AO FIM DE QUATRO ANOS vividos sob Jair Bolsonaro, as universidades federais brasileiras estão sucateadas, afirma o presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior, a Andifes, Ricardo Marcelo Fonseca.
É o resultado de sete anos de orçamentos encolhendo sucessivamente – em 2022, o dinheiro destinado às federais foi 55% menor que em 2015, em valores corrigidos pela inflação.
A falta de recursos fez mais que paralisar pesquisas e fechar salas de aulas, reduzindo o ingresso de novos alunos – foram apenas 311 mil em 2021, queda de 15% ante o recorde de 366 mil registrado em 2017. Com o bloqueio de verbas do parte do orçamento de 2022, em junho passado –R$ 438 milhões, o equivalente a 7,2% do total previsto para o ano –, a penúria se agravou: não há verba sequer para despesas básicas, como as contas de energia.
O ataque não se limitou ao torniquete orçamentário. Sob Bolsonaro, uma sucessão de figuras medíocres, movidas a rancor e ressentimento, foi chamada a comandar o Ministério da Educação, o MEC, num processo que chegou a seu ponto mais baixo com Abraham Weintraub. Tiete de Olavo de Carvalho, Weintraub elegeu as universidades federais como inimigas e passou a atacá-las, chamando-as de locais de “balbúrdia” e até usando mentiras como a de que abrigariam “extensas plantações de maconha” e produção de drogas sintéticas. Veja reportagem completa aqui
Weintraub terminou se demitindo do MEC em 2020 e fugindo do país temendo ser preso – era, àquela altura, investigado por ataques que dirigiu ao Supremo Tribunal Federal. Mas teve tempo de ajudar Bolsonaro a escolher professores de extrema direita para serem reitores em algumas instituições – mesmo que eles tivessem recebido votação pífia nas eleições internas.
O caso mais emblemático é de Cândido Albuquerque, escolhido em 2021 para comandar a federal do Ceará, a UFC, mesmo tendo sido o último colocado na eleição interna – fez menos de 5% dos votos. Albuquerque chegou a subir no palanque de Bolsonaro em evento da fracassada campanha do presidente à reeleição. Outro reitor bolsonarista, Janir Alves Soares, da federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, a UFVJM, comandou bloqueios golpistas em rodovias após a derrota eleitoral do presidente de extrema direita.
Albuquerque, Soares e outros três reitores bolsonaristas decidiram romper com a Andifes, numa tentativa de enfraquecer a entidade que há décadas faz a interlocução das universidades federais com o governo. Por isso, Fonseca diz que irá trabalhar pelo fim da lista tríplice de nomes para a reitoria, a partir da qual o presidente da República escolhe seu preferido.
Apesar de tudo, Fonseca é otimista quanto ao futuro. “Eu não sei o que que vai acontecer em 2023, a proposta orçamentária ainda está em discussão, mas o que a gente espera é isso, não só sair da lama como ter condições de caminhar”.
Professor de História do Direito da UFPR, Ricardo Marcelo Fonseca fez mestrado e doutorado na própria instituição em que hoje leciona, e pós-doutorado na Universidade de Florença, Itália, onde também foi docente visitante. É reitor desde 2016 e pesquisador com uma das bolsas mais prestigiadas do CNPq, além de presidente do Instituto Latino Americano de História do Direito.
"Veja, sou reitor desde 2016 e, desde então, acompanho uma retórica forte [contra a universidade pública], que começou com a tal “escola sem partido”. Era uma discussão inacreditavelmente tola, mas que assumiu uma dimensão e um impacto tremendo. Então, o problema é anterior a este governo, tem raízes num movimento conservador estruturado, internacional. E, se tem algo que é comum a todo movimento conservador, dentro ou fora do Brasil, é precisamente esse tipo de desqualificação da ciência, da cultura, dos cientistas, para não falar dos artistas", finalizou o reitor.
theintercept.com/brasil/ Foto ilustrativa
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