Tenho uma netinha de um ano e meio. Outro dia, ouvi um diálogo muito interessante entre Maria Antônia, minha neta, e a mãe (minha filha). Com toda a calma típica de mãe, minha filha dizia que “aqui em casa a gente não tem o hábito de gritar, sabia?”.
Quando ouvi o diálogo comecei a pensar sobre a frase. Porque a forma, “aqui em casa a gente não tem o hábito de gritar”, era como se ela estivesse falando com uma pessoa recém-chegada que não conhece ainda as regras do ambiente. Depois pensei, a mãe da Maria Antônia tem razão, ela está chegando agora e aprendendo as boas regras de convivência do lar que a acolheu. Do lar que a acolheu? Mas ela é filha, foi ansiosamente aguardada. Por que essa agora de falar como alguém de fora?
É simples, ela veio de fora mesmo. De dentro da barriga, mas de fora do convívio familiar. E estava gritando em um grupo familiar que não tem o hábito de utilizar este recurso para se impor. Aí me lembrei de meu pai. Ele sempre dizia que quem grita para sobrepor suas ideias é porque perdeu a razão ou não tem mais capacidade argumentativa, é um perdedor (esse perdedor é meu).
Tenho ouvido de colegas mulheres reclamações sobre alguns de seus pares, em reuniões de colegiados principalmente, que gritam com as mulheres quando não conseguem argumentos e justificativas para que suas ideias prevaleçam sobre outras. São rugidos dirigidos a professoras, às vezes até mesmo professoras titulares, que se submetem a sessões de gritos e berros estridentes praticados por homens. Homens! Senhores aparentemente sisudos, chamados de homens sérios.
E o que é mais interessante é que, por vezes, isto ocorre em relação a uma professora de nível hierárquico mais elevado que seu interlocutor, ou dirigido a servidoras com pouca capacidade de se defender. Aliás, nesses casos, de relação com servidoras, o infeliz esbanja seu autoritarismo e vilipendia de maneira esbanjada a dignidade humana. Navega em sua misoginia, exacerba o machismo decrépito e destila seu sexismo abjeto. E isto, considerando que vivemos na tão propalada era da informação ou da comunicação, com toda profusão de meios de interação, em que se propugna massivamente o respeito a outrem, a igualdade entre as pessoas.
Mas será que o grito desses colegas tem a ver com falta de educação ou falta ética nas comunicações? Na minha mais completa e santa ignorância, esses gritos representam nada mais nada menos que uma forma extremada, violenta e incompetente de tentar impor sua vontade de maneira violenta. Um grito; um ato extremado de agressão, incompreensível para mim, mas que precisaria, há muito, ter sido banido da convivência humana. Ainda mais nas universidades, mecas da contradição de ideias e da proliferação de escolas de pensamentos.
Mas, voltando ao grito, quero fazer um apelo às colegas e aos colegas, não admitam que gritem com as mulheres. Não se submetam ao fascismo dissimulado de prepotentes assediadores incontroláveis. Digam não aos ganidos estridentes e roucos de empedernidos e miseráveis trogloditas. Denunciem!
Relevar este tipo de atitude é incentivar sua continuidade. É perpetuar a violência contra as mulheres.
Por Humberto Felipe da Silva, professor da Escola de Engenharia de Lorena da USP
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