“Poeta completo": José Marcolino morou em Juazeiro Bahia

28 de Jul / 2024 às 15h00 | Variadas

Se vivo fosse o poeta, compositor José Marcolino teria completado 94 anos de nascimento no último mês de junho, dia 28.

A frase de Fernando Pessoa, "quem, morrendo, deixa escrito um belo verso, deixou mais ricos os céus e a terra, e mais emotivamente misteriosa a razão de haver estrelas e gente", pode ser atribuída a saudade que Zé Marcolino deixou para os amigos e Música Brasileira.

O talento de Zé Marcolino, fez Luiz Gonzaga, Rei do Baião, gravar 18 músicas, todas sucessos atuais do século XXI e com ritmo, harmonia para mais outros tantos séculos. Zé Marcolino continua contemporâneo na música brasileira.

Nascido em Sumé, José Marcolino ajudou a edificar a identidade da cultura brasileira e tem músicas que estão entre as mais regravadas, a exemplo da clássica ‘Numa Sala de Reboco.

Este ano o poeta foi homenageado no Festival de Música da Paraíba. O escritor Joel Cavalcanti destacou que  Zé Marcolino era poeta, carpinteiro, barbeiro e vaqueiro. 

A história conta que para alcançar o sonho e ter seu talento reconhecido além do Cariri, José Marcolino Alves escrevia cartas para Gonzaga, sem nunca ter obtido qualquer resposta. Depois de um primeiro encontro casual marcado pelo desinteresse do Velho Lua, Zé Marcolino conseguiu não apenas ser gravado por seu ídolo, mas foi levado com ele para morar no Rio de Janeiro, produzir um álbum, disco lp juntos e viajar em turnê pelo país. Dessa ligação, surgiu uma obra que até hoje ilustra o imaginário da identidade sertaneja nordestina.

Além da música  ‘Numa sala de reboco’, Zé Marcolino é autor de  ‘Serrote Agudo’, ‘Quero Chá’, ‘Pássaro carão’, ‘Matuto aperreado’, Bota Severiana pra moer e saudade imprudente, estra gravada por Dominguinhos.

“José Marcolino fazia uma música atávica. Com muito da poesia oral daquela região rica em repentistas, glosadores, e sabia criar grandes melodias para suas letras”, define o jornalista José Teles.

O único álbum a registrar essas características do paraibano em sua própria voz foi gravado pela Rozenblit, em 1983, no LP Sala de Reboco, em que Zé Marcolino foi acompanhado pelo Quinteto Violado.

“Luiz Gonzaga dizia que Marcolino tinha uma voz muito grave, que não dava pra cantar. E a gente achava que não. Ele era um cara que tinha aquelas melodias que normalmente tem os cantadores e repentistas, mas embora ele tocasse muito pouco, tinha uma musicalidade vocal muito boa e muito característica do Sertão, do sertanejo. Ele não tinha conhecimento musical. Fazia a coisa intuitivamente, mas com muita certeza e era muito afinado, ele era um cara muito preciso na afinação”, define o cantor Marcelo Melo, responsável pelos vocais, violão e viola do Quinteto Violado. A parceria entre o grupo e Marcolino ficou registrada também na participação de ambos no programa Som Brasil, comandado por Rolando Boldrin, na Rede Globo.

Além de suas características artísticas, Zé Marcolino era conhecido por ser um imbatível contador de causos. “Ele tinha um jeito de contar as histórias e fazer com um humor bem típico sertanejo, aquela coisa que você conta com muita seriedade e a gente, quando vê, está morrendo de rir do jeito que ele fala. Ele guardava as características do comportamento, do imaginário sertanejo, com a qualidade que Gonzaga também tinha”, conta Melo. 

Depois de tantos anos tentando ser parceiro de Gonzaga, esse é o traço na biografia de Zé Marcolino que mais intriga José Teles. “O fato de ele ter tido a chance de se fixar no Rio apadrinhado por Luiz Gonzaga, e decidir voltar pro Sertão da Paraíba, onde morou até a morte. Dizem que houve um desentendimento no Rio entre ele e Gonzaga, mas não sei se é verdade”, especula o crítico. Teles aponta, porém, que esse desejo já estava expressado no xote ‘Matuto Aperreado’, gravado por Gonzaga. “Fico doido com tanta fala de gente / e a zuada de automóvel a me assustar / se na rua vou fazer um cruzamento / tenho medo, eu num posso atravessar / desse jeito, eu sou franco em dizer / mas um dia eu aqui não posso mais ficar”.

"Zé Marcolino morreu em um acidente de carro, em 1987, quando uma vaca cruzou a pista no município de Carnaíba (PE). Uma perda sentida na cultura  nordestina, que teima em não ter o legado de Marcolino apagado", diz Joel Cavalcanti.

“Ele era um camarada que retratava dentro da sua poesia a ambiência, a ecologia, o comportamento brincalhão satírico do homem nordestino com muita qualidade. Marcolino se inspirava também nos elementos da natureza, nos cantos dos pássaros, no comportamento do fura-barreira, do pássaro que fica em cima da estaca, fazendo a tapia para o menino que atira nele com a baliadeira. Ele tinha essas características, o pássaro carão, que dá sinais à natureza através do seu canto. Tenho por Marcolino um respeito muito grande à obra dele por essa qualidade fantástica que ele tinha”, finaliza Marcelo Melo.

Pela sua importância na história da música brasileira, o Poeta Zé Marcolino merecia mais de atenção das entidades culturais do Governo Federal e Estadual. Um disco-tributo, com suas principais composições, um Memorial, um Seminário...são algumas das sugestões de gestos de gratidão e valorização da cultura brasileira.

redação redegn Foto Ney Vital-arquivo

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