O presidente Jair Bolsonaro foi ouvido na noite desta quarta-feira (3) pela Polícia Federal, em Brasília, no inquérito que apura sua suposta interferência política no órgão. Bolsonaro cumpriu determinação do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF).
No depoimento, segundo transcrição da PF obtida pela CNN, Bolsonaro disse que entendia como “interferência política” na Polícia Federal o ato de realizar pedidos políticos, e não técnicos, a “gestores de órgãos públicos com a intenção de haver influência política sobre os trabalhos desenvolvidos pelo órgão”.
Ao longo do depoimento, o presidente negou “qualquer intenção de interferência política” quando sugeriu a Moro a alteração nas gestões de Superintendências Regionais da PF.
À PF, Bolsonaro confirmou que pediu ao ex-ministro Sergio Moro a substituição do então diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, “em razão da falta de interlocução que havia entre o presidente da República e o diretor da Polícia Federal”. O presidente disse ainda que “não havia qualquer insatisfação ou falta de confiança com o trabalho realizado pelo DPF Valeixo, apenas uma falta de interlocução”.
O inquérito foi aberto após o ex-ministro da Justiça Sergio Moro apontar que o presidente o pressionava para substituir o diretor-geral da PF por um aliado e exigia acesso a relatórios sigilosos da corporação. O ex-juiz da Lava Jato pediu demissão do cargo em abril do ano passado após a demissão de Maurício Valeixo do comando da PF.
O depoimento de Bolsonaro é um dos últimos atos da PF, que deverá remeter o inquérito ao procurador-geral da República, Augusto Aras, a quem cabe decidir sobre eventual denúncia do presidente.
A forma em que o presidente seria ouvido gerou um impasse. No dia 6 de outubro, após o presidente insistir em depor por escrito, a Advocacia-Geral da União (AGU), órgão que representa o governo, informou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que Bolsonaro pretendia ser ouvido presencialmente.
A mudança de posicionamento ocorreu pouco antes de a Corte iniciar julgamento em que definiria como o presidente seria ouvido. Após o comunicado, Moraes deu 30 dias para que o depoimento ocorresse. O prazo acabaria neste dia 7.
“Determino, ainda, à Polícia Federal que proceda, mediante comparecimento pessoal e prévio ajuste de local, dia e hora, a oitiva do Presidente Jair Messias Bolsonaro, no prazo máximo de 30 (trinta) dias. Ciência à Procuradoria-Geral da República. Comunique-se à autoridade policial”, determinou o ministro, na ocasião.
A CNN entrou em contato com a Polícia Federal e a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) e aguarda retorno.
Em nota, a defesa do ex-ministro Sergio Moro afirmou que “foi surpreendida pela notícia de que o presidente da República, investigado no Inquérito 4831, prestou depoimento à autoridade policial sem que a defesa do ex-ministro fosse intimada e comunicada oficialmente, com a devida antecedência, impedindo seu comparecimento a fim de formular questionamentos pertinentes”.
“A adoção de procedimento diverso no que concerne aos dois investigados não encontra justificativa plausível, tendo em vista a necessária isonomia legal que sempre deve existir entre os depoentes”, complementou a defesa.
O que Bolsonaro falou à PF
No depoimento, Bolsonaro disse que entendia como “interferência política” na Polícia Federal o ato de realizar pedidos políticos, e não técnicos, a “gestores de órgãos públicos com a intenção de haver influência política sobre os trabalhos desenvolvidos pelo órgão”.
Bolsonaro disse também que “não obtinha informações de forma ágil e eficiente dos órgãos do Poder Executivo, assim como da própria Polícia Federal”, mas que referia-se, quando mencionava não ter “informações” da PF, a “relatórios de inteligência sobre fatos que necessitava para a tomada de decisões e nunca informações sigilosas sobre investigações”.
O presidente declarou à PF que “muitas informações relevantes para a sua gestão chegavam primeiro através da imprensa, quando deveriam chegar ao seu conhecimento por meio do Serviço de Inteligência”.
Ao longo do depoimento, o presidente negou “qualquer intenção de interferência política” quando sugeriu a Moro a alteração nas gestões de Superintendências Regionais da PF.
À PF, Bolsonaro confirmou que pediu ao ex-ministro Sergio Moro a substituição do então diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, “em razão da falta de interlocução que havia entre o presidente da República e o diretor da Polícia Federal”. O presidente disse ainda que “não havia qualquer insatisfação ou falta de confiança com o trabalho realizado pelo DPF Valeixo, apenas uma falta de interlocução”.
Sua motivação para indicar Alexandre Ramagem no lugar, depôs Bolsonaro, foi em razão da “sua competência e confiança construída ao longo do trabalho de segurança pessoal do declarante durante a campanha eleitoral de 2018”, afirma a transcrição da PF.
A sugestão teria sido aceita por Moro com a condição de que o ex-ministro tivesse uma indicação futura garantida ao Supremo Tribunal Federal, disse Bolsonaro.
Outras indicações de Bolsonaro a cargos na PF também foram indagadas ao longo do depoimento. Bolsonaro confirmou que sugeriu a Moro a troca do Superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro porque “o Estado do Rio de Janeiro é muito complicado e entendia que necessitava de um Dirigente da Polícia Federal local com maior liberdade de trabalho”.
Uma troca na Superintendência de Pernambuco também foi abordada. Bolsonaro disse ter sugerido a mudança “em razão da baixa produtividade local e pelo fato da então Superintendente ter, anteriormente, assumido o cargo de Secretária Estadual de Pernambuco, o que não daria a isenção necessária nos trabalhos locais”.
Questionado sobre sua declaração sobre ter “tentado trocar gente da segurança no Rio de Janeiro”, Bolsonaro disse que referia-se apenas ao núcleo do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) que realiza sua segurança familiar. Segundo o presidente, o trabalho “poderia ser melhorado, principalmente no acompanhamento de seu filho Carlos Bolsonaro”.
Uma pergunta sobre um possível vazamento da Operação Furna de Onça, que mirava o suposto esquema de rachadinhas na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e envolveria seu filho, Flávio Bolsonaro, e o ex-assessor Fabrício Queiroz também foi feito ao presidente.
Bolsonaro negou ter conhecimento prévio sobre a operação e disse que ficou sabendo das informações por meio da imprensa. Ele ainda disse que conheceu o empresário Paulo Marinho – que apontou a possibilidade do vazamento da operação – por meio do falecido ex-ministro Gustavo Bebbiano.
Bolsonaro disse que Marinho “nunca” repassou a ele que a operação teria supostamente vazado por meio de um delegado da Polícia Federal.
O presidente também fez críticas a atuação de Sergio Moro frente ao Ministério da Justiça. Segundo Bolsonaro, ele teria percebido que Moro “estava administrando a pasta sem pensar no todo, sem alinhamento com os demais ministérios e o Gabinete da Presidência”.
Bolsonaro também disse ter cobrado de Moro uma “investigação mais célere e objetiva” sobre o atentado que sofreu na campanha presidencial em 2018.
Segundo o presidente, ele “não observou nenhum empenho do ex-ministro” e “houve uma apresentação do delegado responsável pela investigação do atentado com a presença do ex-ministro”. Mesmo assim, Bolsonaro também negou ter feito qualquer pedido que pudesse interferir nas investigações.
CNN / foto: Isac Nóbrega/PR
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