Os analistas e técnicos ambientais federais não voltarão a realizar os trabalhos de fiscalização e monitoramento até o governo retomar, de fato, as negociações em relação à proposta de reestruturação das carreiras ambientais. Ontem, as ministras do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Marina Silva, e da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), Esther Dweck, reuniram-se para debater sobre o retorno das negociações, marcado para o dia 1º de fevereiro, às 15h, dando continuidade ao processo iniciado em outubro.
O anúncio da retomada das negociações é uma resposta às paralisações das atividades de campo feitas pelos servidores da área ambiental. O movimento teve início na última quinta-feira (04). Apesar do aceno, os servidores decidiram manter a paralisação.
A decisão foi anunciada após a realização da Assembleia Geral Permanente, feita pela Asibama (Associação dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do PECMA), no Distrito Federal.
Em nota divulgada pela Ascema Nacional (Associação Nacional dos Servidores de Carreira de Especialista em Meio Ambiente), a entidade expressa seu apoio à suspensão das atividades de campo. “Considerando que mesmo com a marcação de uma data para a próxima reunião, não há garantias de que as nossas reivindicações serão atendidas, informamos que os servidores não irão recuar em seu posicionamento até a conclusão do processo de negociação”, explica em trecho da nota.
Desde 2017, durante o governo Temer, servidores ambientais federais buscam a reestruturação e valorização da carreira dos especialistas em Meio Ambiente do Ibama e ICMBio. Desta vez, uma paralisação das atividades de campo nas fiscalizações foi anunciada através de uma carta feita pelos próprios servidores, em busca de respostas por parte do governo federal e do Ministério da Gestão e Inovação.
De acordo com a carta, a partir do dia 4 de janeiro, todos os servidores dos dois órgãos iriam suspender as ações de fiscalização que dependam exclusivamente de ações externas de campo, concentrando-se apenas em atividades burocráticas internas. Mais de 2.000 servidores aderiram à paralisação, sendo 1.400 servidores do Ibama e 600 do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Uma das principais reivindicações do setor busca respostas das negociações com o Ministério de Gestão e Inovação, que estão estagnadas há cerca de três meses. Em nota encaminhada à imprensa, a Ascema Nacional alega que nenhuma resposta sobre a proposta de reestruturação, dentre outras reivindicações, foi respondida pelo MGI.
Em conversa com o ((o))eco, a vice-presidente da Ascema Nacional do Distrito Federal, Beatriz da Silva, afirma que as reivindicações apresentadas são reflexos de uma luta que já dura uma década, e que, no governo atual, os servidores viram uma oportunidade para serem ouvidos, algo que seria impossível no anterior, que trabalhou para desmontar as estruturas da área ambiental federal e a política nacional de meio ambiente. As expectativas, entretanto, ainda não foram correspondidas.
“Com a abertura das mesas específicas de negociação, vimos uma oportunidade de sermos ouvidos e finalmente atendidos em nossas reivindicações. Porém, ao percebermos um descaso com nossa mesa em detrimento ao atendimento de reivindicações de outras carreiras [como a reestruturação das PF e PRF], nos sentimos deixados para trás nas negociações”, explica.
Entre os pedidos de mudança da reestruturação da categoria, estão a alocação de recursos financeiros no orçamento da União que sejam suficientes para a reestruturação de carreiras, redução da diferença salarial entre os técnicos e analistas da área; gratificação por atividades de risco, melhoria das condições de trabalho em campo, além da realização de concursos público em caráter de urgência e periodicamente, contando com dimensionamento participativo da força de trabalho necessária destinados a cada órgão.
O presidente da Ascema Nacional do Distrito Federal e Asibama, André Oliveira, explicou que há 7 anos uma proposta de reestruturação de carreira havia sido apresentada ao Ministério de Meio Ambiente. Na época, algumas das reivindicações foram consideradas e transformadas no Aviso Ministerial nº 52, então encaminhado ao Ministério do Planejamento. Todavia, o trâmite não foi adiante.
