Artigo - É vivendo e achando muito bom

10 de May / 2023 às 23h00 | Espaço do Leitor

A busca por uma explicação convincente para o sentido da vida é complexa, profunda e exige conhecimento pleno do ser. Compreender intimamente o propósito da existência humana demanda sabedoria e discernimento.

Entretanto, com os altos índices de enfermidades, falsidades, maldades, traições, invejas, medos, frustrações, tristezas, dores, neuroses, transtornos e separações tornam questões inerentes a efêmera rotina da vida o grande desafio do século. 

Há muitas indagações fáceis de fazer à humanidade, porém, respondê-las são mais quinhentos. A exemplo das perguntas (De onde viemos? O que somos? Para onde vamos?) destacadas no monumental quadro do pintor francês Paul Gauguin, de 1897, no Museu de Belas Artes de Boston. Esses questionamentos potencializam possíveis respostas ao significado da vida. Quando não respondidos, adequadamente, o desequilíbrio do ser é inevitável comprometendo assim as relações ecológicas harmônicas da sociedade.

Essa incompreensão, das próprias ideias, causa desespero ao ser vivente tornando o seu dia a dia quase que insuportável. O indivíduo, com a ânsia de sair mais rápido de sentimentos inferiores, faz inúmeras indagações sobre a vida. Não raro, percebe-se que, a maioria das pessoas não sabe responder questões ligadas intimamente ao propósito da vida, porque requisita o conhecimento pleno de si mesmo.

É possível ser feliz ou mesmo ser alegre nesse mundo desigual? Qual a minha culpa do mundo ser tão cruel? Será que é mesmo verdade que tudo que plantamos vamos colher? O amor existe ou é simplesmente uma palavra utópica? Quem ama cuida? Por que estou abandonado? Onde está o carinho das pessoas? O que fiz para merecer tamanho castigo? Sou um camarada sem sorte? Por que nada dar certo para mim? Que vida é essa, meu pai?

- Olá, boa tarde, quem é você?

- Sou o Geraldo. Não sabe mais quem sou eu, Atanajudetina?

- Filosoficamente, não. Perguntei quem é você na semântica do ser.

- Vixe, meu Deus do céu, agora deu um nó na minha cabeça! Por gentileza, Atanajudetina, explique-me melhor.

- Sim. Na verdade, senhor Geraldo José, essa pergunta é muito simples de explicar basta sentarmos aqui, na orla de Juazeiro-Ba, e tomarmos um café forte. Veja bem, querido amigo, o conhece-te a ti mesmo é muito fácil de escrever, porém a sua prática exige profunda vontade do ser em prosseguir em compreender, integralmente, os seus defeitos, mas, também reconhecer as suas virtudes para que a vida passageira queira continuar viva. A pesar da brevidade da vida humana não são todos que querem viver o seu tempo de vida, porque não encontram motivos para tal existência.

Prudentemente, ao falar sobre o ‘sentido da vida ou mesmo o propósito da vida’, é relevante mencionar Viktor Emil Frankl (que sobreviveu ao terrível Holocausto da Segunda Guerra Mundial) autor do best-seller “Man’s Search For Meaning – A busca humana pelo significado”, neuropsiquiatra austríaco, criador da “Logoterapia” (Psicoterapia do sentido da vida como a principal força motivadora de um indivíduo).  Para Viktor Frankl, a Logoterapia é a liberdade de vontade, a vontade de sentido e o sentido da vida que se expressa de acordo com o significado que o indivíduo tem do mundo interior e, também, exterior dando jus ao termo “seres humanos”.

As pessoas que têm um propósito de vida definido, certamente, estão em paz. Afinal de contas qual é realmente o significado da sua vida? O que te motiva a continuar vivendo? Você está vivendo a vida ou a vida está vivendo você? Você está passando pela vida ou a vida está passando por você? Está difícil aceitar a vida como ela é? O que quero para a minha vida? Como me vejo daqui a seis anos? Quais são as minhas competências e habilidades hoje e quais ainda almejo adquirir? O que te traz alegria, felicidade, motivação a seguir em frente independente de qualquer coisa?

Para responder a essas perguntas a Logoterapia utiliza-se de elementos que favoreçam ao conhecimento pleno do ser com aplicação de técnicas de derreflexão (que tem principal objetivo interromper ciclos de ideias nocivas), a intenção paradoxal (valoriza aspectos humorísticos para reflexão sobre as neuroses) e o diálogo socrático (que compreende um diálogo modificador de atitudes doentes do ser humano).

Essas técnicas nos fazem reflexionar a respeito da nossa real atuação no mundo, sabendo-se que o sentido da vida é peculiar a cada um e que não deve ser egocêntrico. É necessário dedicação ao bem-estar de todos. Ir além de si mesmo. Ser capaz de investir em algo maior do que nós mesmos e, serenamente, saber o motivo da vida.

