O cientista Ricardo Galvão, professor titular aposentado do Instituto de Física da USP, é o novo presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), principal agência de fomento à ciência do governo federal. A nomeação foi oficializada nesta terça-feira, 17 de janeiro, pela ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, em evento oficial no auditório do CNPq, em Brasília.
“A ciência está de volta”, celebrou Galvão, em entrevista por telefone ao Jornal da USP, antes da cerimônia. “Estou muito esperançoso na recuperação da relevância da ciência no Brasil, e que conseguiremos fazer o que precisa ser feito.”
Santos aproveitou o evento para anunciar a “recomposição integral” do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e o fim das restrições impostas pela Medida Provisória 1136/22, que impunha limites à utilização do fundo até 2027. “Com a liberação integral dos fundos do FNDCT, principal instrumento público de financiamento da ciência, encerramos um longo período de descaso e desvalorização da pesquisa cientifica e do desenvolvimento tecnológico do país”, discursou a ministra. “Hoje é dia que se faz justiça à ciência brasileira; dia em que viramos a página do negacionismo.”
Ricardo Galvão tem 75 anos e é especialista em física de plasmas e fusão nuclear — como indica seu currículo na Plataforma Lattes. Além da bagagem de pesquisador, ele traz uma longa experiência em cargos de liderança e gestão na administração pública: foi diretor do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (2004-2011), presidente da Sociedade Brasileira de Física (2013-2016) e diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (2016-2019).
Como presidente do CNPq, ele assume um órgão de sólida relevância histórica para o desenvolvimento científico nacional, porém fortemente desidratado por sucessivos anos de cortes orçamentários e perda de recursos humanos. Apesar do otimismo com o futuro, Galvão pediu paciência à comunidade científica, destacando que a recuperação dos atrasos gerados pelo governo anterior levará tempo. “Tudo que aconteceu nos últimos anos naturalmente gerou uma expectativa enorme na comunidade científica. Mas nós vamos ter de ser pacientes, porque tudo tem que caber no orçamento, e o compromisso com a responsabilidade fiscal é clara no governo”, disse Galvão ao Jornal da USP. “Vamos trabalhar e buscar outras possibilidades, outras fontes de recursos, mas a recuperação total certamente vai ser lenta, não vai ser imediata.”
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“Sempre que a ciência for atacada, temos que nos levantar”
Ele reforçou que uma das prioridades da nova gestão é aumentar os valores das bolsas de pós-graduação, congelados há uma década. “Compensar toda a inflação desde 2013 nós já sabemos que é impossível, porque seria um valor da ordem de 70%, que não caberia no orçamento. Mas espero que haja uma recuperação substancial, não só nas bolsas de pesquisa para mestrado e doutorado, mas também algumas de pós-doutoramento, para refrear um pouco a diáspora”, afirmou o físico, referindo-se ao grande número de pesquisadores que desistiram de fazer ciência no Brasil nos últimos anos, em função da falta de recursos e do negacionismo científico propagado pelo governo anterior, que reduziu fortemente os investimentos em ciência e educação.
Uma das estratégias previstas para lidar com a falta de dinheiro no curto prazo é focar os investimentos em projetos estratégicos, de caráter mais estruturante, como a construção do Reator Multipropósito e o fortalecimento do Programa Espacial Brasileiro — incluindo a retomada da colaboração com a China para a construção de satélites. “Na gestão anterior os recursos do FNDCT foram muito pulverizados em vários projetos”, disse. “Não é só uma questão de obter mais recursos, mas de como utilizar esses recursos.”
A escolha de Galvão para a presidência do CNPq, segundo Santos, carrega a mensagem de que “a ciência voltou a ter vez nesse país”, após quatro anos de uma gestão marcada pela negação da ciência e por uma ideologia de perseguição a cientistas e instituições de pesquisa.
Uma das vítimas mais notórias desse período foi o próprio Galvão. Em agosto de 2019, ele foi exonerado da diretoria do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) após contestar publicamente declarações do então presidente Jair Bolsonaro, que acusava o instituto de estar a serviço de ONGs internacionais e de produzir dados “mentirosos” sobre o aumento do desmatamento na Amazônia.
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