Quando chega o período eleitoral, as cidades do Brasil se enchem de cores, jingles e rostos sorridentes estampados em cartazes, telas, fotos e outdoors.
É uma época de grande movimentação, onde os pseudopolíticos se tornam subitamente presentes, descem de seus gabinetes, renunciam às suas profundas vaidades e se aproximam do povo, como se fossem velhos amigos inseparáveis. Esse teatro das promessas é alimentado pela hipocrisia desmascarada desses políticos, que sustentam a ilusão do engano através das falsidades.
Durante esse período, é comum vermos os candidatos visitando mercados, feiras livres e até mesmo participando de celebrações religiosas. Por exemplo, o candidato X-TUDO em contato com seu eleitor Gueraldo Gujé tem o seguinte diálogo:
- Bom dia, amigão Gujé! Estou muito emocionado em encontrá-lo aqui no Mercado do Produtor. Lembre-se que nós somos quase parentes, viu? Venho aqui todas as segundas-feiras comer pastel de queijo da dona Maria.
- Que coisa mais linda de se ver, Dr. X-TUDO! O senhor é a humildade em pessoa. Como não votar no senhor? O senhor é um verdadeiro ‘patrãozim’. Lá em casa todo mundo vota é no coroné. Na igreja que frequento, todo mundo vota no senhor.
- Oh querido Gujé, é por isso mesmo que já estou indo ao círculo de oração para fazer o que sempre amei, que é orar pelas pessoas carentes. Além disso, tenho uma importante ajuda financeira para a construção de salas para a Escola Bíblica Dominical.
- Amém, meu candidato 100% de sempre, X-TUDO!
Após esse diálogo, não é demais dizer que, em tempos de campanhas eleitorais, os ecossistemas se transformam em grandes teatros, onde promessas são feitas com facilidade e grandiosidade. As palavras mágicas, como "mudança", "progresso", “renovação”, “inclusão”, “sustentabilidade”, “participação”, “saúde”, “infraestrutura”, “educação”, “emprego”, “justiça”, “desenvolvimento” e "compromisso", são repetidas à exaustão. A hipocrisia dos maus políticos se revela na facilidade com que prometem resolver problemas históricos em poucos meses, como se a solução estivesse à espera apenas de sua eleição.
- Posso entrar, Dr. X-TUDO?
- Pode sim, meu ‘profissional de marketing’. Quais são as suas últimas orientações para alienarmos os eleitores desavisados dessa cidadezinha medíocre? Necessito de todos os recursos sofisticados da atualidade para conquistar o mundo.
- Bem doutor, lembre-se que é fundamental prestar atenção nas diversas posturas que o senhor pretende executar. Para conquistar votos, o senhor deve escolher vestuário que transmita profissionalismo e acessibilidade. Optar por ternos em cores clássicas e camisas sociais discretas. Em eventos informais é apropriado camisas de manga longa e jeans escuros. A aparência deve ser sempre limpa e bem cuidada, com atenção a acessórios discretos e sapatos elegantes. Adaptação às tradições regionais e culturais também é fundamental para mostrar respeito e conexão com o eleitorado.
- Pode deixar, meu ajudante, que vou fazer tudo direitinho. Ninguém vai nem estranhar o nosso projeto.
É preciso olhar além das palavras e dos sorrisos forçados. Muitos desses políticos, que agora se apresentam como salvadores, são os mesmos que durante anos ignoraram as necessidades do povo. A hipocrisia se manifesta na disparidade entre o discurso eleitoral e a prática política cotidiana. Não é difícil deparar-se com situações como essa depois das eleições:
- Filho, estou necessitando falar com o Dr. X-TUDO. Vai lá no gabinete dele amanhã às 3h da madrugada pegar uma ficha para eu conversar com o doutor.
- Está bem, mamãe. Irei sim. O que eu não faço pela saúde da senhora?
- Deus te abençoe, filho! E aí, conseguiu permissão para eu falar com o Dr. X?
- Nada, mãezinha. As pessoas que me atenderam disseram que as fichas já têm donos.
- Não chores, filhinho... Esse tormento desumano vai passar.
- Quando, mamãe? Quando morrermos? Gueraldo Gujé chorou amargamente pela situação.
É fácil para um político, durante a campanha, criticar a falta de infraestrutura, a precariedade da saúde pública e a insegurança. Difícil é lembrar que, em muitos casos, esses problemas perduram devido à inércia e à corrupção daqueles que deveriam resolvê-los. Isso tem fortalecido a descrença da população na maioria dos políticos. O povo, em sua sabedoria popular, já conhece essa dança traiçoeira.
A falta de confiança e o ceticismo aumentam a cada nova eleição, mas a esperança, essa eterna companheira do ser humano, ainda faz com que muitos depositem sua confiança nas promessas eleitorais. Infelizmente, essa esperança é frequentemente traída por políticos que, após eleitos, voltam a se distanciar do povo, focando em interesses pessoais e partidários.
- Boa tarde, meu querido X-TUDO, como vai minha autarquia? Posso sugerir um projeto a ser abordado na tribuna? Fazer um concurso público?
- Poder até pode, mas não vai adiantar. Tenho que atender os interesses de quem votou em mim sempre.
Para combater essa hipocrisia, a educação política é fundamental. É preciso que a população entenda seus direitos e deveres, que conheça a história e o passado dos candidatos, e que aprenda a exigir transparência e honestidade. A crítica consciente e a participação ativa na política são armas poderosas contra a manipulação e o engano.
Portanto, o tempo de eleição deveria ser um período de reflexão, onde a população avalia propostas e candidatos com seriedade e critério. No entanto, enquanto a hipocrisia e a falsidade dominarem o cenário político, essa reflexão se torna turva, prejudicada por promessas vazias e discursos bem ensaiados. Cabe a cada cidadão, com sua voz e seu voto, trabalhar para mudar esse panorama, exigindo dos políticos não apenas promessas, mas ações concretas e comprometidas com o bem comum. É por isso que vale a pena refletir no que diz Provérbios 29:2 “Quando os justos governam, o povo se alegra; quando os perversos estão no poder, o povo geme.”
Josiel Bezerra - Professor de Biologia - Mestrando UPE (Universidade de Pernambuco) - Ciência e Tecnologia Ambiental.
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