Qualquer país relativamente jovem como o nosso, e que pretenda estabelecer as regras e normas básicas para o seu desenvolvimento cultural, tem a obrigação de buscar no mundo os bons exemplos de outras nações com séculos e mais séculos de história, a fim de que nas mais simples atitudes comportamentais sejam sedimentados os bons princípios, desde cedo. O Ministro do STF Luiz Barroso escreveu em artigo: “o Brasil só teve início, verdadeiramente, em 1808, com a vinda da família real. Antes disso, os portos eram fechados, era proibido abrir estradas e não podia haver manufaturas na colônia. Não existiam escolas, nem moeda, 98% da população eram analfabetos e um terço era de escravos”. Nos 308 anos anteriores à chegada da Família Real, quando o país viveu sob a tutela portuguesa, esteve sempre evidente que a preocupação fundamental não era consolidar uma nova nação, nem qual formação cultural teria, mas se beneficiar com a extração das riquezas minerais que a terra descoberta oferecia. Isso não significa minimizar o papel dos nossos colonizadores, mas, na sua maioria, não eram portadores das melhores intenções ou referências, senão servir à Corte de Portugal e buscar o enriquecimento pessoal de cada um.
Assim, aquilo que começa errado fica mais difícil de alcançar a recuperação. É inquestionável que a família representa o mais extraordinário e inquebrantável patrimônio da sociedade, cuja estrutura dá sustentação e sentido à nossa própria existência. Se nos desvios dos costumes e hábitos educacionais uma família enfrenta enormes obstáculos para encontrar os caminhos da reorientação, muito mais difícil é reformular a cultura de toda uma sociedade. Diante dos desequilíbrios sócioculturais ela é vulnerável e sofre as agressivas consequências. E aqui cabe lembrar e questionar: “o pau que nasce torto, realmente morre torto”?
Essa breve lembrança de detalhes que marcaram a evolução histórica do Brasil, remete-nos à reflexão sobre alguns valores que compõem o perfil daqueles que hoje se propõem à gestão do patrimônio institucional do Brasil. É triste reconhecer que a estrutura da nossa administração pública nem sempre é montada tendo como prioridade a funcionalidade e gestão racional em prol do bem-estar da população, mas, ao contrário, visa amparar amigos, familiares, militantes de partidos, financiadores de campanha, etc. Em cada novo governo o gestor eleito monta o seu próprio reinado para 4, ou 8 anos, cheio de muita mordomia, geralmente acompanhado de um séquito de servidores, veículo novo importado, etc. Em algum governo, troca até o Boeing Presidencial...!
Num país de terceiro mundo e com tantas carências básicas, surpreende que todos aqueles que assumem o comando nos escalões mais avançados da vida pública, políticos ou não, sejam tão pródigos em se assoberbarem de tantas vantagens do cargo, enquanto tantos brasileiros passam dificuldades até para a própria subsistência... Até recentemente (2013), Deputados e Senadores recebiam 13º., 14º. e 15º. salários. Mesmo assim, ainda hoje recebem um volume de vantagens que choca a qualquer cidadão: auxílio moradia em Brasília, cota telefônica, cota postal, veículo, combustível, gráfica, jornais e revistas, passagens aéreas para os seus Estados de origem, verba indenizatória para uso nos gastos de combustível, alimentação e moradia nos seus Estados, e pode contratar até 25 Secretários parlamentares para os seus gabinetes... Ufa! Quantas benesses...!
Depois de desfiar todo esse complicado novelo de excessos, de cuja realidade pouca gente tem conhecimento, permita-me o leitor mencionar alguns inusitados exemplos externos, para que se conclua que nós no Brasil estamos vivendo num mundo totalmente irreal: a) Em Londres o Prefeito não tem veículo oficial e vai à Prefeitura de bicicleta; os vereadores recebem Vale Transporte para usar trens, ônibus e metrôs; b) Na Holanda, o Primeiro-Ministro e o líder Parlamentar também vão ao trabalho de bicicleta ou usam trens, ônibus ou metrô; c) Na Suécia, os vereadores e deputados regionais (estaduais) não recebem salários; o prefeito da Capital anda de ônibus e o Primeiro-Ministro circula de metrô ou de bicicleta; um Deputado Federal ganha apenas 50% a mais do que recebe um professor da rede primária de ensino; d) Em Londres, o ex-Primeiro-Ministro David Cameron, com simplicidade, apareceu carregando caixas na sua mudança da residência oficial; e) A filha de 15 anos do Presidente de uma potência mundial está fazendo estágio, lavando pratos num restaurante... feliz e satisfeita da vida!
Com exemplos dignificantes como esses, conclui-se que o Brasil tem solução desde que mude a mentalidade vigente e que os nossos nobres governantes e “reizinhos” desçam do Reino da Fantasia para viverem como a plebe aqui embaixo, que trabalha e produz na base da sociedade brasileira.
AUTOR: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público (Salvador-BA).
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