O lançamento de um autoteste promete deixar o diagnóstico do HPV mais acessível a mulheres e a homens transgêneros que mantiveram o útero, além de ajudar a expandir o acesso à saúde no país.
Nos países que já adotaram a modalidade, a paciente recebe do ginecologista o pedido médico e o kit de autocoleta e conservação da amostra vaginal. Ela faz a coleta em casa e depois leva o material a um laboratório para investigação. O processo é menos invasivo e tem precisão comparável ao procedimento realizado no consultório médico.
A multinacional BD (Becton Dickinson Indústrias Cirúrgicas Ltda), do ramo de tecnologia médica, comercializa no país três tipos de kits: o Rovers Evalyn Brush, da Rovers Medical Devices BV, o Copan FLOQSwabs e o Copan Self FloqSwabs (este também representado pela Roche), da empresa Copan Itália SPA —todos aprovados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
"A tecnologia foi criada como uma alternativa aos testes clínicos tradicionais e torna o exame preventivo mais acessível, mais conveniente e igualmente seguro ao método realizado em clínicas e laboratórios. Pessoas que vivem em áreas remotas ou com acesso limitado aos cuidados de saúde podem ser testadas em um período de tempo menor", afirma a ginecologista Neila Speck, professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e presidente da Comissão Nacional Especializada no Trato Genital Inferior da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia).
Existem países que já utilizam a autocoleta como a primeira estratégia para rastreamento de câncer de colo de útero. "Na Austrália, a mulher não vai mais a um centro de saúde para fazer o papanicolau. Ela coleta o material em casa e encaminha a um serviço de saúde. A paciente só será convocada para ir ao centro de saúde se o resultado do teste for positivo para o HPV", explica a especialista.
"Na nossa área existe o estigma da mulher fazer anualmente o exame de papanicolau, que tem as suas limitações. Só tem câncer de colo de útero quem tem HPV de alto risco. Então, fazer o papanicolau em quem não foi exposta ao HPV é desnecessário. Por outro lado, para a mulher exposta ao HPV o papanicolau tem uma sensibilidade baixa em diagnóstico e pode falhar", afirma a médica.
"O autoteste tem uma sensibilidade muito mais alta que o papanicolau, pode ser feito com intervalos mais longos, a cada cinco anos, e representa uma economia em saúde. Pensando em saúde pública, ele é muito melhor, dá uma sensibilidade e segurança maior e gera economia a longo prazo. Claro que se a mulher tem dor, sangramento, corrimento ou outra queixa ela precisa ir ao médico", diz a ginecologista.
O Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, começará a oferecer a nova tecnologia no segundo semestre deste ano. A instituição aguarda a entrega do dispositivo de autocoleta para realizar o treinamento das equipes assistenciais. A previsão é que a tecnologia esteja disponível a partir de agosto.
A testagem será realizada mediante solicitação médica. A paciente poderá optar pela autocoleta, após receber orientações da equipe assistencial, ou pela convencional.
De acordo com a assessoria de imprensa do Sírio-Libanês, não é um teste diferente do já oferecido. Então, o preço não muda para as pacientes e os convênios atendidos. O diferencial é apenas a forma de coletar.
Os testes para a validação da nova modalidade foram feitos em parceria com a Unifesp, por meio da análise de cerca de 20 amostras colhidas das duas formas: convencional e pela autocoleta.
"Os resultados foram equivalentes e seguros em relação aos testes já existentes. A ideia é ampliar o estudo e produzir um trabalho científico", afirma o médico Leonardo Testagrossa, chefe do departamento de anatomia patológica e molecular da instituição.
A autocoleta não faz parte do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), e portanto não é de cobertura obrigatória pelos planos de saúde. O Rol vigente contempla três tipos de exames para investigação de HPV: tipagem por PCR, detecção do DNA por técnicas de hibridização e detecção por técnicas imuno-histoquímicas, de acordo com a agência.
O Ministério da Saúde afirmou que ainda não há pedido de avaliação na Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde) para que a tecnologia seja oferecida pelo SUS.
O único exame coberto pelo SUS para a prevenção do câncer de colo uterino é o papanicolau. "Os meios científico e acadêmico estão numa luta grande para que o Ministério da Saúde comece a fazer o teste de DNA do vírus HPV como estratégia de rastreio do câncer de colo do útero, mesmo que a princípio não seja por autocoleta", diz Neila Speck.
Folhapress | Foto: Reprodução / Drauzio Varela
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