Nesta terça-feira, dia 25 de janeiro, o desastre de Brumadinho/MG completa três anos. Naquele dia, em 2019, a parte inferior do reservatório de rejeitos da mina Córrego do Feijão, da mineradora Vale S.A, rompeu, arrastando tudo o que havia pela frente e levando consigo, entre óbitos e jamais encontrados, 272 vidas, liberando ainda cerca de 12 milhões de metros cúbicos de lama contendo rejeitos de mineração. Este foi o maior desastre em barragens de mineração no Brasil e está entre os maiores do mundo.
Mesmo após este indesejado aniversário, diversas questões ainda pairam no ar, especialmente no que toca à responsabilização Cível, Administrativa e Penal tanto das pessoas físicas quanto das pessoas jurídicas envolvidas nesta tragédia.
A Vale do Rio Doce afirma ter realizado acordos individuais com mais de 1.600 famílias para indenizar as vítimas de Brumadinho. Apesar disso, em recente decisão proferida pela Justiça do Trabalho de Minas Gerais, movida pelo Sindicato da categoria, foi determinado o pagamento de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) por morte de trabalhadores, tendo a Vale do Rio Doce não apenas recorrido da decisão, mas também classificado como "absurda" a quantia definida a título de danos morais.
A Vale, igualmente, celebrou acordo na esfera Cível, tendo em vista os danos causados a terceiros em decorrência do rompimento da barragem, tendo sido fixado o pagamento da quantia de R$ 37.680.000.000,00 (37,68 bilhões de reais) a título de acordo. Estes valores serão destinados a diversas finalidades relacionadas à recuperação das áreas afetadas pelo incidente. Tal acordo, todavia, não impede que indivíduos que tenham sofrido danos possam pleitear, isoladamente, indenizações junto a Vale, o que, inclusive, já vem ocorrendo.
Constata-se, deste panorama, que tanto na Esfera Cível, quanto na Esfera Trabalhista, medidas vêm sendo adotadas para a responsabilização da Vale pelos danos causados à comunidade local e aos trabalhadores – inclusive terceirizados – que foram afetados pela ruptura da barragem de Brumadinho.
As maiores incertezas restam na responsabilização penal da Vale e de seus diretores pelos eventuais crimes que tenham decorrido do rompimento da barragem.
A primeira questão diz respeito às pessoas, físicas e jurídicas, de Direito Público e de Direito Privado que podem ser responsabilizadas pelos eventuais crimes que tenham sido cometidos. Inicialmente, importante destacar que tanto a Vale quanto seus diretores podem ser responsabilizados pelos crimes ambientais que tenham sido praticados. A eventual absolvição das pessoas físicas – diretores – não implica, necessariamente, na absolvição da pessoa jurídica, rompendo-se com a "teoria da dupla imputação".
Não há, ainda, consenso jurisprudencial – especialmente no âmbito do STF e do STJ - respeito da possibilidade de responsabilização da Administração Pública em decorrência dos crimes ambientais cometidos, tendo em vista a omissão na fiscalização do empreendimento como eventual motivação da tragédia.
Ainda na esfera Criminal, outro assunto que gera debates acalorados diz respeito à responsabilização criminal da Vale do Rio Doce em decorrência da morte de pessoas, enquadrando-se tal conduta como homicídio. Não há previsão legal, tampouco precedentes das Cortes Superiores, a respeito da possibilidade de imputação do crime de homicídio a pessoa jurídica, de modo que, a priori, apenas a Presidência e os Diretores da Vale poderiam responder por tal ilícito.
Em outubro de 2021, o Superior Tribunal de Justiça determinou a extinção de processo criminal que tramitava perante o Tribunal de Justiça de Minas Gerais tendo como réus o ex-presidente da Vale e outras quinze pessoas – funcionários da Vale e da empresa de consultoria que atestou a segurança da barragem, a TÜV SÜD. Para o Superior Tribunal de Justiça, a competência para julgamento destes crimes seria de competência da Justiça Federal.
A despeito de o incidente em Brumadinho ter ocorrido há três anos, ainda não houve oferecimento de denúncia pelo Ministério Público Federal no âmbito da Justiça Federal, não tendo sequer sido iniciada qualquer ação penal que possa culminar na responsabilização das pessoas físicas e jurídicas envolvidas.
A demora no oferecimento da denúncia coloca em xeque a possibilidade de responsabilização penal dos envolvidos, tendo em vista o decurso do tempo e a complexidade dos fatos envolvidos, o que dá grandes chances à ocorrência de prescrição da pretensão punitiva em face dos eventuais denunciados.
Ainda que já tenham se passado três anos desde o rompimento da Barragem da Mina do Córrego do Feijão, constata-se que um longo caminho ainda precisa ser percorrido para viabilizar a completa e efetiva apuração dos fatos, viabilizando o exercício da ampla defesa e do contraditório de forma adequada os envolvidos e, sem decisões precipitadas – tampouco excessivamente demoradas – a responsabilização dos envolvidos na mais letal tragédia da história da indústria minerária brasileira.
Luiz Paulo Dammski é advogado, Professor da Fundação de Estudos Sociais do Paraná – FESP, Sócio-fundador da Dammski & Machado Escritório de Advocacia desde 2014. Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Paraná - UFPR (2022-2026). Mestre em Direito (Direitos Fundamentais e Democracia) pelo Centro Autônomo Universitário do Brasil (UNIBRASIL) (2017-2019). Pesquisador nas áreas de Direito Constitucional e Processo Civil. Coordenador do grupo de estudos "Processo Civil em Perspectiva: desenvolvimento, direitos fundamentais e democracia", vinculado à Fundação de Estudos Sociais do Paraná (FESP). Advogado militante nos campos do Direito Administrativo, Direito Ambiental e Direito Minerário.
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