Festa Junina que é festa junina tem que ter quadrilha, comidas típicas, roupa xadrez e… simpatia. E aqui não estamos falando apenas sobre o ato de ser simpático, o que, diga-se de passagem, costuma ser comum nesta época do ano que irradia alegria e diversão.
Mas, estamos falando, também, sobre outra forma de simpatia, aquela pautada na cultura popular e regional, em que fazemos pequenas ações em busca de um objetivo. Objetivo esse que pode ser afetivo, o mais comum entre os desejos juninos, ou de saúde, prosperidade e proteção, por exemplo.
Lógico que nem todas as pessoas fazem simpatias. Muitas, céticas, nem sequer depositam o mínimo de confiança nesta tradição popular. Mas o fato é que essas pequenas simbologias são partes inseparáveis dos festejos juninos.
Como explica a cientista social Thayane Fernandes, mestre e doutoranda em antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o hábito de se realizar tais ações demonstram o desejo social de pertencer a uma cultura comum e partilhada.
“A crença em algo que é compartilhado gera uma sensação de conforto e bem-estar consigo. Isso gera retorno positivo, gera otimismo, as pessoas têm mais esperança. Pode não parecer, mas é importante a gente se sentir confortável no meio que a gente vive e acreditando no que a gente acredita”, disse.
As simpatias, assim como as adivinhações, que no período junino giram muito em torno da tentativa de se descobrir o nome ou alguma característica do futuro amor, fazem parte de um conjunto de superstições que vêm permanecendo vivas ao longo dos anos.
"A superstição faz parte de uma crença em algo sagrado, místico, mágico. A gente não pode dizer que é um pensamento apenas religioso, mas é uma crença em algo que você não pode explicar de forma racional. A superstição é o grande guarda-chuva e depois vem um pouco da simpatia, que é justamente fazer algo para que aquela superstição ocorra ou não. Então, a simpatia é a ação, implica uma ação, e a superstição é uma crença que guia as pessoas a fazer simpatias. Já as adivinhações têm muito mais a ver com a lógica do São João, com a cultura junina. As superstições e as simpatias existem independente do período e as adivinhações estão mais ligadas ao período junino, é um tipo de expressão cultural típica do Nordeste, mas existem em várias outras culturas, e aqui se manifestam em forma de brincadeira, como uma face divertida do povo que pratica, que acredita”, analisou.
As origens registradas no Brasil para as simpatias remontam ao período colonial mas, como destaca o historiador Ian Chaves, é difícil precisar um marco exato.
“Práticas populares, crendices, adivinhações, muita coisa do que se refere à cultura popular, é muito difícil de você precisar a origem. Existem relatos dispersos, mas é muito difícil dizer onde começou, como começou. Vamos tomar de exemplo o caso de Santo Antônio, que é tido como Santo Casamenteiro, mas isso não é um padrão internacional, é algo muito próprio do Brasil. A gente chama isso de heterodoxia, ou seja, há um papel claro religioso, toda uma trajetória do santo que é reconhecido pela igreja, mas os fiéis, as pessoas comuns, até pessoas que nem são religiosas, acabam integrando nele essas lendas, essas tradições, essas culturas, essas superstições, que é assim que os costumes muitas vezes se difundem, de maneira quase natural e espontânea”, pontuou.
Há 40 anos trabalhando com artigos relacionados a simpatias no Mercado de São José, a comerciante Maria da Conceição Tavares, 65, destaca que os principais pedidos da clientela envolvem a busca por um amor. Conhecida como Ceça das Ervas, ela tem na ponta da língua dicas de simpatias para os santos juninos.
A mais famosa delas consiste em colocar a imagem de Santo Antônio de cabeça para baixo, afirmando que só o devolverá para a posição normal após encontrar um amor, mas existem outras simpatias para ele e outros santos do período.
“Você pega um pires novo branco, coloca mel dentro dele, pega uma tirinha de papel e escreve o seu nome. Em outra tirinha, escreve o nome da pessoa que você quer. Aí fecha as duas tirinhas e coloca no pires com mel. Pega um Santo Antônio, amarra com um laço de fita vermelha, coloca em cima daquele mel com aqueles nomes e faz o seu pedido. Depois você pega uma vela vermelha, acende e reforça o seu pedido. Aí a noite, você toma um banho de cabeça e coloca o mel que estava no pires. Isso é para ser feito na véspera de Santo Antônio”, orientou.
Para quem deseja saúde, prosperidade, ou algum outro pedido específico, a sugestão é a seguinte: “Na véspera de São João, a gente coloca a imagem de São João Menino também dentro do mel, faz o pedido, que pode ser qualquer pedido, debulha o milho [separar os grãos] e bota em volta do mel. Depois você toma banho com essa mistura e à noite você acende, com cuidado, a fogueira”, comentou a comerciante. [Veja mais dicas de simpatias da tradição popular no infográfico ao fim da matéria]
Também comerciante no Mercado de São José, Maria Izabel Moraes, 55, conhecida como Galega das Flores, conta que a procura por imagens de Santo Antônio e artigos para simpatias aumenta nesta época.
“As pessoas compram coisas para fazer simpatia, compram flores, compram muito Santo Antônio para botar de cabeça para baixo para arrumar um namorado. Compram faca para fazer adivinhação na bananeira, que tem que ser uma faca nova. Está tudo mudando muito, mas ainda existem pessoas que acreditam e que fazem. E é uma coisa tão incrível fazer simpatia que entra na alma”, frisou.
A professora de dança Kelly Santos, 42, revela que já fez muitas simpatias. Uma delas, garante, é certeira.
“Tem uma bem fácil, que a gente pode usar canela, porque ela é atrativa. É usada para atrair dinheiro, atrair amor também. Você pode passar um pouquinho atrás da orelha quando for encontrar alguém, ou quando for para um lugar onde você sabe que a pessoa que você gosta vai estar, e com certeza você vai atrair quem você ama”, contou.
Dona Maria José Rodrigues, 65, empregada doméstica, também tem sua dica infalível: "A simpatia é comprar uma imagem de Santo Antônio, botar em cima de uma mesa, fazer os pedidos de casamento, acender uma vela, rezar para ele e pedir a Deus o casamento.”
Já o professor Rodrigo Laranjeira, 35, recorda-se de uma das simpatias mais famosas desta época: “Na véspera de São João, você pega uma faca, que tem que ser nova, e enfia na bananeira. No dia seguinte, a letra que se formar com a seiva é a inicial do nome da pessoa com quem você vai se casar”, lembrou.
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