Apesar de a inserção de autistas no ambiente corporativo ser garantida pela lei de cotas, que determina a participação mínima para portadores de qualquer deficiência, poucas pessoas do espectro de fato estão empregadas.
O preconceito e a falta de assistência e de suporte para essa comunidade são algumas das razões para isso. Pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) detectou que 85% dos profissionais autistas estão fora do mercado de trabalho, dado que revela um longo caminho a ser percorrido para alcançar a inclusão.
Segundo dados mais recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), a estimativa é de que existam 70 milhões de autistas no mundo, 2 milhões deles no Brasil. O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é marcado, muitas vezes, por traços de isolamento social, dificuldade de expressão e ansiedade. Por isso, apesar de ser uma condição comum, o acesso a um tratamento médico é indispensável para a integração dessas pessoas.
Para Alex Araujo, CEO da 4Life Prime Saúde Ocupacional, empresa do segmento de saúde e segurança do trabalho, existe é urgente garantir a integração do portador de TEA dentro das empresas. "Os autistas possuem muitas características e habilidades de aprendizado e isso não pode ser desconsiderado, pela falta de conhecimento, na hora da contratação", diz.
Cursando o último semestre de jornalismo, Luís Felipe Sales, 28 anos, também sem carteira assinada, optou por estagiar voluntariamente na assessoria de comunicação da Associação Brasileira de Autismo Comportamento e Intervenção (Abraci) do DF. Portador de síndrome de Asperger grau leve, ele conta ter percebido o preconceito em seu último emprego, "quando perguntava a mesma coisa e sentia o pessoal se estressando".
Apesar do cenário difícil, Sales vislumbra mudanças no mercado para pessoas como ele. "É necessário que haja vontade política e que os legisladores façam valer ao menos as políticas fundamentais de inclusão", conclui.
De acordo com Araújo, o setor de tecnologia é o que mais contrata autistas, pois os portadores dessa condição se destacam pelo conhecimento matemático e raciocínio lógico, além de boa memória visual, capacidade de concentração e habilidades tecnológicas. No entanto, ao empregar um autista, o local e o modo de trabalho devem sofrer adaptações que diminuam as dificuldades naturais da condição.
Graduado em ciência da computação, Júlio de Castro, 21 anos, tem autismo nível 2. Desempregado há dois anos, relata que, em trabalhos anteriores, percebeu situações discriminatórias, mesmo sendo "discreto". Na visão dele, a pessoa com autismo se sente inferior, embora consiga "ver mais as coisas, ser perfeccionista". "Isso gera incômodo para os colegas", diz.
Sobre a dificuldade de reinserção no mercado de trabalho, Castro ressalta a falta de paciência dos chefes, a dificuldade em lidar com características específicas do espectro e também o estigma em relação à capacidade profissional. "Enquanto estava trabalhando, percebi que devia fazer muito além do que o normal para não ser subestimado. O mais difícil é a questão das habilidades. Por via de regra, nas entrevistas não se pode revelar que é autista, porque a empresa não contrata", afirma.
"É preciso educar a equipe para receber e saber lidar com o portador de TEA. Além disso, atribuir e demandar tarefas de alta concentração podem ajudar a desenvolver as habilidades do autista e favorecem a empresa", destaca Araújo.
Correio Braziliense
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