Demarcação de territórios e estereótipos são discutidos em painel sobre povos indígenas

“Será que vou ficar velha e nossas terras não estarão demarcadas? ”, esse foi o pensamento da escritora Ane Kethleen Pataxó, indígena de 23 anos nascida na Bahia, ao visitar Brasília quando tinha apenas 11.

Quase 10 anos depois da viagem, a demarcação dos territórios indígenas no Brasil ainda não se concretizou - na contramão dos avanços de casos de violência e de destruição dos seus territórios.

O tema foi discutido durante o painel Povos Originários em Cena, em Salvador, no Cinema do Museu, localizado no Museu de Geologia, no Corredor da Vitória, em Salvador. O evento contou com a presença de Ana Raquel Copetti, diretora de jornalismo da TV Bahia, Alexandre Boyd, diretor de programação, entretenimento e esporte, além de outros jornalistas da emissora.

Para compor a mesa de discussão, além da escritora Ane Kethleen, foram convidados o indígena pataxó e mestre em antropologia social Jerry Matalawê, e o doutor em sociologia e mestre em ciência política, Felipe Milanez.

Durante o painel, os convidados discutiram principalmente sobre o estereótipo que o indígena ainda é submetido em 2023. Segundo Jerry Matalawê, os indígenas são obrigados a reafirmarem suas identidades porque ocupam espaços como as grandes cidades e os centros universitários.

“Perguntam se ‘somos indígenas de verdade’, porque no imaginário das pessoas, para ser indígena é preciso viver nu e na Amazônia", destacou.
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Apesar de preconceitos e estereótipos ainda rondarem o dia a dia dos povos a nível estadual e nacional, Jerry vê como positivo o fato de mais pessoas se reconhecerem como indígenas ao longo dos últimos anos.

No Censo do IBGE divulgado em 2010, 56.381 se declararam como indígenas na Bahia. Na prévia do Censo de 2022, o número saltou para cerca de 191 mil - um crescimento de mais de 134 mil.

“Não há possibilidade de falar sobre nossa identidade, sem falar de nossas memórias. Hoje, entendo que muitas pessoas não têm memória do seu nível de pertencimento, mas ao meu ver, é grandioso que mais pessoas se reconheçam como indígenas no censo do IBGE”, afirmou.

Para Felipe Milanez, que é professor no Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos (Ihac), na Universidade Federal da Bahia (Ufba), a mudança também passa pela sala de aula. Segundo ele, as diferenças precisam contribuir para a formação do pensamento crítico nas universidades - e esse pensamento precisa ser bom para todos, e não só para uma parcela da sociedade.

Ane Kethleen concorda com o professor, afinal, para ela, os indígenas não precisam mais lutar com arco e flecha. Agora, a luta pode ser feita com livros, papel e caneta.

g1 Ba Foto reprodução