O romance Vidas Secas, do escritor Graciliano Ramos, acaba de completar 80 anos de publicação. Ao longo das décadas, a obra tornou-se universal e manteve-se atual. O interior que sofre mergulhado na seca, a falta de oportunidades em um País desigual, as injustiças sociais que se perpetuam e o sonho de imigrar em busca de uma vida melhor permanecem - e não apenas no Brasil.
Vidas Secas, a obra que consolidou a imagem de Graciliano Ramos como escritor e intelectual, foi publicada no primeiro trimestre de 1938. Oitenta anos e 137 edições depois, o escritor Ricardo Ramos Filho, neto de Graciliano que se tornou pesquisador da vida e da obra do avô na Universidade de São Paulo (USP), afirma que Vidas Secas é muito mais do que um romance regionalista e que classificá-lo dessa forma é diminuir o seu valor.
O sertão sem nomes de Graciliano é onde se mora sob taipa e, facão a tiracolo, o vaqueiro pisa em ossada de boi. Os sertanejos enganam-se nas contas do patrão e sonham em ter uma vida melhor. Agora, o sertão é de Pelé e Branca, agricultores, resistentes da seca. De gente que anuncia passagem para viajar para fora, mas se vê obrigada a permanecer.
De sertanejos que foram embora, de outros que voltaram. Mas, diga-se, o percurso não é só de seca. Faixas de terra cobriram-se de verde. Às margens de rodovias asfaltadas, casas formam um mar de cisternas e antenas parabólicas, boa parte com Wi-Fi. Nas cidades, ainda muito católicas, há cafeterias gourmet e academias de jiu-jítsu. Com agricultura e pecuária protagonistas da economia, no entanto, a região segue refém das chuvas.
São os personagens que traduzem a atualidade da obra de Graciliano. A vida na roça, a violência, os programas sociais, a baixa escolarização, a gravidez precoce e a questão da terra misturam-se à seca, à falta de oportunidades, às injustiças e ao sonho de imigrar. As histórias também contam como a memória de Graciliano é (ou não) preservada, nos municípios onde ele nasceu, viveu a infância e trabalhou, tanto pela população como pelos governos locais.
"Se vivo,Meu avô Graciliano seria uma voz que continuaria gritando, ressaltando e colocando em foco as mazelas da vida brasileira, que são muitas e vêm se acentuando", afirma Ricardo.
Fonte: O Estado de São Paulo
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