Não sou nenhum Policarpo Quaresma, mas sou um ferrenho defensor da nossa bela e querida Língua Portuguesa, “a última flor do Lácio”, como bem disse Olavo Bilac.
Incomoda-me imensamente ouvir, dentro de ambiente acadêmico, professores proferirem o famigerado “a todos e a todas”. É extremamente desconfortável à minha audição. E o que é pior, professores com título de doutor, representado a própria Instituição de Ensino, em muitas vezes. Pois eles sabem ou deviam saber que “todos” é um pronome substantivo indefinido. E que quando em uma saudação, se diz "a todos", tal cumprimento já se estendeu, conforme a própria acepção do pronome indefinido (todos), a todos os presentes ou ouvintes: homens, mulheres, jovens, crianças, meninos e meninas, etc.
Causa, portanto, estranheza o uso reiterado dessa expressão por professores, de quem se espera uma reflexão sobre o que dizem, afinal, são formadores de opinião. E como disse em outro artigo, não dá para dizer que se trata de uma questão de gênero, ou linguagem inclusiva. Uma vez que a proposta dos defensores da linguagem inclusiva dentro da concepção de gênero é a utilização dos termos masculino e feminino na construção da linguagem como, por exemplo: "sala dos professores e das professoras"; "casa da cidadania", em vez de "casa do cidadão"; "o ser humano", em vez de "o homem"; "os alunos e as alunas", trabalhadoras e trabalhadores, etc. Até aqui, é compreensível. Não há nenhuma subversão à gramática da norma padrão da Língua Portuguesa. Porém, “a todos e a todas” não passa de um pleonasmo vicioso, que devemos evitar, segundo o que aprendemos na escola. E não dá também para justificar isso em nome de um “politicamente correto”, que não passa de um clichê.
Imaginem, senhoras e senhores professores, seus alunos escrevendo ”a todos e a todas” na redação do ENEM. Como seriam avaliados? E o professor que usa a expressão “a todos e a todas”, deve não ignorar do seu aluno um “a gente vamos”. Que poderá até justificar dizendo tratar-se de uma concordância idiológica, de uma silepse (figura de linguagem), ou coisa do tipo. Claro que não o é. Falo isso apenas em tom de ironia.
Quando vou a uma solenidade de formatura, os momentos que antecedem as falas dos oradores (professores) são sempre de suspense e dúvida, em que o coração bate em descompasso. Será que vem um “a todos e a todas”? Ou não? Quando não vem, é um alívio. Nem tudo está perdido! Quando sim, um desalento. E vontade de protestar, mas procuro me conter, afinal, sou um convidado e não ficaria bem.
Em texto publicado em 16/09/2010, na Veja, acerca da expressão "a todos e a todas", o colunista Sérgio Rodrigues, afirma que “trata-se de uma bobagem populista – daí seu sucesso com os políticos, cultores por excelência de bobagens populistas”.
Sendo isso verdade, é mais uma razão para o desalento, uma vez que, em vez de ser o professor o formador de opinião, o influenciador, passou a ser influenciado por pessoas que na maioria das vezes tem uma única preocupação, parecer agradável e falar o que a massa, na maioria das vezes acometida por algum tipo de alienação, quer ouvir.
Devo registrar que, como professor de Língua Portuguesa, reconheço todas as suas variedades linguísticas e o valor de cada uma delas dentro do contexto social onde deve ser adequadamente usada. O falante com competência linguística é, portanto, a meu ver e de muitos especialistas, aquele que sabe usar adequadamente a variedade linguista nas mais diversas situações de interação comunicativa. Todavia, a norma padrão da língua, é inegavelmente a de maior prestígio social, a que abre caminhos para a ascensão dos que adquirem o seu domínio. E no ambiente acadêmico é esta a variedade que deve ser usada.
Destarte, “a todos e a todas”, é mais que uma inadequação gramatical, é um pleonasmo vicioso tal qual “subir pra cima” e “descer pra baixo”, uma deselegância. O professor que em nome de uma “ideologia”, ou não, usa tal expressão presta, paradoxalmente, um desserviço à educação e a sociedade.
É, portanto, por essa e por outras que a educação em nosso País caminhou para trás nos últimos 20 anos. Um retrocesso que é o resultado da adoção de teorias utópicas e inconsequentes na educação que mais serviram e servem a interesses ocultos de alienação social.
Raimundo Francisco Filho é professor e servidor público.
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