ARTIGO – ENTRE O DISCURSO E A REALIDADE

Em estado de grande efervescência na política nacional, é natural que as redes sociais estejam infestadas de matérias de todas as tendências, charges criativas e jocosas, notadamente por parte daqueles que vibraram de forma mais excitada com a prisão do ex-presidente, fato que inspira reações as mais variadas. Talvez seja um contraponto às manifestações frequentes da militância, quase sempre exacerbadas e patrocinadas pelas organizações sindicais e afins. É bom lembrar, por falar em patrocínio, que isso não existe sem dinheiro... e de onde vem? Do meu, do seu, do nosso bolso!

Um fato que me parece relevante pensar, é que por mais que se queira endeusar “Sua Santidade” - aquele que cometeu a blasfêmia de se comparar a Jesus Cristo em honestidade -, outros nomes importantes do partido foram parceiros nos mesmos crimes. Ministros fiéis por anos a fio como Antônio Palocci e José Dirceu, Delúbio Soares e João Vaccari Neto (ex-Tesoureiros do partido), André Vargas (Deputado), e muitos outros, entre políticos, empresários e executivos como Aldemir Bendini (ex-presidente do BB e da Petrobrás), foram presos ou ainda estão encarcerados, e ninguém derramou uma lágrima por eles! Ninguém questionou a justiça ou a legitimidade daquelas condenações. Os seus crimes foram praticados de forma isolada e individualmente, ou fizeram parte de um esquema bem coordenado de sangria da nação? Pelo contrário, foram deixados no esquecimento como se fossem menos humanos que outros. Em nenhum momento a presidente do partido, Senadora Gleisi Hoffmann, comandou a implantação de vigília de protesto em frente à Polícia Federal, o que é discriminatório e humilhante! Imagino como se sentem esses seus outrora companheiros. Talvez se sintam otários, no mínimo!

Não teria jamais a pretensão de ocupar o papel de juiz no instante dessa breve análise, e o julgamento do mérito fica para os juristas. Mas, não posso deixar de entender que o que houve com a prisão foi um desfecho óbvio diante de um ato condenatório emitido por duas Instâncias Judiciais, e confirmado por dois Tribunais Superiores de 3ª. e 4ª. Instância (STJ e STF), após cumpridos exaustivos direitos de defesa! O que dá a entender é que as condenações foram ratificadas de A à Z, sem nada mais a fazer.

O Lula pregou tanta coisa positiva no passado contra os corruptos e a corrupção, afirmando que precisava acabar a impunidade no Brasil e que o lugar desses infratores era na cadeia, que despertou no brasileiro desencantado a convicção de que finalmente tinha surgido uma liderança íntegra, honesta e pura de intenções, e que veio para resgatar a confiança perdida! Vou recordar pequeno trecho de uma entrevista dele com o jornalista Milton Neves a respeito de Fernando Collor, em 1993, para sentir como soava fácil e de forma verborrágica o seu espírito ainda não corrompido: “Lamentavelmente, a ganância, a vontade de roubar, a vontade de praticar a corrupção fez com que o Collor jogasse por terra o sonho de milhões e milhões de brasileiros. [...] E... e... e ao invés de criar um governo, criou uma quadrilha como ele construiu” (!). Em outra ocasião, disse: “Se dependesse de mim, todos esses deputados corruptos estariam na cadeia” (!). Ressalto que não estou inventando nada, apenas voltando no tempo e juntando os cacos, os causos, os atos e os fatos.

Compreendo os motivos de ainda restarem alguns milhões de brasileiros que imaginam e acreditam na volta de um sonho um dia sonhado, mas acredito muito nas verdades ditas pelo grande Abraham Lincoln: “Você pode enganar algumas pessoas o tempo todo ou todas as pessoas durante algum tempo, mas você não pode enganar todas as pessoas o tempo todo”. Por algum tempo, mesmo desconfiado, também fiz parte desse universo de esperançosos, mas, hoje, como tantas outras pessoas, estou com a frase final do Lincoln.

Tenho todo o respeito do mundo àqueles que preservam o sentimento de fidelização político-partidária por comprometida vocação ideológica, mas o sectarismo em excesso em torno de um líder populista que abusou do seu sucesso conduz à cegueira estúpida, e ao bloqueio do surgimento de novas lideranças, de cujo mal o PT agora está sendo vítima, ao mesmo tempo que vive pregando um discurso destoante da realidade.

Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público – Salvador-BA.