"Flamengo está viciado em amadorismo", diz grupo de sócios

25 de Jun / 2022 às 19h00 | Esporte

Um grupo de sócios do Flamengo produziu uma carta, endereçada ao Conselho Diretor do clube, com críticas sobre algumas práticas da atual gestão, liderada pelo presidente Rodolfo Landim. Nela, dizem que o Flamengo está "viciado em amadorismo".

No grupo que assina a carta estão alguns nomes conhecidos da política do clube, como Márcio Braga, Eduardo Bandeira de Melo, Kleber Leite, Michel Asseff e Sérgio Veiga Brito, além dos três candidatos de oposição na última eleição: Marco Aurélio Asseff, Ricardo Hinrichsen e Walter Monteiro.

Na longa carta, além das críticas sobre a forma de comandar o dia a dia do Ninho do Urubu, o grupo pede, entre outras coisas, a reforma estatutária do Flamengo , a contratação de um diretor de futebol de nível internacional e o fim do "conselhinho" do futebol.

- O Conselho de Futebol, em vias de esvaziamento, mostrou-se omisso e despreparado, formado por amadores que podem gostar, mas não entendem de futebol.

Confira a íntegra da carta:
O FLAMENGO PRECISA AVANÇAR – UM CHAMAMENTO À DIRETORIA DO FLAMENGO

Falamos ao Conselho Diretor na condição de integrantes do corpo social do Clube de Regatas do Flamengo. Somos de diferentes correntes políticas, inclusive egressos da situação e mesmo de nenhuma corrente. Somos sócios contribuintes, sócios Off Rio, sócios patrimoniais, sócios proprietários, eméritos, beneméritos, grandes beneméritos, ex-vice-presidentes e ex-presidentes. Antes de tudo, somos da torcida: estamos pelo Rio de Janeiro, pelo Brasil, pelo mundo, dentro e para muito além dos muros da Gávea.

Testemunhamos nos últimos anos como o Clube conseguiu vencer obstáculos até então considerados intransponíveis e se reerguer. Com muito sacrifício, e notável colaboração da torcida e do quadro social, o Clube recuperou credibilidade, diminuiu seu endividamento e voltou a ser potência.

Números em uma planilha não podem expressar o que aconteceu de mais importante no Clube nesse período: resgatou-se o amor-próprio e o orgulho de ser rubro-negro. Em um esforço conjunto da Nação, o Flamengo restaurou a própria dignidade. De cabeça erguida, pôde investir em infraestrutura, no aperfeiçoamento dos processos de gestão e nas competências profissionais.

O Flamengo se consolidou como um modelo, o Clube Cidadão. Em 2019, a competência do Flamengo cidadão foi recompensada com a chegada de Jorge Jesus, que materializou uma temporada de sonhos.

Lamentavelmente, junto com o vitorioso técnico, o profissionalismo, a competência e a transparência também deixaram o Flamengo. O Clube Cidadão, cumpridor das leis e dos contratos, respeitoso com o associado e consciente do seu papel na sociedade brasileira, foi, aos poucos, se perdendo.

Fora das quatro linhas, o Flamengo retrocedeu. Abandonando de forma voluntária alguns princípios consagrados na administração: moralidade; publicidade; impessoalidade; eficiência.

Com a criação de novas vice-presidências, ressuscitaram uma prática já extinta no Flamengo, a de inchar o quadro do Clube para acomodar aliados, entre amadores e profissionais.

Para cumprir acordos políticos, iniciou-se um processo de perseguição e demissão de funcionários competentes, substituídos por cabos eleitorais sem experiência comprovada. Desde a escolha da agência de propaganda (a mesma que fez a campanha para a chapa vencedora) até a contratação como diretor de um lobista envolvido com um grupo dedicado à intimidação de jornalistas. Hoje, a impessoalidade passa longe da Gávea.

