Pesquisa do Instituto de Psicologia (IP) da USP ajudou a quantificar e detalhar algo talvez esperado pelo senso comum: em abril de 2021, quando as mortes por covid-19 no Brasil já chegavam a 325 mil, os brasileiros relataram se sentir menos felizes e estavam mais propensos a estados negativos, como estresse e nervosismo, em relação ao ano de 2018.
Os resultados também mostraram que, quanto maior o número de pessoas conhecidas que tiveram covid-19, menor o bem-estar dos participantes. Aqueles que tiveram familiares ou amigos próximos hospitalizados ou que morreram em decorrência de covid-19 também declararam maior adesão às recomendações de distanciamento e isolamento social.
O senso comum, porém, nem sempre se confirma quando aferido na prática, e estudos no tema podem ser contraditórios. Autora da pesquisa no IP, Tania Lucci conta que diversas pesquisas sobre o efeito da pandemia nas pessoas foram realizadas e os resultados variaram muito. Enquanto um estudo publicado no The British Journal of Psychiatry mostrou aumento de pensamentos suicidas, outro mostrou até mesmo um impacto positivo no cotidiano. Ainda, no World Happiness Report, ranking global de felicidade, o Brasil caiu da 29ª posição para a 41ª em 2021.
Na avaliação da pesquisadora, o estudo realizado no IP se diferencia por abranger pessoas de todas as regiões do País, contar com uma escala de bem-estar subjetivo adaptada ao contexto brasileiro e ter sido realizado em diferentes fases (uma antes e duas durante a pandemia). “Além disso, nós consideramos o quanto cada respondente foi afetado pela covid em relação a pessoas conhecidas ou próximas infectadas pelo vírus e o número de pessoas próximas ou parentes que foram internados ou morreram em decorrência da covid”, conta. “Outro diferencial é termos avaliado como as atitudes das pessoas diante da pandemia influenciaram o seu bem-estar”, complementa.
Ela destaca ainda que, quando se compara os índices de bem-estar de 2018 e 2020, não há diferença significativa. Os pesquisadores acreditam que, em 2020, as pessoas ainda não tinham se dado conta de como a pandemia havia mudado as suas vidas, o que explicaria a pequena diferença entre as respostas desses dois anos.
“Ao compreender os efeitos da pandemia no bem-estar dos brasileiros, o estudo pode auxiliar o desenvolvimento de programas adequados de apoio psicossocial para divulgar e possibilitar estratégias adaptativas de enfrentamento a crises, ajudando a transformar as pessoas em sobreviventes ativos face à pandemia ao invés de vítimas passivas”, defende Tania Lucci.
O artigo intitulado Some lessons learned from the COVID-19 pandemic: Subjective well-being before and during the pandemic among Brazilian adults foi publicado em um número especial, voltado para os impactos da covid-19, do periódico Current Research in Ecological and Social Psychology.
Jornal da USP
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