Nas margens do Rio São Francisco e diante de sua grandeza, a população do Submédio São Francisco celebrou e agradeceu, no Dia Nacional em Defesa do Rio São Francisco, a sua existência e resiliência. Com uma grande estrutura montada, o município de Lagoa Grande, no sertão pernambucano, mostrou o quanto essas águas são vitais para seus povos através da campanha Eu Viro Carranca para Defender o Velho Chico.
Na sua 11ª edição, esta foi a cidade escolhida para sediar o evento realizado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) com o objetivo principal de sensibilizar as populações da bacia para a urgência da preservação e revitalização.
Este ano, com o tema “Velho Chico, Revitalizar o Rio, Preservar Riquezas” a campanha evidenciou o quanto as águas franciscanas são fundamentais para a produção de riquezas culturais, econômicas e sociais, ao longo dos seus 2.863 km de extensão. Em Lagoa Grande, capital da uva e do vinho em Pernambuco, conhecida por sua capacidade de produzir todo o ano as mais diversas variedades de frutas, principalmente a uva, o evento aconteceu na comunidade de Vermelhos, distrito que abriga cinco das sete vinícolas instaladas no Vale do São Francisco.
Embora emancipada há 29 anos, a região é oficialmente habitada há mais de 300 anos e possui uma das construções mais antigas da Ilha do Pontal, onde a fé e a tradição resistem ao tempo através do seu maior símbolo, a capela de Nossa Senhora dos Remédios, a quem as famílias são devotas e preservam os costumes com a procissão realizada todos os anos em setembro, iniciada pelo leito do rio São Francisco, com a travessia até a capela.
No local, a mata permanece praticamente intocada, protegendo as margens do São Francisco e a sua população, onde mais de 120 famílias lutam pela sua preservação histórica, cultural e ambiental. “Este local faz parte da história do Brasil. Aqui foi o início da colonização portuguesa dos sertões. A região foi descoberta primeiro pelos desbravadores e depois por monges franceses. Então, a ilha tem essa riqueza histórica e cultural, reconhecida há mais de 300 anos, além do sincretismo religioso que convive com os hábitos culturais como a rezadeira e o rezador”, explicou o pesquisador Felipe Antônio Souza.
Foi assim, sob os fortes valores culturais, que a campanha Eu Viro Carranca para Defender o Velho Chico aconteceu em Pernambuco e reuniu representações de todo o entorno, a exemplo dos municípios de Cabrobó, Orocó, Petrolina, de Pernambuco, e Abaré, da Bahia, entre outros. Danças, cantos e versos fizeram parte da celebração que contou com a presença de artistas locais como o Grupo do Reisado – Lambedor, Banda de Pífanos da Ilha do Pontal, Ninho Pernambuco, entre outras atrações que apresentaram um pouco da cultura local.
O secretário do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Almacks Luiz Carneiro da Silva destacou os problemas enfrentados em todo o mundo devido a urgência climática.
“Estamos vivendo as mudanças climáticas, acabamos de ver os nossos irmãos gaúchos sofrendo e é claro que isso é mudança climática. Precisamos entender que não existe ‘plano B’. No baixo São Francisco o rio já não tem a mesma força que vocês veem aqui e isso é também consequência dos impactos da mudança do clima. Poderemos ter crises sérias também na bacia do São Francisco e a usina hidrelétrica de Sobradinho voltar a operar com 8000 m³ por segundo devido a chuvas intensas. Se isso acontecer, as ocupações irregulares, que desrespeitam a área de preservação permanente de 500 metros, vão sentir ainda mais esses impactos. Respeitar as áreas de proteção não dificulta e não inviabiliza nenhuma atividade econômica. Vamos preservar o rio Francisco São Francisco”.
Destacando as ameaças também no setor político, o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco, lembrou dos projetos de lei que tramitam no legislativo federal e representam severas ameaças à gestão e acesso à água.
“Precisamos estar atentos porque há projetos de lei tramitando que são verdadeiras ameaças como, por exemplo, o PL 4546, que fala sobre a privatização das águas, que é um bem da nação, por isso devemos conversar com nossos representantes políticos para que o recado de que o povo não quer privatizar o seu principal patrimônio, chegue no Congresso Nacional. A gente não pode aceitar isso. Outra preocupação é o PL 2818, que trata dos recursos destinados aos municípios atingidos por barragens. Querem retirar o valor de apenas 0,5% destinado à Agência Nacional de Águas e Saneamento para aplicar na política nacional de recursos hídricos, já insuficientes e destinar esse recurso para apenas 700 municípios, o que é um equívoco. Por fim, temos o compromisso dos comitês e da sociedade de discutir o Pacto das Águas, tratando a gestão e prevendo os períodos de escassez quando se instalam graves desafios e todos querem água. Cabe à gente enfrentar esse debate com todos e chamar os entes à sua responsabilidade”, concluiu.
Concurso cultural-Como forma de engajamento e incentivo à educação ambiental, ao longo das últimas semanas, a Secretaria de Educação de Lagoa Grande promoveu um concurso em várias categorias, todas com a temática do Rio São Francisco e suas potencialidades. Os estudantes foram premiados durante a campanha Eu Viro Carranca para Defender o Velho Chico.
O concurso contou com as categorias Desenho – Educação Infantil, Poema – Anos Iniciais, Cordel – Anos Iniciais, Fotografia – Anos Finais, Maquete – Anos Finais e categoria Receita Culinária Autêntica – Educação de Jovens e Adultos – EJA. A relação dos vencedores pode ser conferida nas redes sociais da Secretaria de Educação do município.
“Lagoa Grande foi premiada com este grande evento e nós, da educação, pensamos em trabalhar através de poemas, fotos, cordéis, tudo voltado para o Rio São Francisco. Nossos gestores escolares abraçaram a ideia e tivemos um excelente resultado gerando a participação ativa das nossas crianças, jovens e adultos. Colhemos bons frutos deste trabalho que representa uma educação de qualidade, consciente e sensibilizando todos sobre a preservação do meio ambiente e do nosso rio São Francisco”, afirmou a secretária de Educação do município, Sandra do Nascimento Amaral.
Ação científica-Ao mesmo tempo, um grupo de pesquisadores das universidades realizou uma ação científica no Rio São Francisco, com coleta de água e amostras para análise da qualidade. O trabalho contou com a coordenação do professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco e secretário da CCR Submédio, Abelardo Montenegro.
“As universidades têm um papel importante na colaboração tanto da pesquisa científica quanto nas ações que chegam às comunidades de forma prática. A pesquisa tem contribuído ao longo desses anos identificando os pontos vulneráveis na bacia do São Francisco, e a gente cumpre um importante papel de auxiliar com esses instrumentos as populações e subsidiar o poder público para ações urgentes e efetivas”, explicou o professor Abelardo.
Além da UFRPE, também participaram da campanha a Universidade de Pernambuco (UPE), Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Universidade do Estado da Bahia (UNEB), o Instituto Federal do Sertão (IF Sertão) e o Centro de Ensino Superior do Vale do São Francisco (Cesvasf).
A campanha que ainda contou com palestras, plantio de mudas nativas e peixamento, teve a participação e parceria da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf), INCRA, Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) e Agrovale.
CHBSF Texto Juciana Cavalcante
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