A escolha de Ailton Krenak como membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) provocou reações positivas da sociedade.
A socióloga Christiane Machado Coêlho, que é professora do departamento de Sociologia da Universidade de Brasil (UnB), avaliou a escolha da instituição como positiva.
"Eu acho que é muito importante para a gente pensar uma mudança de paradigma e um reconhecimento histórico também. Pela primeira vez na nossa história um representante dos povos originários está sendo reconhecido em termos de escritor. A gente pode pensar uma forma de revalidação do conhecimento e dos saberes, das tradições e das mensagens desses povos tradicionais, que durante tanto tempo ficaram silenciados, não tiveram validação e reconhecimento", comenta Coêlho.
Para a pesquisadora, a atitude da ABL mostra um rompimento com a ideia de que o conhecimento válido só vem do exterior. "O efeito multiplicador desse reconhecimento rompe com o colonialismo dos saberes, a gente considerava como base só os conhecimentos da Europa, dos Estados Unidos. Mostra uma mudança de modelo e reconhecimento de valores, tanto dos povos originários, quanto de novas e antigas formas de saberes", complementa.
Justamente com a intenção de diversificar a academia, Krenak comentou sobre o desejo de criar uma plataforma com diversas imagens, textos, filmes, e documentos nas línguas nativas. "Teria tudo a ver com a Academia Brasileira de Letras incluir mais umas 170 línguas além do português. Se olhamos os acervos que já existem, o Museu do Índio tem um acervo muito antigo de registros de narrativas, algumas delas só na língua materna. Vamos traduzi-las com uma tradução simultânea e as pessoas vão poder ouvir. Podemos fazer isso junto com todas as etnias que estão envolvidas no resgaste linguístico", comentou o escritor. A ideia é priorizar a oralidade das línguas maternas porque, segundo ele, "o que ameaça essas línguas é a ausência de falantes".
Reconhecido pelas obras Ideias Para Adiar o Fim do Mundo, A Vida Não é Útil e Futuro Ancestral, lançados pela Companhia das Letras, Krenak tenta mostrar novos jeitos de viver e ver a vida. "Ele traz questões para pensar o século 2021, coloca que a vida não é útil, de como a gente pode ter lições para adiar o fim do mundo. A pandemia trouxe um aumento das nossas incertezas do futuro e essas alterações climáticas também, seca, incêndio, enchente, clima desgovernado. Os livros do Krenak fazem pensar todo nosso modelo civilizatório, de desenvolvimento e abre para conceito dos indígenas da América Latina, o de bem-viver, de pensar em integrar com a natureza", finaliza a socióloga.
Escolha de Krenak-O escritor foi o favorito em uma eleição que contava com 11 candidatos e teve 23 votos. A historiadora Mary Del Priore, autora de uma significativa obra acessível ao grande público, foi a segunda mais votada, com 12 votos. Daniel Munduruku, pioneiro da literatura indígena escrita e o primeiro autor indígena a publicar um livro para crianças não indígenas (Histórias de Índio, Companhia das Letras, 1996), recebeu quatro votos na corrida para ocupar a cadeira 5, na qual estava o historiador José Murilo de Carvalho, que morreu em agosto, e pela qual já passou a romancista Raquel de Queiroz.
Correio Braziliense Foto Agencia Brasil
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