A ausência ou inadequação do saneamento básico, sobretudo do acesso à água potável e coleta e tratamento de esgoto é uma questão relacionada à pobreza no Brasil.
De acordo com Luís Almeida, colaborador do Irpaa, o saneamento básico está ligado diretamente a uma perspectiva de desenvolvimento territorial.
“Se a gente for observar tem uma parcela clara da sociedade que não tem acesso ao saneamento básico, essa parcela, geralmente, tá nos bairros populares, periféricos, são as populações mais vulnerabilizadas, e também na zona rural, ou seja, tem também uma perspectivas de divisão social”, analisa Almeida.
A fala de Almeida, pode ser comprovada a partir dos dados divulgados pelo instituto Trata Brasil. Em 2018, o levantamento da instituição demonstrou que os índices de acesso aos serviços de saneamento básico registrados pela população negra são piores do que os da população branca. O percentual de 32% da população preta não tem abastecimento de água e 37,7% não têm rede de esgoto. Enquanto 22,5% da população branca não tem água e 29,8% não têm acesso a um sistema de coleta de esgoto.
O instituto ainda aponta que apenas 34,1 % do esgoto é tratado no Nordeste. Esses dados são preocupantes, pois o acesso ao saneamento básico está ligado diretamente à promoção da saúde pública. Além disso, a ausência do saneamento pode causar sérios impactos ambientais.
O estudo ainda mostra que somente 32,8% dos domicílios rurais possuem distribuição de água e apenas 26,3% dos domicílios rurais têm acesso à coleta dos resíduos sólidos. Esses dados mostram a deficiência na assistência ao saneamento básico e essa realidade pode ser mais agravante nas comunidades rurais do Semiárido.
Diante desse cenário, e preocupado com os impactos significativos das mudanças climáticas em relação às questões de disponibilidade hídrica, produção de alimentos, desertificação do solo e demais questões socioambientais, o Irpaa vem pautando o debate do Saneamento Básico Rural apropriado à realidade climática do Semiárido e implementado tecnologias sociais de tratamento de esgoto e reúso agrícola em nível familiar e comunitário.
No âmbito comunitário, as Escolas Famílias Agrícolas – EFAs ligadas às Rede de Escolas Família Agrícola Integradas do Semiárido - Refaisa e Associação das Escolas das Comunidades e Famílias Agrícolas da Bahia - Aecofaba, nos estados da Bahia e Sergipe, têm sido beneficiadas com ações de um projeto executado pelo Irpaa, que tem por objetivo trabalhar a proposta de Convivência com o Semiárido e a Adaptação às Mudanças Climáticas, com investimento do Governo alemão, intermediado pela Cáritas. A ação de formação e implementação de tecnologias conta com o apoio do Instituto Nacional do Semiárido - Insa.
O projeto piloto beneficiou 17 escolas com a implementação da unidade de tratamento de esgoto total. O Reator UASB, tecnologia de tratamento biológico de esgotos baseada na decomposição anaeróbia da matéria orgânica, foi a tecnologia instalada nas unidades escolares. O reator trata tanto as águas cinzas, como as águas fecais, possibilitando o reúso da água para fins agrícolas.
Outra ação do projeto é o processo formativo. “O curso foi muito importante, deixou bastante claro que o saneamento básico não resume só ao tratamento de resíduos sólidos (...) A gente entendeu que o programa de saneamento precisa considerar cinco itens (...) e que é obrigação do governo fazer chegar tudo isso a todos, principalmente, aqueles que mais precisam”, pontua Iomar Ferreira, coordenador da Escola Família Agrícola Mãe Jovina, de Ruy Barbosa (BA).
A Lei Nacional de Saneamento Básico (Lei nº 11.445/2007), define o saneamento básico como conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de quatro componentes: abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza e manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo das águas pluviais. Na Bahia está incluso o quinto componente: o controle de vetores.
Luís Almeida acredita que essas experiências do saneamento básico podem contribuir naEnviar construção de uma política pública de saneamento básico apropriada ao Semiárido. Para isso acontecer, ele acredita que ser preciso, “basicamente de duas coisas: uma primeira é a mobilização social, ou seja, a gente precisa entender que é um direito, que não é só serviço, não é só uma taxa que a gente paga junto a nossa conta de água (...) a outra é a iniciativa do poder público”.
Luís ainda complementa afirmando que, “direito não é igual a custo, a valor, direito a gente não quantifica. É preciso fazer pressão social para garantir o saneamento básico”. Em consonância com Luís, Iomar defende que o saneamento “é direito social conquistados por todos (...) e nós precisamos cobrar do governo que essa política pública possa chegar a todos”.
Para fazer essa pressão social é preciso difundir o debate do saneamento básico. E um desses caminhos é o uso pedagógico do sistema de tratamento de esgoto e reúso agrícola, ação que a Escola Família Agrícola de Sobradinho – Efas pretende colocar em prática. Segundo Laelson Ferreira, monitor da Efas, o sistema “ abre um leque de vários aspectos para analisar, tanto no aspecto de estudar a parte biológica, como é feito o tratamento, até chegar ao ponto de se utilizar essa água nas produções”. Ele ainda pontua que o efluente tratado vai possibilitar a ampliação “da área de produção de forragem, de palma. Estamos pensando também em usar ela na fruticultura de sequeiro”, explica Laelson.
A EFA de Ruy Barbosa também está realizando o trabalho de disseminação do conhecimento. “Nós estamos divulgando em rádio, nos grupos de alunos, ex-alunos, nos grupos da família, estamos divulgando para que a comunidade de Rui Barbosa possa conhecer nosso sistema de esgotamento sanitário”, declara Iomar.
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