Quem é o legítimo proprietário de uma marca? Quem a cria e a utiliza por diversos anos ou quem obtém seu registro? Essa questão deverá ser decidida pela Justiça do Rio de Janeiro em um conflito sobre o uso da marca Novos Baianos.
A ação foi ajuizada em 2022 por Luiz Galvão contra Baby do Brasil e sua empresa, Baby do Brasil Produções Artísticas Limitada. Após a morte do poeta e compositor naquele mesmo ano, o processo prosseguiu com sua viúva e herdeiros.
A alegação principal da demanda é que, desde 2016, os contratos para shows estariam sendo feitos pela empresa de Baby, mas que as receitas não são repartidas igualmente com os demais integrantes do grupo. E que a marca Novos Baianos foi registrada somente em nome da cantora.
Consultando o site do INPI pudemos verificar que, de fato, a marca está em nome de Bernadete Dinorah de Carvalho Cidade, ou seja, Baby. E, consultando os documentos juntados ao processo que tramita na 44ª Vara Cível do Rio de Janeiro, é possível ver um termo de acordo em que os demais integrantes autorizam esse registro em nome dela. Nele há também uma autorização, inclusive de Galvão, para que a Baby Produções representasse a banda. Mas o mesmo documento prevê que cada integrante deveria receber 20% dos valores obtidos com os contratos e com a exploração da marca.
O que os sucessores de Galvão pleiteiam é o recebimento desses valores. Mas, além disso, pedem o direito de uso da marca Novos Baianos.
Baby e a empresa ainda não apresentaram sua defesa, mas, por certo, seus advogados apresentarão documentos para contestar o que está sendo alegado.
Mas voltando, à pergunta do início desse texto, é possível garantir o direito de uso de uma marca a quem a criou sem ter seu registro e sem autorização de quem a registrou? É possível garantir esse direito à viúva e aos herdeiros de Luiz Galvão?
Nossa lei (9279/96) segue o sistema atributivo que reconhece o direito de propriedade (ou monopólio para alguns) de uma marca a quem primeiro solicitar o registro perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
Uma exceção a essa regra é o direito garantido ao usuário de boa-fé. Funciona assim. Se alguém protocola um pedido de registro de marca, mas já existe uma outra pessoa usando, de boa-fé, uma marca igual ou semelhante há mais de seis meses, ela terá a preferência para adquirir sua propriedade. Mesmo que não tenha ainda solicitado o registro.
Mas essa hipótese não se aplica ao caso dos Novos Baianos, pois não há precedência de uso entre Galvão e Baby. Para que o juiz da causa dê razão ao compositor, será necessário encontrar outros fundamentos.
Poderá retirá-los do julgamento envolvendo o uso do nome de outra banda brasileira, a Legião Urbana. O caso tornou-se emblemático exatamente porque a justiça autorizou o uso da marca por Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá em uma disputa com a Legião Urbana Produções Artísticas Ltda, titular do registro e que tem como sócio o filho de Renato Russo.
Para o STJ, o exercício do direito de propriedade, incluindo aquela sobre as marcas deve atender uma função social, como prevê a Constituição Federal. Os ministros destacaram também, que a expressão Legião Urbana remete à própria identidade dos músicos como um reflexo de suas personalidades.
Assim, a restrição desse uso, mesmo por aquele que detém o registro, pode representar verdadeiro abuso de direito.
Ou seja, em algumas situações a letra da lei deve ceder espaço a princípios que condizem mais com o próprio espírito do legislador.
O autor deste texto é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial.
Correio Braziliense Foto Ilustrativa
1 comentário
02 de Feb / 2024 às 20h37
Em resumo, a vida, o respeito, a competência, e a obra de Galvão não significa nada. O que vale agora é a ganância despertada por pessoas que mostram agora que não lhe tinham o menor respeito mais sim, uma fonte de riqueza.