O risco de morrer após uma parada cardíaca, dentro ou fora do hospital, pode ser até quatro vezes maior em pacientes com Covid-19. Para as mulheres, esse risco pode chegar a nove vezes.
Esses são alguns dos resultados apontados em um novo estudo conduzido por pesquisadores da Suécia e publicado na revista European Heart Journal, em fevereiro deste ano.
A pesquisa avaliou os registros de paradas cardíacas entre os dias 1º de janeiro de 2020 e 20 de julho de 2020. Os dados incluíam tanto infartos sofridos em casa quanto os que ocorreram dentro do ambiente hospitalar.
No início da pandemia, alguns estudos já sugeriram que a alta incidência de infartos poderia estar relacionada à Covid. Em alguns dos lugares mais afetados pela pandemia, como o norte da Itália, dados de março já apontavam para um aumento de até 187% para infartos em casa.
O novo estudo, no entanto, é o mais detalhado em relação às formas e efeitos dos infartos sofridos antes e durante a pandemia, assim como dentro e fora de hospitais. Foram avaliados 3.044 casos de paradas cardíacas, sendo 1.964 fora de hospitais e 1.080 que ocorreram em ambiente hospitalar.
Para avaliar os efeitos da Covid-19 nessas paradas do coração, os pesquisadores dividiram os registros em dois grupos: um pré-pandemia, formado pelos casos de 1º de janeiro até 16 de março de 2020 –quando o governo sueco decretou o início da pandemia no país– e de 16 de março em diante.
Os registros também foram divididos em paradas cardíacas fora de hospitais (OHCA, na sigla em inglês) e paradas cardíacas dentro de hospitais (IHCA, na sigla em inglês). Do total de casos OHCA, 88 (10%) eram de pacientes confirmados com Covid-19, e nos casos IHCA, 72 (16%) pacientes foram acometidos pela doença.
No caso dos pacientes que tiveram infartos fora do hospital, o risco de morte após 30 dias do evento foi quase quatro vezes maior do que no período pré-pandemia. Já os casos que ocorreram dentro de hospitais tiveram aumento de letalidade em 2,3 vezes.
Houve diferença significativa quando considerado o sexo do paciente. Homens que sofreram ataques cardíacos em casa tiveram risco de morte 4,5 vezes maior, enquanto foi o triplo para mulheres. Já dentro de unidades hospitalares, o risco de morte após parada cardíaca no caso dos homens foi 50% maior, mas mais de nove vezes para as mulheres.
A maior diferença, no entanto, foi no chamado desfecho de sobrevida: 83,4% dos pacientes que tiveram paradas cardíacas em casa e tiveram diagnóstico confirmado de Covid-19 morreram em menos de 24 horas. Antes da pandemia, 7,6% dos pacientes sobreviveram após 30 dias do evento.
Para aqueles que sofreram a parada nos hospitais, 23,1% dos pacientes com Covid-19 sobreviveram após 30 dias do infarto, comparado a 36,4% dos pacientes pré-pandemia. Mais de 60% dos pacientes com o vírus morreram em 24 horas.
De forma geral, frente a um quadro de parada cardíaca, existem alguns procedimentos adotados que podem ajudar a impedir um quadro letal, como massagem cardiorrespiratória, uso de desfibriladores, injeções de adrenalina ou, em casos mais sérios, intervenções cirúrgicas para implante de stents.
Em alguns casos, quando a parada cardíaca acontece em casa, a demora para chegar ao hospital e receber atendimento médico pode ser fatal. Os pesquisadores consideraram também o tempo de ocorrência do infarto até o atendimento.
Como resultado, nenhum dos casos de infartos sofridos fora dos hospitais de pacientes com Covid-19 sobreviveu após hospitalização, enquanto 36% dos casos que ocorreram no hospital tiveram alta após a parada cardíaca.
É difícil estimar do total de paradas cardíacas relacionadas aos efeitos da Covid-19 ou aquelas que seriam decorrentes de outros problemas secundários, mas a influência da infecção no sucesso de sobrevida ou não é evidente, diz Pedram Sultanian, aluno de doutorado na Universidade de Gothenburg (Suécia) e primeiro autor do estudo.
"Nosso estudo mostra claramente que infartos e Covid-19 são uma combinação letal. Pacientes com Covid devem ser monitorados intensivamente, e medidas para prevenir paradas cardíacas devem ser tomadas, como por exemplo o uso contínuo de monitores cardíacos nesses pacientes de alto risco."
Como os pacientes com Covid-19 sofrem com falta de ar, uma das possíveis causas associadas com a alta mortalidade fora do ambiente hospitalar é o tratamento por massagem cardíaca simples, sem ventilação acessória (que pode ser o famoso "boca a boca", se ocorrer fora de uma ambulância, ou o uso de balões de oxigênio nesses transportes).
"Embora a literatura mostre que a aplicação de massagem cardíaca simples por pessoas não-especialistas pode ser tão efetiva para a sobrevivência quanto a massagem associada à ventilação, isso parece não se aplicar para os casos de pacientes com Covid-19, uma vez que o principal sintoma apresentado por eles é a falência respiratória", diz o artigo.
O estudo, porém, possui algumas limitações. Os dados se referem somente à região de Estocolmo (Suécia). O país, embora tenha sido um dos que sofreram com a pandemia, foi o único no continente europeu que não adotou um lockdown ou medidas mais duras contra a pandemia. As autoridades entenderam que seria melhor "deixar a pandemia rolar solta", com a economia aberta, para atingir a chamada "imunidade de rebanho".
Folha Press
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