A conta não fecha. É o que mostram os resultados do levantamento contratado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco que teve como objetivo identificar, por meio de fotografia aérea de alta resolução e laser scanner, todos os usuários de água ao longo da área localizada entre as usinas de Três Marias e Sobradinho.
Os mais de 600 km percorridos no céu focaram em trechos que, segundo estudos, registram as maiores retiradas de água e volumes captados anualmente. São eles: trecho 1, entre os municípios mineiros de Três Marias e Ibiaí; trecho 2, entre os municípios de São Francisco, em Minas Gerais, e Carinhanha, na Bahia, e, por fim, o trecho 3, entre Paratinga e Morpará, ambos na Bahia.
A execução da Cobertura Aerofotogramétrica e do Perfilamento a Laser contratados aconteceu de 7 a 23 de outubro de 2020. No total, foram 22.313 fotografias tomadas e 533 faixas de voo. O serviço foi executado ao custo de R$ 1.665.397,60.
Os dados obtidos a partir do mapeamento foram sobrepostos ao banco de dados da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), disponibilizado na plataforma do Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos (SNIRH).
O aerolevantamento contratado revelou 2062 interferências nas regiões monitoradas, a maioria delas, 1942, referentes à captação. O número é mais do que o dobro do registrado oficialmente: cerca de 850 usuários cadastrados.
Thiago Campos, da Gerência de Projetos da Agência Peixe vivo (APV), explica que “nesse momento não há como afirmarmos que se tratam de usos clandestinos ou irregulares, uma vez que não foi objetivo desse trabalho avaliar a legalidade dos usos de água e sim identificar a sua localização e compará-los com o banco de dados oficial”.
Ele reforça que o cadastro de usuários de recursos hídricos requer uma atualização periódica: “esse instrumento é de extrema importância para se ter conhecimento de quem, como e onde se faz uso da água.”
Vale frisar que com o resultado do levantamento em mãos, já está na pauta a necessidade de apresentação formal dessas informações perante as autoridades competentes para a fiscalização do uso de recursos hídricos, notoriamente a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). “A nossa expectativa é de que teremos desdobramentos desse trabalho no segundo semestre de 2021, a fim de avaliar possíveis usos irregulares”, conta Thiago Campos.
GESTÃO E COBRANÇA: O presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, reforça sobre a importância do aerolevantamento para a gestão da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco: “esse trabalho faz parte das ações estruturantes do Comitê. É fundamental saber sobre os usos da água, retiradas e lançamentos de efluentes na calha central do Rio São Francisco e fazer um esforço para incorporá-los ao sistema. Isso está ligado a um dos principais instrumentos de gestão hídrica, que é a cobrança pelo uso da água bruta”.
Ele destaca que a cobrança gera um sentimento de responsabilidade em quem faz captação e contribui para fomentar o tratamento de efluentes. E diz mais: “esses recursos da cobrança são essenciais para a aplicação do Plano de Gestão da Bacia, para fazermos, por meio da nossa agência delegatária, uma série de ações que beneficia o rio, os pagantes e, claro, as populações que interagem com ele, além de toda a sociedade.”
Para que isso avance, é fundamental manter o cadastro atualizado. Anivaldo explica que, tirando os isentos, que ficam abaixo da linha de corte pelo volume captado, não pode haver um conjunto de usuários que paga e outro que não paga. Ele comenta, ainda, que os resultados do aerolevantamento serão encaminhados à ANA, para que façam o que for cabível no que diz respeito à outorga dos usuários não cadastrados, bem como para o Conselho Nacional de Recursos Hídricos e para as secretarias estaduais. A ideia é que todos possam fazer uso desses dados que trazem também ganhos adicionais, por revelar nas imagens outras informações relevantes no contexto ambiental.
É importante destacar que a contratação desse aerolevantamento foi motivada por um achado em 2016, quando a partir de um voo num curto trecho do Baixo São Francisco, identificou-se uma série de usuários não contemplados no SNIRH. Esse experimento, na época, foi realizado pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e acendeu um alerta sobre a existência de possíveis usos não regularizados.