A importância de ter um sentido à vida é entender, plenamente, sobre si mesmo, com motivação aos sentimentos nobres que nutram as boas emoções do coração e fortaleçam as decisões da mente promovendo ações mais lúcidas da vida. Nesse teor nutricional, deve-se levar em conta que, além da necessidade de nutrição do corpo, os seres humanos carecem de alimentos nutritivos para saúde das suas emoções, seus sentimentos e pensamentos. Entretanto, isso não é uma tarefa fácil de ser executada porque há um grande número de pessoas que ainda não sabem qual a razão da vida.

Ao escrever o parágrafo anterior, lembrei-me de uma pesquisa americana realizada pela Revista Veja (1999), onde foi feito o seguinte questionamento: “Se você estivesse na presença de Deus e pudesse lhe fazer apenas uma pergunta, o que indagaria?” Esse estudo revelou que 46%, dos entrevistados, perguntariam: Deus, qual o sentido da vida? Ainda hoje reverbera, àqueles que tem ouvidos para ouvir, a sonoridade dessa pergunta. Resposta que é bom, quase nada!  

Em algum momento da vida somos postos a fazer escolhas difíceis e nem sempre estamos preparados para tal missão, principalmente, quando não temos noção plena do que almejamos da vida. Gustav Jung disse que “o homem e a mulher não podem sobreviver se as suas vidas não têm um sentido” de ser. É necessário reconhecer as finalidades das coisas e saber que tudo tem um propósito. Já parou para pensar qual a finalidade de um pé de Juazeiro produzir frutos esféricos, pequenos, de cor amarelada, doces, com uma semente em seu interior?

Botanicamente falando, há espécies de flores que nascem fechadas para depois os seus botões se abrirem, juntamente, com lindas sépalas e pétalas. É a linda natureza a nos ensinar. O ser humano, por sua vez, pode reagir semelhantemente a uma rosa quando abre o coração às coisas edificantes da vida, aos bons pensamentos, vida saudável, sensibilidade em reconhecer as fragilidades e potencialidades de si e do outro.

Aproveitando a comparação do ser humano e o reino vegetal vale mencionar mais uma espécie. Você sabe como nasce um repolho meu camarada? O repolho, do gênero botânico Brassica, nasce com folhas totalmente abertas, porém com o tempo elas vão se fechando lentamente formando assim, literalmente, uma grande bola. O ser do tipo ‘repolho’ tem as suas peculiaridades. A pessoa sempre foi aberta ao diálogo em sua comunidade, alegre, sorridente, saltitante. Mas, por algum motivo, ela se fecha à vida a ponto de confundir-se com as suas emoções e sentimentos.

Assim como o repolho, o ser vai se fechando, tornando-se soberbo, ingrato, intolerante, insensível, imprudente, desbussolado, inacessível enclausurando-se dentro de si mesmo com os seus piores sentimentos que são a raiva, a culpa, o medo e a fome insaciável de estar sempre no controle da vida alheia perdendo a motivação de viver. Sentimentalmente, com qual você se identifica, com a flor ou com o repolho?

Na busca do verdadeiro sentido da vida, às vezes, nos frustramos quando não compreendemos direito o vocabulário da nossa existência. Talvez isso venha a ocorrer por questões inerentes a insegurança da humanidade perante o futuro. Frankl sugeriu, como fontes do sentido da vida, o trabalho significativo, o amor que cuida do outro e a coragem em tempos de grandes desafios. Portanto, para o pesquisador, mesmo que seja pequeno o motivo que uma pessoa tenha para continuar a viver, uma simples perspectiva do futuro garantirá a vontade de lutar pela vida. 

Friedrich Nietzsche, em sua obra - Crepúsculo dos Ídolos - nos diz que "aquele que tem uma razão para viver pode suportar quase tudo" no cenário da existência. Nesse aspecto é possível que o indivíduo experimente graus maiores de resiliência perante pontos extremos de sofrimento. Por mais desesperador que seja o desafio a ser enfrentado, a motivação em permanecer vivo, sempre será a mais nobre. Essa força motriz ajuda a vencer as tentações de manipulação das emoções próprias e de outrem.

A chantagem emocional, por sua vez, busca reprimir o livre arbítrio das liberdades individuais tendo como objetivo o controle do outro. O manipulador de emoções, geralmente, apresenta falsos diálogos, inconformismo com quase tudo, autopunição mentirosa, distorção da realidade dos fatos, dissimulador, agressivo e destruidor da autoestima da vítima. Manipulações é o que não faltam.

A autoestima (compreende o reconhecimento que uma pessoa tem de si própria, permitindo-lhe ter confiança nos atos e pensamentos). A recuperação da autoestima é fundamental à promoção da autoaceitação com respeito, autoconfiança, competência social e amor-próprio. A ausência da autoestima deixa a vida insossa sem nenhuma perspectiva do amanhã fortalecendo as doenças da mente e do corpo. Trazendo assim, sofrimento, lamentação, angústia, medo, desassossego, insegurança e transtornos diversos.

Nesse cenário deprimente é salutar mencionar que, a maioria das pessoas, vive tão concentrada em suas tarefas diárias que não enxerga o sofrimento alheio. Numa sociedade sadia não é difícil verificar a execução de sentimentos elevados através de um sorriso amigo, um olhar acolhedor, um esforçar na empatia, educação na mente e abraços mais sinceros.

