De bicicleta, moto, carro ou carrinho de mão, as moradoras e moradores da comunidade Arapuá Novo em Jaguarari-BA chegam ao sistema de dessalinização para abastecer seus galões com água adequada para o consumo humano.
Este é um ponto de encontro certo que acontece três vezes por semana, proporcionando a aquisição de água de qualidade para beber e cozinhar à toda comunidade.
Há dois anos, a realidade era outra, as famílias eram abastecidas com água bruta do rio São Francisco distribuída por meio de adutora construída para uso de uma mineradora que atua na região. A água chegava na casa das famílias sem tratamento. “A gente fazia o tratamento da água na própria casa com cloro, e algumas pessoas nem chegavam a fazer. Então, tomavam água sem tratamento nenhum”, lembra a moradora, Telma Fernandes. A moradora Jocélia da Silva conta que “Sem o sistema tem essa dificuldade, (…) ou compraria água mineral, ou então usava a água sem tratamento. Então, como nós temos o sistema já é um avanço ... a saúde agradece”.
Assim, com a chegada do Programa Água Doce (PAD), uma política pública que visa aumentar a oferta de água de boa qualidade para o consumo humano, a comunidade de Arapuá Novo recebeu a implantação do sistema de dessalinização de água, proporcionando aos moradores/as o acesso a água potável, um direito humano essencial, fundamental e universal. “O sistema trouxe grande benefício para a comunidade, eu particularmente não consigo mais tomar outra água, porque para mim é uma água muito boa, que só traz benefícios para a saúde”, destaca Telma que também é agente de saúde da comunidade.
O PAD lançado em 2004, vem possibilitando que diversas famílias do Semiárido tenham acesso a água de beber de qualidade, nessa região onde a maioria dos poços perfurados tem águas salinas e salobras, inadequadas para o consumo humano. Assim, o Programa que traz uma perspectiva da Convivência com o Semiárido foi elaborado de forma colaborativa, unindo a participação social, proteção ambiental, envolvimento institucional e gestão comunitária local.
O sistema de dessalinização é composto por: poço, 3 caixas d´água para separar água bruta, concentrado e potável, dessalinizador, chafariz (onde é retirada a água para consumo) e tanque de contenção do concentrado. O Monitoramento do sistema é feito de 3 em 3 meses, como explica o colaborador do Irpaa, Valmir Loiola. “O monitoramento é feito para saber como está o funcionamento do equipamento, se o pessoal está consumindo as águas, o que estão fazendo com o rejeito, se o tanque está com lona rasgada, se tem algum problema”, mas se a pessoa que opera o sistema identificar algum defeito é feita uma visita para manutenção.
Além disso, o Programa Água Doce, realiza mobilização social com objetivo de garantir a autonomia da comunidade como meio de possibilitar que elas assumam efetivamente a gestão dos sistemas de dessalinização. Isso acontece através de formações para que a comunidade se aproprie da tecnologia dos dessalinizadores e de reúso dos efluentes. “Espera que a gente crie e acompanhe grupos gestores, grupos de pessoas formados na própria comunidade para que elas possam cuidar e zelar do sistema para que ele possa ter uma sustentabilidade e que a comunidade possa usufruir, usar dessa água, usar desse benefício”, explica o colaborador do Irpaa, Yêgo Ravel.
Nesse sentido, dentre os 114 sistemas acompanhados pelo Irpaa, em 20 municípios espalhados pelos territórios Sertão do São Francisco, Itaparica, Piemonte Norte do Itapicuru e Semiárido Nordeste II, o sistema de dessalinização da comunidade Arapuá Novo que atende uma média de 70 famílias, se destaca como exemplo de gestão coletiva, realizada exclusivamente, por mulheres. “O grupo gestão é composto por sete mulheres, pois quando foi feita a reunião para ter aceitação do projeto, não tinha nenhum homem que quisesse tomar a frente do projeto. A comunidade queria, mas ninguém queria assumir a responsabilidade, então as mulheres tomaram a frente”, relembra a operadora do sistema, responsável pela produção e distribuição da água, Catiane Benedito.
Assim, as mulheres conseguem realizar uma gestão coletiva que se preocupa com a viabilidade do funcionamento dos sistemas de dessalinização a médio e longo prazo, por isso realizam a cobrança de uma taxa de R$ 2,00 por galão de 20 litros de água, sendo que 50% do valor é repassado para as operadoras e os outros 50% e para o caixa do sistema, caso seja necessário algum reparo. O valor do caixa já contribuiu para melhorar o espaço do sistema de dessalinização, solucionando um empecilho identificado pelas gestoras, como conta Catiane. “A gente tinha um problema com a questão do mato, juntava muito mato no sistema, e pela dificuldade de arrumar trabalhador para estar limpando, a gente resolveu fazer o piso de concreto, que antes era brita. A gente resolveu usar o que tinha no caixa do sistema para fazer o piso”. Esse é apenas um exemplo dessa gestão coletiva que funciona, e visa cuidar do sistema de dessalinização, um bem comum para a comunidade.
Além da água tratada ser usada para consumo humano (cozinhar e beber), como citado anteriormente, a água também é utilizada na produção da “Carmélias Doceria”, uma fábrica organizada e gerida por mulheres da comunidade (a maioria dessas mulheres integra o grupo de gestão do sistema de dessalinização) que perceberam que a partir da chegada de água de boa qualidade, elas poderiam realizar o beneficiamento de frutas na produção de geleias, doces, polpas e compotas, gerando renda e autoestima para as mulheres. A “Carmélias Doceria” recebeu em 2022, o Certificado do Serviço de Inspeção Municipal (SIM), fortalecendo a comercialização e agregando valor econômico ao mercado local.
Desse modo, é notável que o Programa Água Doce, além de levar água apropriada para o consumo humano para localidades onde a distribuição de água potável não chegava, contribui não apenas com a saúde e qualidade de vida das comunidades, mas também possibilita o surgimento de ações que reforçam as potencialidades do Semiárido e do povo.
O Programa Água Doce executado pelo Irpaa é financiado pelo Estado da Bahia, através da Secretaria do Meio Ambiente (SEMA), da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR), e da Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (Car), por meio de convênio com o Governo Federal.
Eixo Educação e Comunicação do Irpaa
1 comentário
27 de Feb / 2023 às 07h43
Bela iniciativa. A minha dúvida é como e feito o descarte do sal retirado da água