Em 21 de março de 1960, na África do Sul, milhares de pessoas negras se reuniram, pacificamente, para protestar contra a lei do passe - que proibia as pessoas negras de transitarem livremente -, do regime do apartheid.
Durante o ato, houve grave repressão da força policial sul-africana, que levou a morte de 69 pessoas e o ferimento de 186, naquele que ficou conhecido como o "Massacre de Shaperville".
Por ser um marco na luta contra a política segregacionista sul-africana, a data foi escolhida pela ONU como o "Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial".
Apesar da discriminação racial ser facilmente reconhecida quando há lei ou ação que discrimine abertamente pessoas negras, como foi o apartheid, é preciso ir além e reconhecer que direitos são negados diariamente para milhares de pessoas negras, que sofrem as consequências da falta de políticas públicas de saúde, educação, segurança pública e emprego.
Não é outro o cenário brasileiro, a análise do país pela perspectiva racial demonstra que ainda há muito que lutar para eliminar a Discriminação Racial.
É fundamental lembrar que o Brasil se estruturou enquanto Estado sob, aproximadamente, 350 anos de escravização de pessoas negras, enquanto temos pouco mais de 130 anos da Lei Áurea, que não produziu soluções estruturais para a ferida da escravização. Como ensina o Professor Silvio de Almeida, "países como Brasil, África do Sul e Estados Unidos, não são o que são apesar do racismo, mas são o que são graças ao racismo."
Nesse sentido, em recente estudo divulgado pelo IPEA, chegou-se à conclusão que a desigualdade de renda racial se manteve intocada nas últimas décadas. E no mesmo sentido, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou estudo em 2021, no qual se constatou que independentemente do grau de instrução, o valor recebido por hora trabalhada da população branca era sempre superior à de pessoas negras, especialmente no ensino superior.
Portanto é primordial que o debate sobre o racismo estrutural se paute, também, em critérios econômicos e sociais, tendo em vista que recorrentemente as lutas contra a discriminação racial, seja em empresas ou na definição de políticas públicas, são distorcidos para não considerar esses fatores.
Além disso, infelizmente, no tocante aos índices de violência, as pessoas negras seguem sendo as maiores vítimas: no Anuário de Segurança Pública (2021), 76,2% das vítimas de morte violenta intencional eram negras, nos números de letalidade policial, 78,9% das pessoas mortas eram negras e nos casos de feminicídio 61,8% das mulheres mortas, também eram negras.
Sendo assim, o racismo não só permeia a sociedade brasileira, mas a estrutura econômica, cultural e politicamente, refletindo nos índices de violência, desigualdade social e desemprego.
Para mudar esse cenário, é fundamental a ação de instituições organizadas, como a OAB SP, que se comprometeu a instruir as lideranças no antirracismo, estabelecer cotas de 30% para os diversos órgãos da Ordem, a fortalecer políticas de ingresso e de manutenção de pessoas negras na advocacia paulista e trabalhar para manutenção das cotas raciais no âmbito federal e na implementação pelo governo do Estado de São Paulo.
Por isso, para que nossa história não seja mais escrita com sangue, é fundamental que as instituições se unam à luta antirracista dos movimentos organizados, para propor e realizar medidas efetivas no combate à discriminação racial, fazendo com que o símbolo da luta do dia 21 de março torne-se em transformação social.
Por João Vítor de Oliveira Silva e Nathalia Caroline Fagundes Silva são membros da Comissão Permanente de Igualdade Racial da OAB SP.
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