Apenas no ano passado, durante o 12º Congresso da Ascema Nacional, a proposta foi retomada, atualizada e encaminhada novamente para o MMA, para que fosse oficializada.
“Inicialmente, mandamos ofícios pro MMA, eles demoraram um pouco para responder, mas nos recepcionaram e fizemos uma apresentação do que a gente queria e o MMA disse que não existia mais o documento de aviso ministerial. Foi quando fizeram um ofício e encaminharam as premissas e principais reivindicações da gente pro MGI (Ministério de Gestão e Inovação), porque é nele que se realizam as mesas de negociação específica temporária das carreiras”, disse André.
Segundo André, o MMA entregou o ofício para o MGI e foram feitas assembleias e abaixo-assinados para que a mesa fosse instalada. No dia 9 de outubro de 2023 ocorreu a primeira reunião de apresentação da proposta das reivindicações. Ao todo, era esperado que três reuniões fossem realizadas em um período de pouco mais de um mês, o que não ocorreu.
“Para se ter uma ideia, tivemos nossa primeira reunião de negociação com o MGI no dia 09/10. Desde então não tivemos nenhuma devolutiva, cronograma ou expectativa de resposta às nossas demandas. Sequer uma data para uma segunda reunião de negociações”, informa a vice-presidente da Asibama, Beatriz da Silva.
SERVIDORES ALEGAM CONTRADIÇÕES-André Oliveira explica para ((o))eco que a categoria observou contradições do governo federal, o que intensificou um sentimento de frustração entre os agentes ambientais.
“O governo usa como portfólio as ações e resultados da atuação dos servidores na carreira de especialistas em meio ambiente, sobretudo as ações contra o desmatamento e garimpo ilegal, e isso tem trazido benefícios do olhar internacional pra gente, mas em contrapartida não temos a devida valorização, apesar da gente ter entregue os resultados”, afirma André.
Segundo os representantes da associação, o Ministério de Gestão e Inovação enfatizava que, para que a reestruturação acontecesse, seria necessário observar o impacto orçamentário e colocado como condicionante para que não houvesse a segunda reunião. Entretanto, a categoria questiona que outros repasses e acordos foram disponibilizados pelo governo federal a outras categorias com impacto orçamentário superior ao solicitado pelos especialistas em meio ambiente.
“Parece meio óbvio que a gente precisa ser valorizado, mas a gente sabe o valor do trabalho que é de fiscalização, de preservação, de conservação de biomas e recursos ambientais, de territórios, porque vivemos uma realidade de crise climática. Nós sabemos que estamos num dos centro de atenção e de importância para manutenção da vida, sabemos o quanto é ruim ter que tomar este tipo de atitude porque a gente gosta de fazer, acreditamos na missão social, com a perspectiva socioambiental de que nosso trabalho tem esse viés de preservação e de manutenção da vida e do planeta. Não é fácil, mas a gente espera que esse tipo de ação seja um indicador para que o governo responda o quanto antes”, informou André Oliveira.
De acordo com o presidente da Asibama e Ascema Nacional, existe uma preocupação das entidades representativas em relação às ações de fiscalização. O impacto da paralisação pode afetar as operações de fiscalização ambiental na Amazônia, vistorias de processos de licenciamento ambiental, processos autorizativos, dentre outros. André ressalta que a paralisação não é ideal, mas que, segundo ele, parece ser uma das poucas atitudes que faz com que o governo os escute.
Para o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, ainda é cedo para realizar uma avaliação do impacto que a paralisação poderá causar, mas enfatizou para a reportagem de ((o))eco que o governo está trabalhando “para que as coisas se resolvam rapidamente”.
Em nota, o ICMBio informou que as questões relacionadas à carreira dos Especialistas em Meio Ambiente (Lei 10.410, de 11 de janeiro de 2002), que abrange os servidores do Ministério do Meio Ambiente, IBAMA, ICMBio e Serviço Florestal, estão sendo tratadas pelo Ministério do Meio Ambiente, junto com o MGI.
No encontro realizado nesta segunda-feira (08) entre as ministras do Meio Ambiente e da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), a principal mensagem era que a reestruturação seria uma prioridade.
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