A volta do ensino 100% presencial em todo o País em fevereiro evidenciou algumas fragilidades nos protocolos de segurança que ameaçam a saúde de crianças e adolescentes.
Em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição, Luiz Guilherme Cantarelli, mestrando do Departamento de Ciência Política da FFLCH da USP e membro da Rede de Pesquisa Solidária, discorre sobre as condições de segurança das aulas e os dados levantados.
Em relação à volta às aulas e às condições sanitárias, o professor comenta: “Nós verificamos que um processo que se iniciou no segundo semestre do ano passado, e se acentuou bastante no início de 2022, é o processo de eliminação das medidas nos protocolos que dizem respeito ao distanciamento em sala de aula e aos limites de ocupação das salas. Então, nós estamos vendo na grande maioria das redes estaduais e municipais a volta 100% presencial, sem qualquer limite de ocupação de classe; paralelamente a isso, algumas medidas básicas em relação a máscaras, testagens e algumas outras foram enfraquecidas ou mantidas em patamares muito baixos. Nós acreditamos que, dado o momento epidemiológico, fazendo um paralelo com outros momentos similares, não se justificaria tamanha flexibilização sem o acompanhamento do enrijecimento de algumas outras medidas, como as de máscaras, por exemplo”.
A Rede de Pesquisa Solidária construiu um índice de segurança do retorno às aulas presenciais. “Esse índice a gente desenvolveu no início de 2021, quando algumas redes estaduais e municipais iniciaram o retorno híbrido e ele mede oito dimensões. Elas são divididas em duas categorias, de média complexidade e alta complexidade, em relação à necessidade de integração com outras Secretarias, além da de Educação. Então, passa-se por categorias como transporte; distanciamento em sala de aula e dentro da escola; higiene; ensino remoto, que pode propiciar a possibilidade do ensino híbrido; uso e distribuição de máscaras; ventilação; imunização; e testagem,” relata Cantarelli.
QUALIDADE DAS MÁSCARAS: Para o professor, um dos pontos que mais chamavam atenção em 2021 e continua sendo um ponto bastante sensível dos protocolos é em relação à qualidade das máscaras: “Nós verificamos que muitos Estados e muitas capitais fazem distribuições de máscaras ou fazem campanhas de conscientização do uso correto de máscaras. Mas dentre essas distribuições ou mesmo dentro dessas dessas campanhas informativas, a menção à máscara de maior qualidade é muito baixa. Então, nós temos que, em 2021, apenas 18% dos Estados faziam qualquer menção, seja na distribuição ou mesmo nas campanhas de conscientização ao uso de máscaras PFF2 ou com maior qualidade, e esse número aumentou muito levemente para 22% dos Estados. A grande maioria dos Estados não faz qualquer menção nos protocolos à máscara de maior qualidade”.
Um dos principais erros de gestão da pandemia no Brasil foi não priorizar a testagem em nenhum âmbito do combate à pandemia, inclusive nas escolas. “Uma das políticas, que já era recomendada pela rede desde o ano passado, é a testagem ativa de assintomáticos, considerando que o ambiente escolar é um ambiente que, dadas as características dos frequentadores, dos alunos serem muito jovens, a quantidade de assintomáticos é elevada”, ressalta Cantarelli, que completa ao dizer que “seria uma boa forma de identificar surtos, uma testagem de assintomáticos nas escolas. Mas isso é uma política que nós não adotamos em nenhum outro âmbito e nas escolas não foi diferente. Nos Estados apenas 7% previam esse tipo de ação e nas capitais esse número era de 15,4 % no ano passado e caiu para 7% também este ano. Então, estamos vendo uma diminuição da preocupação com testagem”.
Uma das medidas monitoradas pela Rede de Pesquisa é a exigência de carteira de vacinação para o retorno às aulas. Para o professor, os números são baixos: “Nós verificamos que essa é uma medida que foi adotada por poucos Estados e poucas capitais. E, se nós observarmos os indicadores epidemiológicos, número de casos, internações e óbitos, nós ainda estamos em patamares que, em outros momentos da pandemia, quando estivemos em patamares similares em termos de indicadores epidemiológicos, as medidas eram bastante mais rígidas em relação aos protocolos escolares. Então, por mais que nós tenhamos tido uma ampliação bastante considerável com a cobertura vacinal, ela ainda não foi capaz de nos levar a índices epidemiológicos que justificassem tamanha flexibilização das medidas”.
Jornal da USP
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