Havia um pé de juazeiro na curva do rio.
Tronco tortuoso, forte, áspero e canelado. Baixo, oferecia abrigo a viajantes esperando os paquetes que já faziam a travessia naqueles tempos.
Indígenas, negros e brancos portugueses, contando histórias sob a sombra do juazeiro na curva do rio, outros apascentando cavalos, que, cuidadosamente escolhiam entre os espinhos do nosso juazeiro as folhas mais verdes e tenras.
Ali, ainda sob a influência da sombra do juazeiro, que parecia espalhar calma e viço, um viajante armava uma tenda de couro, outro reacendia a fogueira, enquanto seu companheiro destrinchava na faca a dura carne seca. Misturavam-se cheiros e vozes.
Quando passou o primeiro dos caçadores de ouro e gente, a pouco menos de 100 anos do primeiro vislumbre do Opara, já se assentavam sob nosso juazeiro os orgulhosos filhos da nação Cariri, misturados a tropeiros e mascates, a mulheres de todas as cores e sob nosso juazeiro floresceu, como se fora a antecipação do milagre que viria, a flor da liberdade.
A tudo assistia o nem tão impassível juazeiro.
Ora balançava os galhos maiores, ora recebia barulhentos periquitos e aninhava cobras no tempo de seus frutos. E os homens e mulheres, a maioria escravas, índias e brancas, umas com as barrigas enormes de filhos que não seriam reconhecidos, passavam por ele, usavam sua sombra e suas folhas, deleitavam-se sob o solo macio e iam embora.
E veio gente diferente, de estranhas línguas, misturando-se e de repente, não mais querendo ir. Ficando, construindo, cultivando liberdade, que podia ser vista e ouvida nos risos altos da primeira rua que nasceu a partir de nosso juazeiro e se estendeu por casas alegres, doces acalantos de solitários homens.
Por anos; duas centenas de anos, nosso juazeiro, perene, nada mais era que a árvore da curva do rio. Então, gente, talvez embriagada por tudo que o nosso juazeiro exalava, principalmente liberdade, resolveu que tudo era Juazeiro: Ruas, praças, os alegres bordéis e até a capela onde agora rezavam distintas senhoras sem passado.
Era Juazeiro os barcos, já imensos, que subiam e desciam o rio; era Juazeiro o sal e eram Juazeiro os imponentes cavalos criados nas imponentes fazendas dos coronéis. Era Juazeiro o branco, o negro, o turco, o índio e o negro.
E sob o Juazeiro vicejou, como nunca em outros lugares desta colônia a Liberdade.
Passados 144 anos desde o dia em que tudo, de uma curva a outra do rio, virou Juazeiro, não importa a imensidão verde e próspera da cana ou a lembrança doce do mel e a aspereza da criação.
O que sobrevive, sobre nós todos, que somos Juazeiro; o que importa a nós que somos Juazeiro, é o sabor, o cheiro, dessa Liberdade que floresceu sob o juazeiro da curva do rio.
E passarão dias incultos, intolerantes e virá a seca e a inquietude se manterá morna, mas viva. E virá, como veio e se foi, gente rude, armada, fria. E a flor, nascida sob nosso juazeiro, estará ali, pulsando para reviver.
Juazeiro teu nome não é Juazeiro. É Liberdade!
Manoel Leão - juazeirense
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