidade de usos múltiplos da água. Portanto, é um projeto de lei equivocado e que beneficia um usuário em detrimento de todos os outros usuários da água das bacias hidrográficas brasileiras”, diz.
Ataque às APPs no Senado
Além do projeto de lei aprovado nesta quarta-feira na CCJ da Câmara, outra proposta com teor semelhante tramita no Congresso. O PL 1.282/19, de autoria do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), permite a construção de reservatórios e barramentos de água em Áreas de Preservação Permanente (APP) dentro de propriedades rurais, para fins de irrigação. A proposta já foi aprovada no Senado e submetida à Câmara, mas ainda não tem data para apreciação dos deputados.
Apesar do conteúdo semelhante, a proposta recém aprovada na comissão da Câmara é ainda mais danosa ao meio ambiente, por mudar o entendimento geral do que seriam as obras de irrigação e dessedentação. Ainda não há data para votação do PL em Plenário.
O Eco Jornalismo Ambiental
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