Com a redução de águas em praticamente toda a Bacia do São Francisco, agravada pela seca severa nas nascentes em Minas Gerais, o governo já estuda levar águas do rio Tocantins para ajudar a abastecer o megaprojeto de transposição para o semiárido. As obras de transposição do São Francisco, que deveriam ter terminado em 2012, já custam R$ 8,2 bilhões e ainda falta cerca de um terço (64,6% estão prontas). A água correu menos de 10 km em cada canal e não passou das estações de bombeamento. O Ministério da Integração Nacional confirmou ao GLOBO que analisa, no Programa Nacional de Segurança Hídrica, “alternativas para garantir ainda mais segurança hídrica aos moradores do semiárido, entre elas a de integrar a Bacia do Tocantins à Bacia do Rio São Francisco”, mas não deu detalhes.
O principal projeto prevê a retirada da água na altura do município de Palmeirante (TO). A água sairia pelo Maranhão até o reservatório de Sobradinho (BA), onde estão as principais barragens do Velho Chico. É perto dali, no reservatório de Itaparica, que começa a transposição para o semiárido. O trajeto evita a região do Jalapão, cujo projeto já foi considerado ambientalmente inviável, por atingir as nascentes do Tocantins.
Em setembro passado, começou a tramitar na Câmara dos Deputados como parte do “Plano Nacional de Viação” um projeto do deputado Gonzaga Patriota (PSB-PE). Procurado pelo GLOBO, Patriota afirmou que não tem outra alternativa para concretizar a transposição das águas do Rio São Francisco senão usando águas do Tocantins e que foi chamado pelo Ministério da Integração para discutir o tema. O objetivo do projeto era fazer uma hidrovia, mas o texto diz que “no caso de escassez de água no rio São Francisco, teremos condições de reserva de parte das águas do rio Tocantins, para o rio São Francisco”.
— A nascente secou e isso fez cair a ficha de todos, mas a Bacia do São Francisco está castigada. É preciso repensar os usos das águas do Rio São Francisco — afirma o vice-presidente do Comitê, Wagner Soares Costa.
Segundo Costa, 146 municípios da Bacia do São Francisco já decretaram situação de emergência e calamidade pública devido à seca em Minas. O Comitê vai pedir redução da vazão no reservatório de Três Marias, para evitar que ele atinja o volume morto em outubro. Os municípios terão que alterar sistemas de captação de água e o custo deverá ser arcado pela Defesa Civil.
A seca tornou urgente a discussão sobre o rio São Francisco. Com os eventos climáticos, a tendência é que o semiárido fique ainda mais seco. O governo federal já iniciou estudos para mapear e acompanhar áreas de desertificação no Nordeste. O rio já perdeu de 30% a 40% de seu caudal.
Demanda por água ampliada
A Articulação São Francisco Vivo ressalta que “a crise hídrica se deve também e principalmente aos múltiplos, crescentes e conflitantes usos de suas águas, matas, solos e subsolos, decorrentes do modelo econômico predatório; agravou-se de tal forma que os danos e riscos aumentam e assustam”. Na semana que vem, a entidade pedirá moratória para o rio São Francisco aos ministérios públicos dos estados cortados por ele. O objetivo é rever usos antes que seja iniciada outra megaobra.
— Temos que evitar uma obra em cima da outra. Todos os programas do governo só ampliam a demanda de água do rio, mas sem pensar na conservação e na equação de uso — diz Roberto Malvezzi, da Articulação São Francisco Vivo.
COMPLEMENTO
Rio São Francisco em Paranhos antes e hoje
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