Famílias camponesas da região do Angico dos Dias, formada por oito comunidades e localizada a cerca de 70 Km da sede de Campo Alegre de Lourdes, são alvo, mais uma vez, de ameaças de expulsão do território. A acusação é da Pastoral do Campo. Uma grilagem de terras de 83 mil hectares, que abrange a região noroeste do município e parte de Pilão Arcado, está colocando em risco o jeito de viver tradicional das comunidades de fundo de pasto que vivem há várias gerações no local.
Desde o final de janeiro, as comunidades, que já são impactadas pela mineradora Yara/Galvani, estão vivendo um clima de tensão e insegurança. Segundo os integrantes da Associação de Fundo de Pasto de Angico dos Dias e Açu, pessoas sem autorização estão medindo a área coletiva e ameaçando os/as trabalhadores/as rurais, dizendo que estes não têm terras e que serão expulsos do local.
"Tão medindo as terras, eles vão de dia e de noite fazer o variante", diz Dona Maria de Souza, 70 anos, que nasceu e foi criada na comunidade do Angico dos Dias junto com dez irmãos. Com as ameaças constantes, a rotina na comunidade não é mais a mesma. "Eu não tô conseguindo mais ir trabalhar por causa do medo de ir sozinho pra roça", afirma Seu Salvador Mendes, membro da Associação.
De acordo com relatos dos/as associados/as, as pessoas que estão ameaçando a comunidade dizem estar a mando de José Dias Soares, conhecido como Zé do Salvo e que mora na região, e do empresário português Carlos Manuel Subtil Duarte.
No último domingo (25), o clima de insegurança foi ainda maior no Angico dos Dias. Conforme depoimentos dos/as camponeses/as, dois policiais em uma viatura da Polícia Civil de Campo Alegre estavam acompanhando pessoas que mediam a área do fundo de pasto sem autorização da comunidade. "A Polícia pediu para as pessoas não se aproximarem. Eles estavam fazendo variantes e pediu para a gente não se aproximar porque iríamos ter problemas", comentou um jovem do local.
Para o presidente da Associação de Fundo de Pasto de Angico dos Dias e Açu, Edinei Soares, este momento provocou humilhação e constrangimento na comunidade. "Qual o papel da polícia? É defender os cidadãos e a polícia chegou aqui defendendo os bandidos", disse. "Todo mundo ficou muito sentindo, eu mesmo não dormi à noite", afirmou Dona Maria.
Por defender o território tradicional de fundo de pasto, quatro membros da Associação foram acusados de crime de ameaça e intimados para prestar depoimento na Delegacia do município na manhã de ontem (28).
Os associados compareceram à Delegacia acompanhados de cerca de 100 pessoas do Angico dos Dias e de outras nove comunidades da região. Entidades ligadas às questões do campo, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), o Serviço de Assessoria a Organizações Populares Rurais (Sasop) e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Campo Alegre de Lourdes também marcaram presença nesse momento de apoio à luta dos camponeses/as pela permanência na terra.
"A gente vê os problemas e às vezes pensa que estamos desamparados, mas a partir do momento que fomos intimados e as pessoas das comunidades e das entidades nos deu apoio, a gente se sente engrandecido e fortalecido para continuar a nossa luta", avaliou Soares.
Em 2014, o juiz da Vara Cível da Comarca de Remanso emitiu uma decisão atendendo ao pedido de Wanderle Dias Costa, responsável por uma grilagem de 44 mil hectares que englobava as comunidades de Angico dos Dias, Açu, Baixãozinho, Baixão Novo, Baixão Grande, Arueira, Poço do Baixão, Lagoas e Queimada Grande. Em meio a ameaças e perseguições, as comunidades denunciaram a grilagem, resistiram no território e conseguiram a cassação da liminar, que beneficiava Wanderle, no Tribunal de Justiça da Bahia em setembro de 2015.
A mobilização desta quarta-feira mostra, mais uma vez, que os/as camponeses/as vão continuar na luta pelo seu território, pois como afirma Seu Salvador "ninguém vence sem lutar e ninguém colhe sem plantar".
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