Em meio a tanta turbulência política e econômica que afeta a vida das pessoas neste país, na fase atual, trazendo preocupações, sofrimento e ansiedade quanto ao incerto futuro reservado a cada um, existem tênues momentos que têm o condão de abrir pequenas janelas de otimismo, restabelecendo a fé, gerando leves esperanças e fazendo acreditar que os maus presságios vão passar. Refiro-me aos raros minutos em que os corpos se perfilam em posturas reverenciadas, o respeito e os sentimentos se unificam, as diferenças políticas são esquecidas e um canto uníssono faz emocionar o corpo numa carga elétrica de impulsos às vezes conhecidos, popularmente, como arrepios! Quero lembrar a importância muito especial que representa para o íntimo de cada cidadão, aquele lapso de tempo empolgante em que se ouve os acordes de um dos mais fortes Símbolos da Pátria, o Hino Nacional Brasileiro!
Embora o Brasil tenha 516 anos de descoberto – em 22 de abril próximo -, poucos são aqueles que sabem que o Hino Nacional foi composto em 1822 por Francisco Manuel da Silva (1795-1865), e tocado pela primeira vez em 13 de abril de 1831, 331 anos depois do descobrimento, justamente no dia da despedida de D. Pedro I, que abdicou ao trono e retornou a Portugal. Assim, o nosso Hino tem apenas 185 anos de tocado, cantado e entoado. Devido a divergências quanto à natureza de muitas letras que se apresentavam para o Hino, finalmente uma definitiva saiu da mente inspirada e poética de Joaquim Osório Duque Estrada (1870-1927). Embora se imagine que o Hino foi fruto de uma composição em parceria conjunta de letra e música – hoje muito comum -, os dois nem mesmo viveram no mesmo tempo histórico...
O Hino Nacional tem o extraordinário poder de identificar a Nação internamente e além fronteiras territoriais, e a sua execução obedece a normas que foram objeto de regulamentação a partir da definição dos Símbolos Nacionais, contida na Lei 5.700, de 01/09/1971, exclusivamente para eventos especiais, tais como: “Deve ser executado em continência à Bandeira Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal e ao Congresso Nacional [...] em cerimônias religiosas de cunho patriótico, sessões cívicas e eventos esportivos internacionais”. Esses limites foram ampliados pelo Congresso Nacional, pelo Projeto de Lei do Senado N.º 2.387-B, de 2011, para a sua execução, também, na abertura de todos os jogos oficiais de campeonatos estaduais.
Nos meus tempos de curso primário em escola pública e, certamente, de muitos leitores deste Blog, cantava-se o Hino Nacional ou o Hino à Bandeira antes do início das aulas, atitude que plantava sentimentos de respeito à pátria e espírito cívico a partir da infância. Perdeu-se no tempo essa prática, embora ela tivesse amparo na Lei 259/1936, baixada durante a ditadura de Getúlio Vargas. Assim como a Lei 5.700/1971 que redefiniu os Símbolos Nacionais, coincidentemente originada no governo militar do Gen. Garrastazú Médice, existem aqueles que procuram invalidar o interesse legítimo de realçar o espírito cívico a partir da educação escolar, por ter origem nos períodos de militarismo. Não posso concordar com esse espírito reacionário e antinacionalista, e cito como exemplo recente o fato do Congresso Nacional ter aprovado a Lei 12.031/2009, sancionada durante o governo Lula, que institui novamente a obrigatoriedade de cantar o Hino Nacional nas escolas: “Nos estabelecimentos públicos e privados de Ensino Fundamental, é obrigatória a execução do Hino Nacional UMA VEZ POR SEMANA”.
Não sou poeta e não me julgo com méritos pretensiosos para interpretar os sentimentos que inspiraram o poeta Joaquim Osório Duque Estrada, no seu poema cheio de paixão e ufanismo pela pátria Brasil. Com todo o respeito que este símbolo nacional nos merece, contudo, há um detalhe intrigante em dois versos que exibem um sentido conflitante, confundindo um pouco a minha reflexão e, quem sabe, a do caro leitor. Enquanto num exalta o grito forte do heroísmo de um povo:
“OUVIRAM DO IPIRANGA ÀS MARGENS PLÁCIDAS
DE UM POVO HERÓICO O BRADO RETUMBANTE”...
No outro, ressalta a malemolência e a falta de vocação para o trabalho:
“DEITADO ETERNAMENTE EM BERÇO ESPLÊNDIDO
AO SOM DO MAR E À LUZ DO CÉU PROFUNDO”...
Estaria o poeta profetizando que o Brasil teria no futuro uma casta de privilegiados aproveitadores do dinheiro público que, refestelados no “berço esplêndido” da impunidade, estaria puxando para trás a Nação que trabalha e que produz...? É reconfortante ver, porém, que em paralelo a esse bando que só pensa em extorquir a Nação e fortalecer o próprio patrimônio, sem qualquer limite de moralidade, existe um povo e uma juventude que se manifesta, democraticamente, em um “brado retumbante” que ecoa em todo o Brasil: “Verás que um filho teu não foge à luta”!
AUTOR: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público.
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