Artigo: A obra de arte na era de sua reprodutibilidade artificial

08 de Jul / 2024 às 23h00 | Espaço do Leitor

Walter Benjamin, em sua tese “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”, discorre sobre como o advento dos meios de comunicação e suas tecnologias influenciou o processo criativo nas artes.

Segundo Benjamin, a capacidade de reprodutibilidade técnica exclui a obra de arte da esfera aristocrática e religiosa, retirando a arte de um meio elitizado e transformando-a em um produto da cultura de massas.

A partir do momento em que a arte pode ser reproduzida tecnicamente, ela deixa de possuir caráter singular e fortemente associado ao artista. Esse processo é essencial para a construção de uma sociedade mais justa do ponto de vista social, democratizando a arte e tornando-a acessível para o público geral.

Durante quase 100 anos esse processo foi se modificando, a reprodutibilidade técnica da arte abriu espaço para o nascimento de uma indústria cultural comandada pelo capital. A figura do artista se mesclou a esse processo, mas perdeu seu caráter singular, se tornando apenas uma engrenagem no maquinário responsável por reproduzir a arte como nas linhas de produção das fábricas. Tornou-se claro que apenas a reprodutibilidade técnica não é suficiente para democratizar a produção artística. É necessário que as massas populares estejam no comando dos meios de produção para que realmente haja uma produção popular dessa arte.

Nos últimos anos, uma nova ferramenta vem se demonstrando cada vez mais similar a esse mesmo processo ocorrido a um século atrás, a Inteligência Artificial. Por meio da assimilação de dados, as inteligências artificiais são capazes de produzir textos, sons e imagens de forma sintética, mimetizando os resultados de um processo criativo humano na produção da arte. Essa tecnologia vem evoluindo substancialmente a cada ano e se aperfeiçoando mais na reprodução dessa arte sintetizada. Mas essa tecnologia não se desenvolveu sem suas controvérsias no campo da arte, tanto no âmbito do seu próprio desenvolvimento, quanto nos seus efeitos.

A forma que a inteligência artificial produz suas imagens é baseada na assimilação de imagens pré-existentes, é necessário uma base de dados de diversas artes produzidas por diversos artistas para que o sistema da inteligência artificial possa gerar imagens do zero.

Como a tecnologia é recente, não existem regulações para a produção e o uso, dando margem às empresas responsáveis para usarem o conteúdo desses artistas sem autorização. Por ser uma amálgama de diversas artes diferentes, o produto gerado não é necessariamente algo original, apenas uma reprodução de elementos já existentes, não há espaço para experimentação e com isso não há espaço para a evolução da arte.

A inteligência artificial não é necessariamente uma ferramenta ruim ou antiética, desde que seu desenvolvimento venha aliado à compensação dos artistas que tenham sua arte utilizada na base de dados. A geração de imagens artificiais pode ser útil para casos onde as imagens geradas não necessitam da subjetividade do artista (apesar de que, mesmo nessa situação, um artista ainda é prejudicado ao ser substituído pela IA), mas esses casos apenas evidenciam a maior característica da arte gerada por IA: A mediocridade. Não há um processo criativo por trás, não há paixão ou empenho do artista na produção daquela arte, apenas uma
máquina utilizando sua base de dados para reproduzir padrões.

Nas redes sociais, a geração de imagens artificiais criou uma massa de usuários que utilizam dessa ferramenta para se promover como artistas sem revelar que sua única participação no processo foi escrever a descrição necessária para que a inteligência artificial fizesse o resto do trabalho. A popularidade da ferramenta em usuários com esse perfil só demonstram que o maior triunfo da inteligência artificial foi realizar o sonho do artista frustrado em se sentir satisfeito com sua própria mediocridade.

Ou talvez, seu maior triunfo seja provar empiricamente que o conceito de alma existe, por mostrar quão inexpressiva se torna a arte sem a presença dela.

Luiz Neto | Estudante de Jornalismo pela Universidade do Estado da Bahia Juazeiro - Bahia

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