Ter uma vida de sucesso desperta muito a atenção das pessoas, porém não são todas que torcem verdadeiramente por nossa prosperidade. Algumas pessoas ficam doentes em saber do êxito alheio não reconhecendo o trabalho empregado.
Esse sentimento de inveja, na maioria das vezes, resulta em relacionamentos dissimulados, frios, calculistas, interesseiros, inebriados, insossos e decadentes.
Conviver com o sentimento de inveja demanda muita cautela e discernimento, porque a sutileza dos comportamentos pode nos enganar. O alerta sinaliza que temos um grande desafio que é vencer a ignorância devoradora e perceber o real valor que cada um tem na efêmera vida.
Uma vez cientes da brevidade da vida e da susceptibilidade ao erro vale mencionar que os sete pecados capitais são fontes de todos os vícios humanos. A exemplo da soberba (orgulho exagerado com oposição a humildade); a avareza (busca desenfreada por dinheiro e desejo profundo pelos bens materiais com a ausência da generosidade); a ira (fúria descontrolada que pode culminar em violência e falta de paciência); a luxúria (fome insaciável por prazeres); a gula (comer e beber compulsivamente sem moderação); a preguiça (falta de interesse na execução de atividades físicas e mentais que exigem esforços) e a inveja que é a tristeza provocada pela alegria dos outros sendo contra a caridade e o desapego.
O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa nos esclarece que "inveja é o sentimento de desgosto causado pela felicidade alheia". O vocábulo inveja vem do latim 'in-videre' com significado de 'não ver ou ver enviesado'. O invejoso não consegue ter uma visão realista de si mesmo e, por isso, olha constantemente para o invejado com comparações da autoestima, valores e autorrespeito. Ao abordarmos a inveja é propício citar o ciúme que compreende (sentimento complexo e de difícil compreensão, provocado pelo medo de perder). Foster afirma que a inveja provoca ciúme e a cobiça o desejo desmedido pelo que o outro tem.
Essa atração imoderada e inconfessável de possuir algo que, geralmente, pertence a outrem, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa denomina de "cobiça". O lado bom da cobiça é quando proporciona o crescimento sadio dos atores envolvidos. O problema não é a cobiça em si, mas o que fazemos com ela. A presença de sentimentos malignos, nas interações, contamina o ser regredindo ao fracasso total.
Desejar desonestamente, a qualquer custo, a casa do outro, a maneira de falar em público, a profissão, as habilidades em resolver demandas, os relacionamentos e o emprego são simples exemplos de forte atuação da parceria da cobiça com a inveja enaltecendo o egocentrismo humano. Richard Smith e colaboradores da Universidade de Kentucky Estados Unidos sugerem que a inveja costuma se apresentar quando a pessoa em desvantagem sofreu um revés recente e encontra uma pessoa feliz. Já para Heródoto "a inveja nasceu com o homem desde o princípio". Para a maioria das pessoas a inveja é sempre negativa e uma minoria defende alguns pontos positivos.
Ao considerarmos o lado bom da inveja, deve-se focar nos aspectos evolutivos da humanidade. Sobre esse assunto Hill e Buss propagaram que a inveja é um importante instrumento evolutivo utilizado na luta por uma vantagem competitiva na seleção natural, de Charles Darwin, que preserva características favoráveis e extinção das desfavoráveis. A seleção natural é altamente competitiva e, no passado, o homem primitivo guerreava para garantir alimento, moradia, parceiro sexual, calor e outros elementos primordiais à sobrevivência. Desta forma, se um indivíduo possuísse recursos e o outro não a competição seria inevitável para o sustento do clã. Nesse aspecto, a inveja atuaria como um alerta à distinção dos competidores contribuindo à perpetuação da espécie e não como um episódio invejoso doente.
A inveja é cega e mais cruel que a cobiça. A inveja alimenta a tristeza do ser invejoso conforme a percepção da vida vitoriosa do invejado. Ver o outro romper nos mesmos desafios compartilhados potencializa o sentimento de inveja. Esse desgosto pelo bem alheio não tolera a alegria, a paz, a união, a paciência, a bondade, a temperança, a saúde, a felicidade, a firmeza no pensamento e o sucesso na vida da vizinhança. Não existem coisas específicas para terem inveja de você, lembre-se que, às vezes, as pessoas têm esse sentimento doentio e não reconhecem que são enfermas. Ramón Cajal, a esse respeito, bradou que "a inveja é tão vil e vergonhosa que ninguém se atreve a confessá-la".
