A história da prisão e morte do ex-deputado federal Rubens Paiva (1929 - 1971), que ganhou mais uma vez a atenção nacional e estrangeira com o sucesso do filme “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, colocou em primeiro plano os dias de dor e luta da família, particularmente da esposa, Eunice Paiva. No entanto, a repercussão traz oportunidade também de resgatar o legado do homem que, segundo pesquisadores, teve trajetória idealista e corajosa, liderou Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de suposto financiamento ilegal de campanha e defendia reforma agrária.
O filme, lançado no final do ano passado, foi inspirado no livro de mesmo nome escrito pelo jornalista Marcelo Rubens Paiva, filho do engenheiro. O ex-parlamentar foi levado da casa dele, no Rio de Janeiro, por agentes do Centro de Informações da Aeronáutica (Cisa), no feriado de 20 de janeiro de 1971 (dia de São Sebastião), há 54 anos.
No quartel da Força Aérea Brasileira (FAB), ele começou a ser violentado. Depois, foi entregue a militares do Exército nos porões do DOI-CODI, onde também foi torturado e assassinado naquela mesma noite ou nos dias seguintes, segundo o que foi registrado pela Comissão Nacional da Verdade, em 2014. Eunice Paiva somente obteve o atestado de óbito em fevereiro de 1996.
A história da prisão do ex-deputado federal e engenheiro paulista Rubens Paiva, em 20 de janeiro de 1971, assombra o Brasil desde aquele momento e também depois de o país voltar a ser democrático. Nessa avaliação do biógrafo Jason Tércio, que escreveu dois livros sobre o parlamentar cassado pelo regime de exceção, trata-se de um crime que está “engasgado na garganta do Brasil”.
“Nessas mais de cinco décadas, a história de Rubens Paiva reapareceu do passado para assombrar a consciência brasileira. Desde que desapareceu, houve vários momentos em que o assunto foi destacado”. Ele cita reportagens publicadas na década de 1970 e os pedidos de desarquivamento do caso em 1981, 1986, 1987 e finalmente o reconhecimento, na década de 1990, pelo Estado brasileiro da morte de Paiva.
Para ele, a repercussão nacional e internacional do filme “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, mesmo com o foco na trajetória da viúva, Eunice Paiva, tornou-se uma nova oportunidade de que a sociedade conheça, com novos produtos culturais, a crueldade da ditadura e também compreenda o legado de idealismo e coragem do parlamentar.
Isso ocorreu porque, na avaliação do escritor, o drama dos desaparecidos nunca foi realmente resolvido no Brasil. “Não somente não julgou nenhum torturador, mas também não teve esforços reais na procura dos desaparecidos”. O primeiro principal avanço nessa história, após a Constituição de 1988, foi a lei de 1995 que reconheceu como mortas pessoas desaparecidas em razão de acusação de participação em atividades políticas durante a ditadura.
Para ele, o caso do Rubens foi complicado em vista das inúmeras versões sobre o destino dele. “O caso ficou muito nebuloso porque o governo da época sempre divulgou versões falsas”. Uma delas deu conta de uma suposta fuga que teria ocorrido com a ajuda de colegas Era uma farsa que foi sustentada por militares, por exemplo, desde a primeira investigação, durante o governo de José Sarney, que mandou abrir inquérito policial militar.
Mas diferentes versões se multiplicaram, inclusive sobre o destino do corpo. No entanto, àquela altura, os nomes dos agentes envolvidos no assassinato foram revelados, mas inocentados. A Comissão Nacional da Verdade, em 2014, oficializou os autores dos crimes que vitimaram o ex-parlamentar. Segundo os registros, o tenente do Exército Antônio Fernando Hughes de Carvalho foi o responsável pelas torturas dentro da cela. Ele já faleceu.
O Ministério Público Federal (MPF) denunciou cinco militares reformados, em 2014: José Antônio Nogueira Belham, Jacy Ochsendorf e Souza, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos. Há 10 anos, a Justiça aceitou a denúncia e os militares tornaram-se réus. Dos cinco, três morreram (Sampaio, Jurandyr e Campos) desde o início do processo que está no Supremo Tribunal Federal.
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