Espaço do Leitor: Juazeiro e a cultura da invasão de terras.

Prezado Geraldo e leitores do Blog, 

Conta-se nos quatro cantos do município de Juazeiro, que a história de ocupação urbana desta cidade se deu, dentre outros processos, a partir de uma fazenda pertencente a uma viúva que, sem herdeiros, decidiu doar para a diocese local, toda a sua propriedade, ora rural.

Com o passar dos anos, houve um rápido crescimento demográfico promovido principalmente pelo advento da agricultura irrigada e por algumas iniciativas industriais e comerciais nesta terra desenvolvidas.

A Diocese de Juazeiro, por sua vez, não conseguiu manter-se donatária de sua herança fundiária e assistiu, em muitas partes de suas terras, uma enxurrada de invasões.

Essas ocupações irregulares nas terras da Diocese ocorreram sem nenhuma orientação técnica, do ponto de vista topográfico ou da mínima arquitetura urbanística, muito menos sem o planejamento para a intervenção de serviços públicos necessários, como saneamento, pavimentação, iluminação e instalação de equipamentos públicos. Pelo contrário, ocorreram sem métrica nenhuma, com ruas tortuosas, largas em uma parte e estreitas em outras, com terrenos sem padronização, sem recuo para construção de calçadas ou local para arborização.

Essa atitude histórica e coletiva desenhou Juazeiro como a conhecemos hoje. Mas suas marcas não são só no aspecto visual. A ocupação irregular ocorrida perante as antigas terras da viúva, deixou na "genética social" do povo juazeirense, a cultura da invasão. Parece que, por isso, toda terra nua ou terra pública encontra logo um grupinho de invasores para continuar a promover a desordem na urbanização da cidade. Muitas pessoas parecerem não respeitar o que é do povo.

Os terrenos públicos pertencentes ao município ou ao estado devem ser utilizados para a coletividade. Já que essas instâncias pertencem ao povo, o que neles for construído, deve ser para utilização e gozo de toda a população e não para uso particular. É incompreensível como as coisas constituídas de maneira errada voltam a acontecer aqui de maneira tão natural. A pessoa estaciona um trailer em uma calçada e daqui a pouco, já fez paredes, já instalou banheiros e já construiu um edifício. E ninguém diz nada. Empreendimentos invadem calçadas e faixas entre avenidas. Às margens das rodovias federais e estaduais que cortam Juazeiro, construíram lojas, oficinas, galpões, bares e até igreja. E pasmem, ainda aparecem os "donos" dizendo que possuem documentos. Como possuem documentos se o terreno é público e a lei é clara em dizer que terreno público só pode ser vendido através de licitação? Sem falar nos terrenos destinados à construção de praças e prédios públicos que foram cercados por "espertinhos" e por isso mesmo fica. E vale ainda ressaltar que a Lei do Usucapião não vale para terras públicas.

Não basta só olhar para os pobres que vivem em situação financeira difícil e necessitam de moradias dignas, esses que invadem terrenos públicos e particulares para construir barracos e forçar o poder público a olhar para eles, os invisíveis sociais. Mas também é bom para sociedade refutar as atividades de gente endinheirada que insiste na ocupação irregular de terrenos públicos para uso próprio, individual, apostando na impunidade e na falta de fiscalização.

Pelo que entendo, essa herança social criou em Juazeiro a cultura da invasão de terra alheia. Parece bom e normal invadir. Mas ainda há tempo para conserto.   

 Manoel Pires

Morador de Juazeiro