O portador de inveja observa e por não enxergar nitidamente o outro acaba sentindo dor pela felicidade alheia direcionando, quase que exclusivamente, as atenções para o objeto da inveja. Por esse motivo frases do tipo ‘fulano de tal tem o olho-grande’; ‘beltrano tem mau-olhado’ ‘ciclano tem o olho-gordo’; ‘vixe, olho de seca pimenteira’. Para aqueles que afirmam, categoricamente, que nunca foram influenciados ou mesmo acometidos pelos sentimentos de inveja aqui está o meu respeito. Entretanto, considerando as imperfeições dos seres humanos, somos tentados a aderir ao complexo de inferioridade despertando gatilhos psicológicos à insatisfação com os resultados positivos das pessoas.
Esse descontentamento, com as bem-aventuranças dos outros, é capaz de crescer exponencialmente se não for sistematicamente educado. Bárbara Coré acrescenta que "a fofoca sempre está a serviço da inveja. Quanto mais invejosa for a pessoa, mais fofoqueira ela é". Assim, é inteligente fazermos as seguintes perguntas: eu tenho inveja de alguém? Fico com aquela dorzinha de cotovelo quando presencio boas ações? Será que sou capaz de assumir a emoção de inveja que carrego de meu vizinho? Você consegue esconder a infelicidade com o sucesso de seu patrão? Ou é melhor disfarçarmos para não sermos ridicularizados? Por que eu tenho inveja de você? Porque não sou capaz de alegrar-me com a sua alegria. Tomás de Aquino, a esse respeito, deixou registrado, nos anais da história, a célebre frase "tristitia alienum bonum - tristeza pela felicidade dos outros. Aflição pela prosperidade dos indivíduos".
Além dessa profunda tristeza o invejoso não quer saber o quanto você lutou para chegar onde está. Para o camarada de ‘olho-grande’ não é interessante conhecer a fundo o preço pago pelo sucesso. Por essa causa, não importa as noites sofridas que você já passou, as portas fechadas no ápice das dificuldades, os ‘nãos’ já encarados sem piedade, as humilhações de familiares, as tempestades enfrentadas, os vendavais secretos e o choro amargo das decepções da vida. Para quem fica triste com a felicidade alheia não é relevante saber o quanto de investimento foi empregado à execução de projetos bem-sucedidos.
A emoção chamada inveja é encontrada, em grande parte das culturas, e perceptível pela maioria das pessoas com peculiaridades entre os indivíduos invejosos. Se procurarmos alguns exemplos literários de uma pessoa invejosa Shakespeare sozinho criou diversas imagens complexas e prolongadas de seres humanos invejosos a exemplo de Cassius, Edmond, Richard III e Iago que "nunca ficam à vontade enquanto contemplam algo maior do que eles mesmos". Essa insatisfação envolve sentimentos de inferioridade causados por néscia comparação social desfavorável e sentimentos de má vontade.
Essa falta de interesse em ser solidário com o outro alimenta o desejo de causar o máximo de prejuízo possível. Bertrand Russell (1930) já afirmava que a inveja "era uma das paixões humanas mais universais e profundas" capaz de gerar descontentamento recheado de muita má vontade. Russell afirmava que as pessoas com tendência à inveja persistem, desnecessariamente, em comparar seu próprio estado com o dos outros e que “a inveja é uma emoção singularmente desagradável, essencial para a compreensão da natureza humana e que tem amplas consequências na vida cotidiana”. É nesse ponto que, no dia a dia, observamos comportamentos que fortalecem a inveja. Expressões corriqueiras como:
- Por gentileza meu amigo você pode levar meu currículo para o seu supervisor? Porque estou necessitando muito desse emprego!
- Na hora meu irmão! Pode deixar que vou fazer de tudo por você hoje... Vai pensando miserável que vou mover uma palha por você! É mais fácil eu colocar veneno no seu almoço!
- Boa tarde, Josielzinho, tudo bem? Gostaria de contar com a sua colaboração curtindo o meu Canal do Youtube dando um like? Pode ser?
- Claro Ambrozilda! Pode deixar que vou curtir a sua página e também vou compartilhar com os meus contatos. Você é como uma irmã consanguínea pra mim!... Vai comendo corda que eu quero ver o seu crescimento. Tomara que morra!
- Olá, saudações de paz, como vai senhor José Augusto? Por favor, você pode ajudar-me a estudar para concursos me dando dicas, macetes para eu conquistar essa vaga?
- Pode deixar quando chegar em casa ligo para você e combinamos... Se depender de mim você não passa nunca!
Dos diversos tipos de invejosos vale à pena a menção dos que se apresentam de forma sarcástica. Esse tipo de invejoso utiliza-se da camuflagem com falso senso de humor recheado de ironia, zombaria e maledicência sempre destacando, mesmo que indiretamente, as falhas dos outros. Gaiarsa aborda que “o invejoso, habitualmente, pode recorrer a calúnias, fofocas, sabotagem” tudo isso com o propósito de diminuir as qualidades do invejado. O autor afirma que o mexerico e a intriga são ferramentas que suportam ao controle social estimulado pela inveja.