Etapa central desse mapeamento, a identificação das interferências e das feições de uso de recursos hídricos permitiu, a partir da restituição fotogramétrica, detectar elementos de interesse do mapeamento com os dados do perfilamento a laser.
Conforme atesta o relatório final, a etapa de restituição fotogramétrica foi realizada de forma totalmente digital, com geração dos arquivos do mapeamento em forma vetorial e pontual. Sobre o perfilamento a laser, vale entender que uma característica importante dessa tecnologia é a possibilidade de realizar o registro de múltiplos retornos, o que permite determinar a altura de objetos que estão sobre a superfície mapeada. Para isso, foi usada uma aeronave com equipamentos de alta sensibilidade que viabilizam a aquisição de dados com precisão (20 pontos/m²).
Estes processos foram incorporados a partir da necessidade constatada pela equipe técnica para identificar:
Captação flutuante (balsas ou similares);
Captação em terra firme (incluindo casa de bombas);
Tubulações de tomada d’água;
Canais de desvio (ou canal de chamada) para a tomada d’água;
Tubulações (ou galerias) para lançamento de efluentes;
Tanques ou instalações utilizadas para aquicultura;
Outras porventura identificadas.
No total, foram 2062 interferências encontradas nos três trechos. A maior parte delas, 1942, foram relativas à captação, seguidas pelas de lançamento, com 78 achados.
O trecho 2, que compreende a área de São Francisco, Minas Gerais, e Carinhanha, na Bahia, foi o que apresentou mais interferências: 821, sendo 810 categorizados como captação, abrangendo canais de desvio ou de chamada para a tomada d’água, captação em terra firme e captação flutuante. Outros 11 foram identificados como tubulação ou galerias para lançamento de efluentes, bem como canais de desvio para o mesmo fim.
A tabela a seguir detalha os números encontrados a partir do aerolevantamento em cada um dos trechos:
Após identificação das interferências existentes, foi realizado um comparativo de quantitativo com os pontos outorgados presentes dentro das áreas dos trechos de interesse do projeto.
1. Canais de desvio (ou canal de chamada) para a tomada d’água, captação em terra firme (incluindo casa de bombas, captação flutuantes (balsas ou similares, tubula’ão de tomada d’água.
2. Tubulação (ou galerias) para lançamentos de efluentes, canais de desvio (ou canal de chamada) para lançamento de efluentes.
3. Tanques ou instalação utilizados para aquicultura.
4. Drenagem, estrutura na superfície, esteira de carregamento.
RELATÓRIO FINAL: O relatório final oriundo desse mapeamento apresenta de forma detalhada as etapas desenvolvidas na execução do Levantamento Aerofotogramétrico, Perfilamento Laser, Apoio de Campo e Base Cartográfica de Precisão, com destaque para os resultados que emergiram dessa iniciativa.
Entre as informações importantes que também podem ser consultadas no documento, estão: justificativa e objetivo dos trabalhos, escopo, planejamento das atividades, bem como suas descrições metodológicas e anexos, com produtos técnicos.
Outros produtos contemplados desde o início das atividades foram: Plano de Trabalho, Fornecimento das imagens dos voos (ortofotos), Execução de Voos e Apresentação de Dados Brutos do Laser Aerotransportado; Elaboração de Base Cartográfica, Modelo Digital do Terreno e Modelo Digital de Superfície.
O aerolevantamento foi realizado no âmbito do Contrato de Prestação de Serviços Nº 026/2020, firmado com entre a TOPOCART – Topografia Engenharia e Aerolevantamentos S/S LTDA e a Agência Peixe Vivo, por meio do Ato Convocatório Nº 002/2019.
Por meio do Cadastro Nacional de Usuários de Recursos Hídricos – CNARH, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) realiza a gestão da plataforma de cadastramento das informações dos usuários que fazem a captação de água, lançamentos de efluentes ou demais interferências diretas em corpos hídricos.
As outorgas cadastradas e emitidas entre 2001 e 2020 estão disponíveis no banco de dados da ANA e foram analisadas para posterior confrontação de dados sobre os produtos finais.
CHBSF
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