Artigo: Jovem, sexo é natural e é cinema também

É 28 de julho de 2023, estou assistindo ao filme Oppenheimer no cinema, após o fim da sessão, ouço um grupo de pessoas conversando sobre o filme e entre os comentários que foram ditos, um deles me chama muito atenção: “Pra quê que teve aquela cena de sexo, ela não possui nenhum valor narrativo”.

O cinema por décadas tem sido um dos principais e fundamentais elementos de cultura popular e uma das mais profundas formas de entendermos como sexo e sexualidade são discutidos e representados na sociedade.

Para demonstrar essa relação de forma mais concreta, é só analisarmos através das décadas a forma como a prática sexual é representada nessa mídia, se compararmos filmes como Bonequinha de Luxo e o filme mais polêmico do ano passado Saltburn, percebe se o quanto que a sexualidade vem se tornado cada vez menos tabu nas produções cinematográficas.

Entretanto, o que se percebe hoje em dia é uma tentativa de se “esterilizar” o cinema, com filmes simplesmente ignorando que temáticas sexuais fazem parte das vivências humanas, e quando fazem parte são chamadas de “vergonha alheia” e provocam comentários como citei anteriormente, principalmente dito por adolescentes

O pragmatismo da geração z sobre amor, sexo e relacionamento-Segundo uma pesquisa realizada pela Universidade da Califórnia mostrou que 51% de 1.500 entrevistados querem ver mais conteúdo sobre relacionamentos platônicos e amizades. Enquanto isso, 47,5% disse que sexo “não é necessário”.
Os resultados da pesquisa indicam certo desconforto dos adolescentes em relação à cenas que representam um conteúdo sexual na tela. Cada vez mais pesquisas como essa embasam o argumento de que as gerações mais novas como a geração Z possuem uma visão muito pragmática dos relacionamentos e das práticas sexuais.

Entre os principais motivos que buscam explicar a causa desse desconforto está que muitos acreditam que precisam atingir uma estabilidade financeira sozinhos antes que outra pessoa entre em cena. Lembrando que a geração Z está ingressando a fase adulta em uma época particularmente delicada, marcada pela pandemia da covid-19, mudanças climáticas cada vez mais sérias com ondas de calor e crises econômicas, que conjuntamente criam um cenário de desesperança e instabilidade. 

"Eles são extremamente focados em si próprios, e não porque estão sendo egoístas. Eles sabem que são responsáveis pelo seu próprio sucesso e felicidade e que precisam ser capazes de cuidar de si próprios antes de cuidar dos demais”, segundo Julie Arbit, vice-presidente global de conhecimentos do grupo de comunicação Vice, em pesquisa realizada.

O que de fato é necessário para o cinema? O principal problema de tornar cenas de sexo descartáveis é que entre outras muitas funções a arte pode causar sentimentos e transmitir ideias, e a relação do cinema com o sexo não é muito diferente disso. O filme pode muito bem provocar horror, mas também pode provocar excitação. Tomemos como, por exemplo, o filme que citei anteriormente Oppenheimer, se cortamos a cena de sexo considerada desnecessária o filme sofre um prejuízo enorme na narrativa que ele busca contar. Ao invés de apenas simplesmente representar uma relação amorosa ou de usar uma sequência de diálogos desnecessários, o diretor Christopher Nolan usa a cena para apresentar nuances e perversidades presentes nos comportamentos dos personagens. Outro exemplo fascinante de uso do sexo de maneira não convencional é no filme Crash - Estranhos Prazeres, em que o diretor David Cronenberg cria uma analogia entre prazeres sexuais e o sensacionalismo da mídia em relação á acidentes automobilísticos.

Além disso o cinema possui uma função de educar e despertar sensações no espectador, foram graças aos diversos filmes como O Segredo de Brokeback Mountain e Bottoms que as pessoas se sentiram mais confortáveis em discutir a sexualidade as representações da comunidade LGBTQIAPN+ no audiovisual.

Obviamente que em uma época de instabilidade financeira, os estúdios de cinema principalmente na década passada passaram a financiar produções que atingissem o maior número de pessoas possíveis e as cenas de sexo, infelizmente tornaram se um limitador para atingir esse objetivo, afinal todo mundo queria o seu próprio Vingadores. Contudo, o sucesso de filmes recentes como Pobres Criaturas e Saltburn demonstram que essa moda de tornar o cinema estéril está acabando. Talvez seja apenas uma questão de tempo ou de maturidade perceber que é natural sentir um desejo sexual em uma cena (assim espero).

Guilherme Gonçalves- é estudante Curso Jornalismo Uneb Campus Juazeiro Bahia