ARTIGO - O BAILE FUNK E A LICENÇA PARA MATAR

A barbárie de Paraisópolis nada mais é do que resultado do ódio de classe cultivado pela burguesia brasileira, cuja mentalidade é ainda aquela do antigo senhor de escravos, a quem era dado, entre outras coisas, a prerrogativa de decidir sobre a vida e sobre a morte.

O atual burguês encara a favela com a mesma sensação com que o senhor de engenho encarava a antiga senzala. Ou seja, como propriedade sua, sujeita à exploração, ao constrangimento, e, se preciso, à eliminação física. Os lundus das senzalas de então podem ser os bailes funk das quebradas de hoje. De contrapartida, o chicote e o pelourinho de outrora podem ser o camburão e o fuzil desses dias em que vivemos.  

Está mais do que evidente que o combate ao crime é tão-somente um álibi, uma justificativa, que, aliás, não cola mais... Ocorre que há em curso, por parte do Estado brasileiro (capacho da burguesia econômica e raivosa), um projeto sistemático de extermínio dos pobres, sendo o negro, o índio, o favelado (e os grupos minoritários no geral) os alvos preferenciais.

O "excludente de ilicitude", exaustivamente defendido por Moro, Bolsonaro e a  “bancada da bala”, outra coisa não é senão a legitimação desse projeto de extermínio, que, na prática, já vem ocorrendo. Se aprovado (me parece que desta vez ainda não o foi), policiais que assassinam, como no caso de Paraisópolis, estarão livres, leves e soltos, isentos de quaisquer culpas ou responsabilidades.

Paraisópolis é o caso mais recente e mais gritante. Gritante pela proporção que a tragédia alcançou, com nove adolescentes mortos e vários outros machucados.  Mas não esqueçamos de que a política de extermínio das populações periféricas já é uma velha conhecida das administrações tucanas, que agora se somam à administração de Bolsonaro, Moro, Damares, et caterva.

Em São Paulo (como no Rio de Witzel), há todo um aparado de repressão contra os pobres (algo que foi reforçado com a chegada de Dória ao poder). É espantosa, por exemplo, a forma como age a Guarda Civil Metropolitana da capital contra moradores de rua, dependentes químicos, pessoas trans, etc, etc. E tudo da forma mais escancarada, sem que ninguém se importe, a não ser um ou outro gato pingado, movido por algum nobre ideal.

É espantoso também saber que tais agentes (GCM, PM, e os cambaus) na sua grande maioria são pobres, ganham mal, e moram em regiões periféricas. Ou seja, é o Estado (capacho da burguesia econômica e raivosa) “usando” os pobres para reprimir e eliminar outros pobres. Tudo de que o sistema precisa para minar a força do povo e manter seu domínio perverso.

José Gonçalves do Nascimento - Escritor