Há 74 anos, o sofrimento do amor deixado para trás e o exílio forçado por conta da seca do sertão nordestino ficaram eternizados no cancioneiro brasileiro com a música Asa Branca.
Gravada pela primeira vez em 3 de março de 1947 nos estúdios da RCA Victor, no Rio de Janeiro, a canção é eternizada na voz de Luiz Gonzaga, feita em parceria com o compositor e advogado Humberto Teixeira, o Doutor do Baião.
Asa Branca tornou-se o hino do nordestino e reflete, como poucas canções, o brasileiro. Em 2009, ficou na quarta posição em lista feita pela revista Rolling Stone Brasil entre as 100 maiores músicas da história brasileira.
Luiz Gonzaga ajudou a popularizar os versos de Asa Branca ao apresentá-la em sua primeira aparição no cinema, no filme O mundo é um pandeiro. A versão original da música, em toada, caiu no gosto popular e logo depois foi gravada em ritmo de baião.
Atualmente existem centenas de versões do sucesso, em português e outros idiomas. Entre as canções da MPB, é uma das mais regravadas. E em diversos ritmos: à capela, interpretadas por bandas e orquestras. Grandes nomes da música brasileira também já cantaram os versos de Asa Branca, como Caetano Veloso e Raul Seixas.
O escritor José Lins do Rego disse que a letra da música é um dos mais belos versos da literatura brasileira.
O professor José Mário Austragésilo, comunicador social, escritor e ator, também autor do livro “Luiz Gonzaga: o homem, sua terra e sua luta”, afirma que um dos pontos marcantes na carreira de Luiz Gonzaga foi a valorização da identidade cultural local. Com esta marca, o Rei do Baião ganhou o mundo.
“É a música representativa do povo brasileiro, da luta do povo brasileiro, desse grande compositor, Luiz Gonzaga, o Rei do Baião. Asa Branca é a música mais importante do repertório dele. Claro que ele tem outras, mas Asa Branca é a grande bandeira da Música Popular Brasileira. Merece ser considerada o hino da MPB”, completa o escritor.
Do litoral ao sertão, Asa Branca sempre remete a alguma memória da vida e cultura de quem é nordestino. Para Val dos Santos, uma trabalhadora que mora no Recife, ouvir e cantar Asa Branca representa o regaste a histórias de antepassados: “Eu sinto saudade do que eu não conheci. Lembrança de um passado que eu não conheci. Tristeza também por muitas coisas que a gente sabe, que não existe mais. E o que está se acabando por aí. O sertão é como se não existisse para o mundo aí fora. Os políticos não valorizam o nosso sertão”.
A toada Asa Branca tem versões em dezenas de idiomas, inclusive em japonês e coreano, e é familiar a brasileiros de qualquer região, mas na década de 40, naquele tempo soava tão estranha que foi motivo de gozação em cima de Luiz Gonzaga, pelos músicos do Regional de Canhoto, que participaram da gravação, em 3 de março de 1947.
Para eles, Asa Branca era a mesma coisa que cantiga de cegos nordestinos, pedindo esmola na rua. Fizeram uma fila, um deles com uma vela acesa, cantando a música. O episódio foi contado por Humberto Teixeira numa célebre entrevista ao conhecido pesquisador cearense Miguel Ângelo de Azevedo, conhecido como Nirez. Assim como Juazeiro ou No Meu Pé de Serra, e várias das parcerias iniciais de Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga, Asa Branca era cantada pelo Sertão nordestino, com letras diferentes, e fazia parte da bagagem que os dois levaram consigo para o Rio de Janeiro.
O tempo passa e Asa Branca segue inspirando artistas de outras gerações. Anderson do Pife, que mora em Caruaru, no Agreste de Pernambuco, diz que enquanto estudante de música, acredita que a letra é parte de um método brasileiro de ensino de música popular. "Essa melodia composta por conjuntos e de fácil execução, traduz o início de uma trajetória musical para quase todos os que iniciam seus estudos com ou sem ajuda de profissionais da área", diz.
Ele disse ainda que a música retrata poesia, cotidiano, paisagem e todo o referencial histórico do Nordeste. "Eis o hino do Nordeste e a primeira música que aprendi a tocar. Essa é a força que representa a Asa Branca em minha vida", finaliza.
Redação redeGN Foto arte: Arievaldo Viana
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