Artigo publicado na revista Estilos da Clínica discute os diferentes conceitos que definem a palavra adolescência, pois seu sentido varia de acordo com diferentes culturas. Segundo os autores do artigo, a psicóloga Bruna Rabello de Moraes e o psicanalista e professor Amadeu de Oliveira Weinmann, “a adolescência é uma construção cultural, isto é, uma noção de adolescência sempre é tributária do contexto que a define”.
Para definir a adolescência é preciso partir da premissa de compreender seu conceito “como um momento de passagem da condição infantil à adulta”, condicionado aos contextos culturais que implicam na relação interdependente entre sujeito e cultura. Os autores também relatam reflexões sobre os aspectos históricos e as elaborações de estudiosos do tema, pautadas nas produções culturais para entendimento do conceito de adolescência.
Com o intuito de entender melhor esse conceito, estabelece-se como critérios de análise a adolescência e seus rituais de iniciação, contexto histórico, discussões sobre a chamada “juventude temida”, a subcultura adolescente e as angústias juvenis. Bruna e Weinmann chamam a atenção para o olhar que normalmente dirigimos para a adolescência, “uma ideia em permanente mutação”, que não se observa em todas a culturas. Desse modo, não podemos “falar” de adolescência, mas das “várias adolescências que vão sendo construídas por determinadas culturas”, pontuam os autores. Nesse momento nasce a proposta de investigação, no percurso da história, de estudar as raízes do tema e como ele aparece nas sociedades, desde o século 16, em que “o sujeito ocidental passou a deparar-se com a existência de outras culturas”, passando pelo dito boom da adolescência nos EUA da década de 1950.
Muitos autores citados no artigo apontam a relação entre a adolescência e os rituais de iniciação em diversas culturas que mostram o crescimento e seus ritos de passagem, bastante diferentes em suas peculiaridades e características, como entre os akambas, na África Oriental britânica, no qual “as jovens devem evitar seu pai entre a época da puberdade e seu casamento”, explicam os autores. Para algumas culturas, os ritos de passagem, como no caso em pauta, e as mudanças que ocorrem quando se deixa de ser criança, ou seja, quando ela cresce, sinalizam que é o momento de os valores tradicionais familiares serem transmitidos e, em outras culturas, também é uma época de conceder-se certa independência e responsabilidade ao jovem.
O aparecimento da sociedade industrial, a criminalidade e o despertar da sexualidade nos jovens geraram preocupação, segundo médicos e pedagogos, com esse “momento de transição como algo perigoso e pleno de tentações”, portanto, passíveis de controle e vigilância. Os autores destacam que a psicologia considera a transgressão “como uma característica própria dessa fase da vida”, observando-se que a cultura do século 20 pontuou a articulação entre juventude e mudança social na Itália fascista da década de 1920 e, ao longo da década de 1960, os jovens deflagraram a contracultura e lideraram movimentos e lutas por direitos civis. A adolescência se consolidou como categoria social no século 20, cujos protagonistas, os jovens, ao longo da história, estiveram nas guerras mundiais, participaram de grupos de contestação política, reivindicações sociais e de gênero, momento em que a chamada “subcultura adolescente“ retratou uma juventude disposta a criar novos parâmetros que não os já absorvidos pelos adultos.
Para os autores, é importante salientar o pensamento do psicanalista Rodolpho Ruffino: “A adolescência consiste em uma experiência tipicamente moderna, decorrente da ausência da mediação simbólica promovida pelos ritos de passagem”, mostrando a juventude como categoria social e a adolescência como “operação psíquica”, “duas faces de uma moeda, cujo valor apenas a Modernidade seria capaz de reconhecer”. Concluindo, o artigo traça uma trajetória sobre resultados de produções culturais “que transmitem algo da experiência do adolescer”, trazendo o conceito de adolescência definida e incorporada por diferentes culturas, portanto, ressaltando a inexistência de uma adolescência universal ou natural.
*Margareth Arthur/Portal de Revistas USP
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