- Hello, my friend, Washington, how are you? Can I hug you?

- Oxente, my God! Compadre o senhor bebeu meropeia foi? Tá me xingando camaradinha? Sou mais o meu ‘Caatinguês (idioma do Caatingueiro)’ que diz tudo de uma vez. O senhor pode falar na minha língua, por obséquio, seu Perivaldo CD’s?

- Sim, caro, compadre Washington! Vou traduzir para você. Você está legal? Posso te dar um abraço terapêutico?

- Estou bem, obrigado! Sr. Perivaldo gosto muito do senhor, mas essa história de abraço terapêutico é coisa estranha para mim. Meus pais não me ensinaram tal prática. Nunca abracei ninguém. Por gentileza, me conta mais sobre isso que já estou extremamente ansioso para saber.

- Veja bem, compadre Washington, a terapia do abraço cuida de tratar diversas emoções nos seres humanos. É através dela que os indivíduos podem vencer a raiva, a culpa, o medo, frustação, tristeza e a insaciável fome por controlar tudo e todos a sua volta. O abraço medicinal tem salvado vidas potencializando, sustentavelmente, o complexo sistema sensitivo das pessoas. É por meio do abraço verdadeiro que as pessoas são capazes de transmitir sentimentos éticos e lógicos permeados pelo amor que dão sentido à vida.

- Eita pêga, compadre! Sendo sincero com o senhor eu entendi somente um bocadinho. Mas vejo que é um assunto muito profundo meu compadre Perivaldo. Se não se importar pode reforçar a explicação medonha?

- Sim, com toda atenção, querido amigo! Para simplificar, aproveitando que estamos aqui à beira do nosso Rio São Francisco, vou recitar um lindo poema do ilustre João Guimarães Rosa que diz: 

“O correr da vida

embrulha tudo,

a vida é assim: esquenta e esfria,

aperta e daí afrouxa,

sossega e depois desinquieta.

 

O que ela quer da gente é coragem.

O que Deus quer é ver a gente

aprendendo a ser capaz

de ficar alegre a mais,

no meio da alegria,

e inda mais alegre

ainda no meio da tristeza!

 

A vida inventa!

A gente principia as coisas,

no não saber por que,

e desde aí perde o poder de continuação

porque a vida é mutirão de todos,

por todos remexida e temperada.

 

O mais importante e bonito, do mundo, é isto:

que as pessoas não estão sempre iguais,

ainda não foram terminadas,

mas que elas vão sempre mudando.

 

Afinam ou desafinam.

Verdade maior.

Viver é muito perigoso; e não é não.

Nem sei explicar estas coisas.

Um sentir é o do sentente, mas outro é do sentidor”.

Fernando Pessoa, harmoniosamente, com sua perspicácia poética externou que "às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido. Tudo vale a pena quando a alma não é pequena". É por essa causa que, nas muitas batalhas, os sobreviventes de guerras são fortalecidos. O simples fato de ser motivado a acreditar que tudo vai acabar bem aumenta a chance de superação. O otimismo consciente é uma ferramenta poderosa que trabalha em favor da espécie humana fazendo-lhe compreender a importância da existência.

Esse saber é necessário para o reconhecimento da função do ser nesse mundo. Oscar Wilde relembrou que "viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe" não conseguindo moderar o verdadeiro valor das pessoas e das coisas materiais. Pensando nisso, Platão fez questão de alertar aos seus discípulos que "não espere por uma crise para descobrir o que é importante em sua vida". Não espere perder para depois querer valorizar. Não espere dar o devido valor aos seus pais, seus empregos, seus amigos, seus colegas, sua família, conhecidos e, também, desconhecidos depois que se forem.

Cada pessoa tem um jeito próprio de ser e de transmitir sentimentos de amor. Machado de Assis, em Ressurreição (1872) expressa que "cada qual sabe amar a seu modo; o modo, pouco importa; o essencial é que saiba amar". Amar também se aprende e é por isso que Martin Luther King, fortalecendo essa ideia, registrou que "se um homem não descobriu nada pelo qual morreria, não está pronto para viver". É preciso ser guerreiro, ter coragem e sabedoria para vencer os conflitos da vida. Carlos Drummond de Andrade, em 'O avesso das coisas (1990)', socializa que "só é lutador quem sabe lutar consigo mesmo".

Portanto, meus amigos e minhas amigas, você não é, e nem deve se identificar permanentemente com as suas emoções, os seus sentimentos e as suas confusões mentais. Concordo que perante o emaranhado de pensamentos tóxicos as potencialidades da humanidade são esquecidas levando o ser humano ao fundo do poço da existência. Por outro lado, felizmente, quando os nossos olhos estiverem abertos para o belo, para o simples e para o verdadeiro significado da vida tudo terá lógica.

Tudo isso, sem esquecer-se que o real sentido da vida é o amor!

Josiel Bezerra - Professor de Biologia - Mestrando UPE (Universidade de Pernambuco) - Ciência e Tecnologia Ambiental.

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