Há 45 anos, chegava em Juazeiro um homem que marcou o território Sertão do São Francisco com um espírito de luta inabalável pelos menos favorecidos e uma ética da solidariedade pautada na compreensão pelo outro e no reconhecimento de seus direitos sociais e políticos. Seu nome, Dom José Rodrigues de Souza, bispo da Diocese de Juazeiro.
Dom José Rodrigues nasceu no dia 25 de março de 1926, em Paraíba do Sul, no estado do Rio de Janeiro. O pai, Josino Rodrigues de Souza, trabalhava em uma fábrica de manteiga, a mãe, Maria Geralda de Souza, como empregada doméstica. Teve três irmãs e quatro irmãos e toda a família era muito religiosa.
Aos dez anos, teve contato com os missionários da Ordem dos Redentoristas e foi convidado para se tornar padre, indo para o Seminário Santo Afonso no estado de São Paulo. Entre os anos de 1946 a 1951, Dom José mudou-se para o Seminário Maior em Tietê, onde cursou filosofia, teologia e outras ciências, sendo ordenado como padre em 27 de dezembro de 1950. Ao ser nomeado Provincial dos Redentoristas de Brasília, em 1970, assumiu a “Rádio Difusora de Goiânia”, promovendo trabalho de conscientização, até finalmente ser nomeado bispo de Juazeiro na Bahia no dia 12 de dezembro de 1974.
Após ter adejado por esses lugares, Dom José Rodrigues viajou para o estado da Bahia com a idade de 49 anos, no dia 16 de fevereiro de 1975, como um quase estrangeiro, em terras ainda desconhecidas, para tomar posse como segundo bispo diocesano da Diocese de Juazeiro. No dia 18 de fevereiro, visitou pela primeira vez o canteiro de obras da Barragem de Sobradinho que teve início em 1972. Quando questionado o motivo da sua dedicação aos pobres, o bispo explicou que vinha de família humilde, sua ordem tinha como tema a “dedicação aos pobres”, mas que o principal motivo responsável por concretizar essa decisão, “a última gota d’água” foi ter encontrado a barragem de Sobradinho.
Contra a vontade de alguns dos colaboradores das paróquias, Dom José começou seu trajeto de visitas pelas cidades e vilarejos que seriam submersos pelas águas do lago. Confessou que “em toda parte” ouvia os lamentos do povo que pediam ajuda e orientação ao novo bispo. “O início foi muito difícil. Eu não tinha ideia, não sabia de nada sobre os problemas das pessoas. Todos eram contra mim, assim me pareceu, e eu não sabia com quem contar”, relatou ao escritor Siegfried Pater, que escreveu a biografia O bispo dos Excluídos: Dom José Rodrigues.
Do desejo em manter sua Diocese informada do que estava acontecendo tanto no campo como na cidade. De criar uma rede de solidariedade com outras dioceses, de interconectar os diocesanos a um espírito de luta e união, surgiu o boletim Caminhar Juntos, no ano de 1976 que hoje pode ser encontrado no Acervo Dom José Rodrigues, localizado na Biblioteca da Universidade do Estado da Bahia, em Juazeiro. Através do boletim, denunciou as injustiças sociais, mediando a situação dos ribeirinhos que sofriam com intensa seca, os conflitos entre posseiros e grileiros, a ação de empresas estatais que desrespeitavam os direitos da pessoa humana, como a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF) e a Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF) e os impactos sociais, emocionais e ambientais da barragem de Sobradinho que provocou o êxodo de mais de 70 mil pessoas de seus espaços de convivência.
Nas páginas do jornal também disseminou uma ética da solidariedade, pois acreditava que apenas caminhando juntos, os homens podem se libertar daquilo que os oprime. Segundo D. José, para caminhar juntos “não basta andar lado a lado. Caminhar é ser-para, é estar em disponibilidade. Exige comunicação, conhecimento daquele que caminha junto, entreajuda, solidariedade”. Esse “ser-para” e “estar em disponibilidade” ele realizou na prática, visto que andou ao lado dos colonos que viviam na área de projetos de irrigação, com pequenos proprietários rurais ameaçados pelos grileiros, com as mulheres em situação de prostituição para garantir a sobrevivência, com os pescadores que viam sua existência ameaçada pelo lago de Sobradinho.
Assim, rememorar e estudar a trajetória do homem que fez da sua vida um serviço aos pobres, se faz importante para compreender os problemas sociais, as experiências populares, mudanças e fluxos comunicacionais por quais passou o território Sertão do São Francisco. Mais do que isso, porque – em uma contemporaneidade onde os egos estão perdidos em si próprios e o discurso evangélico faz uso dos meios de comunicação para incutir nos sujeitos um espírito de conformismo – Dom José Rodrigues nos inspira a sairmos de nós mesmos para nos encontrarmos com a experiência do outro agredido, subjugado e para nos tornarmos sujeitos conscientes e responsáveis na luta contra a injustiça social.
Por Jônatas Pereira, estudante de Jornalismo da Universidade do Estado da Bahia – Campus III, e bolsista do projeto História e Memória do Território Sertão do São Francisco.
2 comentários
18 de Feb / 2020 às 12h59
D. José foi um exemplo de amor e dedicação ao nosso povo ribeirinho tão sofrido e esquecido pelos poderes públicos. Aqui chegou e tão rapidamente se integrou a comunidade dela fazendo seu mister. Seus esforços em renovar nossa paróquia tornando-a dinâmica e eficaz foi uma tarefa desafiadora. Ficou o exemplo de uma alma abençoada dedicada às causas não só religiosas mas também sociais. Nossa santíssima Senhora das Grotas o tenha sempre ao seu lado.
19 de Feb / 2020 às 16h43
BRASIL TUDO PIORANDO. DEUS ME LIVRE DO MAU BOLSONARO GEDEU TEMER MORO FARINHA DO MESMO SACO