A conveniência e a conivência políticas também provocaram o prejuízo de milhões na malfadada negociação do contrato com a TV Globo no Campeonato Carioca, cujo desdobramento foi a implosão da relevância do torneio como produto.

O Departamento de Futebol é o mais impactado pelos retrocessos na gestão. O gerente de Futebol, responsável pela contratação de Jorge Jesus, foi demitido e substituído pelo primo de um dirigente. A contratação de profissionais de baixa qualidade ou sem experiência por “quem indica” tornou-se rotineira.

O fim do contrato de consultoria da Exos e a perda do legado construído pela Double Pass se somaram à defasagem da remuneração dos profissionais do Departamento de Futebol em relação a outros clubes. Perdemos profissionais para rivais. Alguns deles na Série B.

A falta de critérios é evidente na contratação e demissão de sete técnicos que geraram gastos de quase R$ 30 milhões apenas em rescisões, assim como na renovação de atletas com baixos níveis de rendimento e idades avançadas. Resultado de um processo de tomada de decisão que a cada dia se mostra disfuncional. Não é por acaso o arquivamento das propostas de profissionalização do Clube. O Flamengo está viciado em amadorismo.

O Conselho de Futebol, em vias de esvaziamento, mostrou-se omisso e despreparado, formado por amadores que podem gostar, mas não entendem de futebol. Não pode ser chamado nem de “Conselho”, nem “de Futebol”. Até esta semana, a função do minúsculo “conselhinho” era servir de instrumento de influência do presidente do Conselho de Administração sobre o Departamento de Futebol.

Restam, ainda sem explicação, a tentativa de se comprar um clube em Portugal e a abertura secreta de uma empresa nos EUA em nome do Flamengo no nome de dois vice-presidentes, sem qualquer consulta prévia ou aprovação pelos conselhos do Clube. O Flamengo se tornou um inimigo da transparência.

A prática política da Diretoria reproduz em muitos aspectos o que há de pior nos piores governos: a sede por sabotar a democracia. Arrogância na condução dos processos contra o Clube, perseguição aos sócios de oposição, aumentos abusivos das mensalidades e subsequente limitação no número de sócios Off Rio, ocasionando a redução do quadro de sócios e do colégio eleitoral.

Pior, o Flamengo brigou na justiça para descumprir a lei, atuando contra o direito dos associados, garantido pela Lei Pelé, de votar à distância na eleição do Clube. E ainda tentou expulsar do quadro social um ex-presidente por conta do que fala – e não pelo que fez ou deixou de fazer.

Os atuais presidentes do Conselho Diretor e do Conselho de Administração se ausentam em momentos difíceis. O presidente do Conselho Diretor não fala à torcida quando a corda aperta. Age como se estivesse mais preocupado em gerir a própria imagem do que a do Clube. E, nisso, descumpre a promessa de campanha de cobrança constante. Já o presidente do Conselho de Administração, figura pública nas horas de vitória, some nas horas de crise, como se esperasse no banco de reservas.

Provado está que as ações dos dirigentes fora das quatro linhas se refletem de forma direta no rendimento do Flamengo em campo – campo, aliás, que mal temos, dada a crônica má qualidade do gramado do Maracanã. Como torcedores e sócios, é nosso desejo que 2019 não seja apenas um cometa que atravessou a órbita do Flamengo, sem data prevista para o seu retorno. Ainda restam 30 meses de gestão e os retrocessos não podem mais ser ignorados. Se esses retrocessos forem corrigidos, ainda há tempo para que o Flamengo retorne ao caminho das vitórias.

Esta carta é um chamado à ação para a Diretoria. Nós, a exemplo de vocês, só aceitamos o "vencer, vencer, vencer". Nós, a exemplo de vocês, almejamos estar à altura da obra de engrandecimento do Clube iniciada por nosso presidente histórico José Bastos Padilha. Somos todos Flamengo, e o que nos une está acima das disputas de poder. Acreditamos que o Flamengo não possa ser governado sozinho.

Globo Esporte

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