Além da atuação indireta da inveja, percebe-se aquela que ataca diretamente ao invejado. O invejoso direto é considerado um 'vampiro psíquico' que busca detalhar os vícios alheios desconsiderando qualquer sinal positivo da vítima. Esse tipo de invejoso está sempre pronto para colocar dificuldades na vida dos outros sem medir esforços em violentar. Essa agressividade é manifestada em diversos níveis de crueldade. Rojas-Bermúdez, em seu artigo intitulado 'De la envidia y de la violencia' fala sobre a relação entre a inveja e a violência mostrando que podem resultar em grandes massacres. Schoeck nos esclarece que a inveja pode estimular a execução de crimes nas classes políticas sociais e econômicas. A utilização de obstáculos, com intuito de prejudicar as pessoas, fazem parte do coração de um invejoso pessimista que busca competir de forma desonesta, macular a moral e destruir a motivação do ser humano.
O invejoso competitivo não é capaz de assumir publicamente a sua dor e nunca está bem com os resultados exitosos do seu semelhante. Para saber tanto da vida dos outros é fundamental que o ser invejoso seja um exímio espião. Essa espionagem objetiva à descoberta dos pontos fracos dos invejados e, posteriormente, usada para chantagens. De acordo com Miguel de Cervantes "a inveja vê sempre tudo com lentes de aumento que transformam pequenas coisas em grandiosas, anões em gigantes, indícios em certezas". É por essa causa que Napoleão Bonaparte chamou a atenção que "a inveja é uma declaração de inferioridade" e deve ser tratada urgentemente.
Não é difícil ficar triste com a alegria das pessoas em nossa volta. Nenhum de nós está imune desse sentimento vergonhoso e que está presente em todas as classes da humanidade. Honoré de Balzac nos ensina que isso acontece porque "é tão natural destruir o que não se pode possuir, negar o que não se compreende, insultar o que se inveja" e Aristóteles exprimiu que "geralmente são os bens que provêm do acaso que provocam inveja". Para o filósofo Kierkegaard "a inveja é uma admiração que se dissimula. O admirador que sente a impossibilidade de ser feliz cedendo a sua admiração toma o partido de invejar".
Adam Smith resume que "a inveja é a paixão que vê com maligno desgosto a superioridade dos que realmente têm direito a toda a superioridade que possuem" e Augusto Branco escreveu que "poucas coisas despertam tanto o lado negativo das pessoas e atraem tanto a inveja humana quanto o sucesso". Lembra que quando você não tinha uma profissão definida as pessoas não te levavam a sério? Quantos quilômetros você já andou a pés sem receber uma carona? Quantas vezes você pensou em desistir dos seus sonhos por falta de recursos humanos? Quem se importou com você quando passava fome na calada da madrugada? Alguém te honrava convidando-o para almoçar em restaurantes chiques ou mesmo em suas casas novas? Cadê aquele camarada que disse que era seu amigão? Sumiu? Também você não tinha nada para oferecer!
Essa é uma realidade dura para todos nós. É inegável que quando as coisas estão melhorando sempre aparecem colegas, familiares ou falsos amigos para bajular e confundir com os falsos sentimentos de atenção. O ego instalado na essência humana não é capaz de assumir a vergonha da inveja. Fortalecendo essa ideia De La Mora não poupou em relatar que "a inveja é o maior tabu da humanidade em que todos a sentimos, porém poucos admitimos" e Nelson Rodrigues audaciosamente relembra que “há coisas que o sujeito não confessa ao padre, ao psicanalista, e nem ao médium, depois de morto. Uma delas, certamente, é a inveja". A sua vitória não é bem-vinda, para boa parte da multidão, e Michael Jackson ciente disso cantou que "quanto maior a estrela, maior é o alvo".
Portanto, meus amigos e minhas amigas, Sêneca grafou que "evitamos a inveja se guardarmos as alegrias para nós próprios. Registrar os bons momentos da vida (passeios no Rio São Francisco, trilhas ecológicas, parques de diversões, práticas de exercícios físicos, almoços caprichados, jardins perfumados, festas à beça, praias exóticas) e publicar nas redes sociais fazem parte do cotidiano de muitos usuários da Rede Mundial de Computadores". Entretanto, é sugerível muita prudência ao expormos a nossa intimidade. Eduardo Costa foi incisivo nos alertando a termos "cuidado ao postar a nossa felicidade, a inveja tem Twitter". Por isso, não se engane existem pessoas que investigam a sua vida somente para saber em que invejar. Desse modo, fechando com chave de ouro, Paulo de Tarso receita que "a caridade é paciente, a caridade é bondosa. A caridade não é orgulhosa. Não é arrogante. Não tem inveja".
O amor tudo pode!
Josiel Bezerra - Professor de Biologia - Mestrando UPE (Universidade de Pernambuco) - Ciência e Tecnologia Ambiental.
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