A suspensão da visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e comitiva à China, em função da inesperada pneumonia do inquilino do Palácio do Planalto, acelerou, como esperado, a divulgação da proposta do novo “arcabouço fiscal” para a economia do País.
Deixando de viajar, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acertou em definitivo o teor da proposta com o presidente Lula e acelerou seu programa de visita aos chefes dos poderes legislativos e demais autoridades, que deveriam ter acesso ao seu conteúdo antes que a sociedade viesse a tomar conhecimento do seu teor – o que ocorreu , em entrevista coletiva, na última quinta-feira pela manhã.
Na verdade, foram divulgadas as linhas gerais e intenções da proposta, pois o conjunto ainda precisará ser detalhado, transcrito no linguajar legal para ser enviado ao Congresso neste mês de abril, onde será debatido, analisado e aprovado em partes ou não.
Novo arcabouço fiscal coloca despesas em função da arrecadação
Em linhas gerais, a proposta aponta para:
Meta geral
Zerar o déficit público da União no próximo ano;
superávit de 0,5% do PIB em 2025;
superávit de 1% do PIB em 2026.
Objetivos importantes
Preservar gastos considerados prioritários em saúde, educação e segurança;
Aumentar investimentos públicos e impulsionar o crescimento econômico;
Controle da dívida pública e da inflação.
Pontos diversos
1. Investimentos: Haverá um piso para os aportes em investimentos. Será de R$ 75 bilhões mais a inflação do ano.
2. Trava para gastos: As despesas do governo deverão crescer abaixo da expansão das receitas. Os gastos só poderão subir o equivalente a até 70% da variação da receita. A receita será apurada entre junho e primeiro de julho, já que o Orçamento é enviado em agosto. Em 2024, por exemplo, a receita considerada será entre julho de 2022 e junho de 2023.
3. Gastos: Haverá uma banda para o crescimento real das despesas, independente do comportamento da arrecadação. As despesas sempre crescerão entre 0,6% a 2,5% ao ano acima da inflação. O objetivo é criar um mecanismo anticíclico. Ou seja, em momentos de economia mais fraca, o gasto seria maior. E em momentos de alta, isso não vira gasto.
4. Educação e saúde: Investimentos em educação, especificamente no Fundeb, ficarão de fora do limite para gastos, porque já preveem vinculação constitucional. Os gastos com o novo piso de enfermagem também serão excluídos da trava nos gastos.
5. Resultado primário: As contas públicas terão a meta de voltarem ao azul em 2025. A previsão, para este ano, 2023, é de um déficit primário (receitas menos despesas, descontando o pagamento de juros da dívida púbica) de 0,5% do PIB. Em 2024, este déficit ficaria zerado. E, em 2025, haveria um superávit de 0,5% do PIB.
6. Bandas: Essas metas de resultado primário seriam cumpridas dentro de bandas, com um intervalo de 0,25% para mais e para menos. Para este ano, a margem é de um déficit entre 0,25% do PIB e 0,75% do PIB.
7. Margem para investir: Se as contas públicas tiverem um resultado superior ao previsto na meta, este excedente será direcionado a investimentos.
8. Trava: Se, por outro lado, o resultado primário das contas públicas ficar abaixo da meta, o governo é obrigado a reduzir as despesas para no máximo 50% da expansão da receita no ano seguinte.
As reações à proposta do arcabouço, exibidas pela imprensa, foram variadas, desde as que a consideram válida e factível até as que a rotulam como não crível. Ao fim e ao cabo, a simpatia pela proposta foi maior do que a crítica. Até o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que insiste em manter a atual taxa de juros nos elevados 13,75%, que são um entrave ao projeto econômico de crescimento atual do governo, destacou, diplomaticamente, o que chamou de “esforços do ministro Fernando Haddad”.
“A proposta é bastante complicada, vai provocar muitos questionamentos, muita dúvida”, ponderou o professor Hélio Zilberstein, da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária – FEA da USP. “Em resumo, o que ela faz é preservar o crescimento do gasto público, o que não é surpresa porque estamos sob um governo do PT. Para esse governo, gasto é vida. Uma proposta de nova estrutura fiscal não poderia deixar de lado esse postulado. O gasto púbico vai crescer.”
Jornal da USP
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