Um dos grandes questionamentos dos/as agricultores/as é sobre o que fazer para escoar a produção excedente. Algumas possibilidades puderam ser observadas em um intercâmbio, com visitas a locais que têm toda uma trajetória de mobilização comunitária e apresentam bons resultados, que servem de inspiração. Isso foi possível através de uma nova etapa de um projeto, executado pelo Irpaa, que tem como um dos objetivos o fortalecimento de iniciativas produtivas agroecológicas.
O intercâmbio teve a participação de 37 agricultores/as dos municípios de Curaçá e Uauá, entre os dias 13 e 15 de setembro. Foram visitadas as experiências da Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá - Coopercuc, em Uauá e a Associação de Mulheres em Ação da Fazenda Esfomeado - Amafe, em Curaçá. Maria Luzinete Ferreira, da Comunidade Sítio do Alexandre, em Curaçá, gostou da diversidade da produção realizada pelas conterrâneas, na Amafe, que fabrica, dentre outros produtos, geleias de frutas e o licor de palma.
Em Juazeiro, o cronograma incluiu visitas a espaços de produção orgânica e agroecológica e tecnologias de Convivência com o Semiárido no Centro de Formação Dom José Rodrigues - CFDJR, do Irpaa; à Cooperativa Agropecuária Familiar Orgânica do Semiárido - Coopervida e no Armazém da Caatinga, mantido pela Central das Cooperativas da Caatinga, a Central da Caatinga.
Os/As participantes enalteceram a descoberta das possibilidades de comercialização. “Na Coopervida, ela me inspirou muito lá também, falou que as portas estavam abertas e eu me interessei muito. Se eu tiver vindo pra Juazeiro e já puder trazer uma caixa de macaxeira , alguma coisa assim, e ela compra, ela recebe”, enfatiza Damiana Souza.
No Armazém da Caatinga, os/as agricultores/as vislumbram também uma oportunidade de destinar as produções. A agricultora Cleidemar Tamarindo afirma que “viu portas abertas para que a gente pudesse introduzir o nosso produto, ou até criar, no caso de artesanato, que você pode começar a produzir”. Em relação à abertura da Coopervida para aquisição do que os/as agricultores/as produzem, ela afirma que agora espera encontrar saídas para evitar perdas. “A gente não fica como estava: ‘ah,tenho tantos produtos e estão desperdiçando’, a gente usa, dá e mesmo assim aquela fruta está desperdiçando e a gente não tem saída. A gente viu que agora tem a possibilidade de vender”.
Cleidemar ressalta ainda que volta muito animada para sua comunidade, porque tudo serviu de inspiração e destaca a importância desses espaços de comercialização que foram visitados. “Tô indo pra casa assim, fascinada, nos deu esperança para a gente ir em frente, para a gente conseguir sobreviver e colocar nossos produtos nesses lugares. Vou botar a mão na massa e buscar como e por onde começar”.
De acordo com a agricultora Cleidemar, essa motivação toda precisa ser concretizada, principalmente de forma coletiva, na criação de cooperativas e através da busca de certificação participativa dos produtos. “Acho que as comunidades devem se incentivar entre elas mesmas e começar a se movimentar para que haja uma mudança de realidade”, destaca.
Da mesma forma que as colegas curaçaenses, o agricultor José Gomes, da comunidade Pedra Grande, em Uauá, disse estar motivado pelos novos aprendizados adquiridos no intercâmbio. “Pra mim ficou muita coisa, eu gostei bastante, foi nota 10. Eu aprendi mais alguma coisa e com as coisas que a gente tem lá [na comunidade], ficou melhor ainda”.
Ao longo das partilhas de experiências nos espaços visitados, diversos assuntos foram abordados, com destaque para as dicas de como vencer os desafios que surgem na trajetória de uma cooperativa, a importância de parcerias com outras instituições, o cuidado com a parte administrativa, com o planejamento da produção e quais as formas de acessar locais para comercializar os produtos. Uma constatação, por exemplo, da roda de conversa na sede da Coopervida, foi de que há mercado para absorver a produção. Contudo, é preciso cuidado no planejamento para atender a demanda com regularidade, garantindo preço justo e acessível.
A agricultora Maria Luzinete Ferreira destaca a experiência do saneamento rural vista no CFDJR. “Uma coisa que me chamou a atenção foi o saneamento, nos trouxe mais informação e nós queremos levar também [para a comunidade]. Que os governantes públicos nos ajude a chegar até nós”, reivindica.
Durante a troca de conhecimentos proporcionada pelo intercâmbio, a agricultora Damiana Souza, da comunidade Santana, em Curaçá, percebeu, na produção da família de Ancelmo Cordeiro e Ana Lúcia Moura (no CFDJR), os benefícios da cobertura vegetal do solo. “Com a experiência que eu aprendi aqui, eu vou fazer na minha propriedade. Toda folha que cai eles não jogam fora, jogam na plantação e cobrem, por causa do sol, pra não prejudicar a planta, e eu gostei muito disso aí. Eu não fazia e vou fazer”, destaca Damiana.
Ao todo, 540 famílias são assessoradas por esse projeto nos municípios Casa Nova, Curaçá, Juazeiro, Pilão Arcado, Remanso e Uauá. Nesta primeira rodada, com o tema da comercialização, serão realizados mais 6 intercâmbios. Alessandro Santana, colaborador do Irpaa e coordenador das atividades, afirma que esta fase do projeto tem o objetivo de demonstrar, na prática, quais os caminhos e possibilidades, principalmente de comercialização no Território Sertão do São Francisco. “Agora estamos numa etapa de animação, mostrando as possibilidades [...] uma vez da produção organizada e diversificada, eles agora terem um olhar dos caminhos de para onde vai a sua produção. Se inspirar em pessoas, em grupos, locais que já percorreram o caminho e para facilitar para eles as dificuldades e os avanços encontrados, mostrando que eles também podem chegar a esse ponto de comercialização, seja na cooperativa, num grupo produtivo, uma cooperativa de orgânico, seja numa central de cooperativas”.
Após esta fase temática da comercialização, o intercâmbio vai continuar sendo realizado, só que abordando assuntos relacionados às práticas agroecológicas, como compostagem e cobertura vegetal do solo. Essas atividades fazem parte de um projeto apoiado pelo Estado da Bahia e objetiva promover o desenvolvimento da agricultura familiar, através da Convivência com o Semiárido.
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