Apontemos aqui o ser que se acha mais forte no mundo inteiro e destaquemos o tema que mais o fere e o atemoriza no mundo moderno.
O ser, o machista; o tema, machismo. Não importa, mulheres, quanto boas sejamos, o quanto trabalhamos, o quanto de melhor façamos e o quanto honesta sejamos, ainda seremos mulheres. E isso é grave. Basta para não sermos dignas diante o machista.
Na compreensão do domínio masculino, ou permanecemos submissas ou seremos uma ameaça. Não existe meio termo para o machismo. Em sua linguagem, o nosso conforto e felicidade, e não o deles, dependem de acreditarmos que devemos ser felizes em casa, agindo sob seu comando e direção. Acreditam que somos ineptas para a política, para a liderança, para o trabalho fora do ambiente privado, da casa, que se torna cárcere e que deveria ser o lar, lugar de acolhida.
A mulher, não importa quão boa seja na empresa, na gestão. Se hoje ela parecer infeliz por um momento, é culpa da liberdade que ela mesma lutou para ter. Jamais, para o machista sua felicidade será por causa da tripla jornada, por ela assumir contas, filhos, pais idosos, marido e casa. Para os homens, ela anda depressiva, ansiosa, doente porque se depravou com a luta pelos seus próprios direitos. Que se tivesse em casa, lavando ceroulas, confinada, limpando os grudes e suportando traições, obedecendo ordens, abusos e autoritarismo, ela seria feliz, boa mãe, boa esposa, como "era" antigamente, quando os casamentos não se desfaziam.
Para o machista, os casamentos não se desfaziam por ser a mulher considerada inferior, por não ter autonomia financeira, por ser a justiça e a lei feitas por homens que jamais lhe dariam causa. Os divórcios não ocorriam, no alcance da inteligência machista, porque a mulher era bem educada e casta, enquanto a mulher de hoje, esta que tem liberdade sexual, que busca curso superior, que é dona de seu corpo e de sua vida, tornou-se promíscua e não valoriza a família. A mulher de outrora que engravidava todo ano, que não tinha acesso a meios anticoncepcionais, saúde pública e benefícios sociais, era ensinada que o casamento era sua única maneira de ser feliz e que devia suportar tudo porque isto lhes garantia estabilidade e felicidade. Com o perdão da palavra aos meus prezados leitores, ah, vão se lascar todos vocês!
O machismo não está apenas entre os conservadores assumidos. O machismo está incrustrado, agarrado como sanguessuga em nossa pele. Ele está em todo lugar. Os que se dizem desconstruídos, progressistas, odeiam receber instruções de uma mulher em um cargo mais alto, não suportam ver sua ascensão, não confiam, boicotam, não colaboram, se enciúmam. Se eles erram é porque são humanos, sua posição não é questionada; se elas erram é porque são mulheres, porque são péssimas, distraídas, despreparadas, instáveis, emotivas e não merecem outra chance.
Em tudo que fazemos temos que dar o dobro do esforço. Vivemos num estresse absurdo para acertar da primeira vez. Não podemos errar. Gente, como é exaustivo!
Dividir uma conta se tornou motivo de briga. A nossa luta por direitos iguais é distorcida na fala e ação de um machista. "Se você quer direitos iguais, pague a conta sozinha; se quer direitos iguais, faça você mesma", se quer direitos iguais, carregue o peso sozinha, trabalhe e seja provedora da casa”, como todos os homens supostamente fazem.
Somos confundidas e acabamos por assumir as tarefas de provedoras mais aquelas tarefas que, por regra, já exercemos.
As pessoas não entendem que a consolidação de direitos não é inversão de papéis entre homens e mulheres, mas reconstrução e diálogo sobre os lugares que ocupamos, sobre a exploração de nossas mentes e corpos. O machista sempre acredita que a nossa busca por direito à vida, respeito ao nosso trabalho, a nossa cidadania é uma luta para tomar o lugar de domínio masculino, e NÃO É.
Um dia desses fui questionada por um rapaz por usar o termo domínio masculino, pois no entender dele o uso do termo era um baita exagero, pois em sua concepção pessoal, ele não se ver como alguém que quer dominar. Mas o termo explicita uma sociedade onde os homens são majoritários nos lugares de poder, nas tomadas de decisão e onde a mulher ainda é menosprezada e vista como cidadã de segunda classe. Não se trata de um termo apontando para uma visão particular. Então, domínio masculino sim. Lugar de domínio sim. O masculino domina. Domina o mercado, domina os corpos, domina a política, domina as mulheres, domina os espaços, impondo sua estrutura e força física como marca de superioridade sobre tudo, impondo sua guerra, e ao mesmo tempo, temem nossa astúcia, nosso perfeccionismo, agilidade e inteligência e este temor os impulsiona a nos reprimir.
Em outras ocasiões, nos subestimam, imaginam-se mais importantes tomando para si o papel de protetores, tutores e administradores de nossas vidas. Negar-lhes isso pode deixá-los sentidos, rancorosos, magoados e violentos. Confunde suas cabeças quando já não podem categorizar nossos gêneros entre rosa e azul, pois torna mais didático para eles entender o seu papel numa sociedade a qual já estão habituados, que lhe é mais cômoda e, claro, porque os favorece.
Uma vez, um amigo, bem jovem, me confessou, que sentia ciúmes de suas ex-namoradas. Não as queria, disse ele, mas vê-las com outro o feria, pois segundo o próprio, o que lhe "pertenceu" um dia, já não estava sob seu domínio, e ele a sentia aquele corpo ainda como seu. Mesmo estando em novo relacionamento, o "magoava" e sentia-se traído por vê-la com outro homem. Ele chamou isso de possessividade, mas isso eu chamo de machismo. Estamos todos, homens e mulheres imbuídos dessa desgraça.
Mulheres não odeiam homens. Mulheres os amam até demais. Suportam machismo de pai, de irmão, de marido, de filho, sobrinho, vizinho, amigo e das próprias mulheres a sua volta. Incrusta-o em si e o aplica a outras mulheres também. Ensinadas a viverem em disputa, em intrigas, a se mostrarem mais merecedora de um homem do que outra. Separá-las, fazê-las entender que são rivais é usar a tática do "dividir para conquistar". Mulheres unidas, se fortalecem. Mulheres rivais ficam vulneráveis e fáceis de dominar. A miséria da discórdia as devora. Apenas unidas conseguiremos vencer esta violência
Tays Melo é professora e historiadora nascida em Natal, criada em Areia, brejo paraibano. É palestrante e escritora, e atualmente, mestranda no Programa de pós-graduação em Sociologia pela Universidade Federal da Paraíba, Campus I, João Pessoa.
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